O aumento da pobreza no Brasil nos últimos dias desencadeou um incremento na população em situação de rua, que cresceu em mais de 200% em uma década, cenário que piorou na pandemia de Covid-19. De 2019 e 2022, são 281.472 pessoas morando na rua, a maioria delas duramente afetada principalmente pela crise sanitária, que piorou a situação de emprego e renda no país. Os dados são de pesquisa Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
De acordo com o levantamento, de 2012 a 2022, a população de rua cresceu 211%, enquanto a expansão da população brasileira aumentou apenas 11% entre 2011 e 2021, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Apesar disso, o pesquisador do Ipea Marco Antônio Carvalho Natalino, autor do estudo, acredita que é necessário um estudo mais preciso para contabilizar essa população em situação de pobreza. Segundo ele, em 2010, a população de rua foi incluída no CadÚnico (Cadastro Único) e, em 2011, passou a ter direito de acesso aos serviços do SUS (Sistema Único de Saúde) mesmo sem comprovante de residência.
“Esse breve resgate histórico deixa claro o quão próximos ainda estamos de um legado de tratamento do povo da rua como, na melhor das hipóteses, cidadãos de segunda classe”, afirmou o pesquisador no estudo, divulgado pelo jornal O Globo.
Apesar de, em 2012, ter sido regulamentado o funcionamento dos Consultórios na Rua (CnR), a manutenção dos dados ainda é imprecisa e dificulta a criação de políticas públicas.
Para a pesquisa, Natalino baseou-se em dados do Censo Suas (2021), processo de monitoramento do Sistema Único de Assistência Social, no último dado disponível do CadÚnico, de julho de 2022. Ele também se baseou em um conjunto de variáveis socioeconômicas, como taxas municipais de pobreza e de urbanização.
A pandemia, no entanto, bagunçou os dados sobre a pobreza, que podem estar subestimados. Em 2020 e 2021, respectivamente, o Brasil tinha 214.451 e 232.147 pessoas morando na rua, uma diferença de 17.696. Na base de comparação entre 2019 e 2020, esse número estava em 9.791 indivíduos.
De acordo com o pesquisador, “é possível que parte da explicação para esse resultado sejam os problemas relacionados aos dados de 2020, resultando em um viés de subestimação, e que o mesmo fenômeno tenha afetado, em algum nível, também os números oficiais para 2021”.
O pesquisador pontuou que os levantamentos mais precisos dependem de dados dos municípios, mas atualmente só cerca de 2 mil prefeituras, de um total de 5.500, fornecem essas informações. O IBGE nunca conseguiu aplicar esse tipo de pesquisa, e os estudos que existem muitas vezes não têm metodologias comparáveis.
Aumento da pobreza fez com que a maioria dos brasileiros recorresse a empréstimos para comer e pagar as contas
Nos últimos quatro anos, o aumento da pobreza no Brasil levou a maioria dos brasileiros das classes C, D e E a recorrer a empréstimos para comer e pagar as contas básicas. É o que mostra pesquisa do instituto Plano CDE. Nos últimos meses, entre 45 e 50% da população em situação de pobreza disseram que solicitaram ou solicitariam créditos a familiares, amigos e bancos digitais, principalmente, para essas finalidades, o que denota a dificuldade que essas faixas populacionais estão encontrando, apesar do Auxílio Brasil, para viverem com o mínimo de dignidade.
Mas, obviamente, a situação é muito pior para quem é obrigado a morar na rua. Desde 2009, a contagem oficial desse segmento esteja prevista na Política Nacional para a População em Situação de Rua (PNPR). Porém, os censos demográficos de 2010 e o deste ano seguiram/seguem o método tradicional de contagem, que inclui somente dados sobre a população domiciliada. Em suma, quem mora na rua é praticamente invisibilizado.
Segundo o Ipea, a falta de dados afeta a correta avaliação da demanda por políticas públicas por parte desse segmento. Uma delas foi observada ainda na pandemia, quando o Ministério da Saúde enfrentou dificuldades em alocar um número adequado de vacinas contra a Covid-19 para pessoas sem-teto.
Para efeito de comparação, em 2012 havia 90.480 moradores em situação de rua, número que mais que dobrou em 2019 (204.660), com a precarização da economia e mercado de trabalho.
Para o pesquisador Natalino, os efeitos da pandemia são visíveis. “São três os fatores principais que explicam a população em situação de rua. O primeiro é o econômico, que inclui a pobreza, acesso à moradia e poucas oportunidades no mercado de trabalho por baixa qualificação. O segundo é o social: a perda de vínculo familiar e de rede de contato de apoio, que segura a pessoa em situação de dificuldade. E em terceiro, a questão das compulsões e adicção. Na pandemia, esses três fatores se agravaram”, disse ao O Globo.
Redação ICL Economia
Com informações de O Globo