Em discurso na COP-27, o presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, vai afirmar que o combate às mudanças climáticas está atrelado ao combate à fome e à pobreza. A fala de Lula está prevista para esta quarta-feira (16), no espaço da (Organização das Nações Unidas (ONU), chamado de Zona Azul.
Segundo pessoas próximas a Lula que ajudaram na preparação do discurso e ouvidas pelo G1, o presidente eleito deve aproveitar para reafirmar, perante autoridades de outros países, pontos debatidos durante sua campanha e seu discurso de vitória, como a busca pelo desmatamento zero e o foco em atrair investimentos em bioeconomia e em energia limpa e renovável.
Seu discurso é muito esperado pela sinalização que dará sobre a agenda ambiental que o Brasil irá tomar a partir do próximo ano, em especial depois da gestão de Jair Bolsonaro, que reduziu o papel dos órgãos ambientais e estimulou o desmatamento, o garimpo ilegal e desmonte da legislação ambiental.
Presidente do Brasil ausente do G20 e COP-27
Não foi apenas do cenário político nacional, de transição de governo, que o atual presidente da República se ausentou. Jair Bolsonaro não deu as caras na Cúpula do G20, na Indonésia, onde os países mais ricos do mundo discutem, entre outras crises, formas de investir na transição energética também dos mais pobres. Optou por enviar o chefe do Itamaraty, ministro Carlos Alberto França. Desse modo, ao menos o mandatário poupou os demais chefes de Estado do constrangimento de cumprimentá-lo. Na COP-27, o presidente também deu sinais de admitir que está na hora de já ir embora mesmo.
A autoridade máxima do governo brasileiro na Conferência na ONU sobre Mudanças Climáticas, no Egito, é o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite. Por exemplo, uma das políticas públicas destacadas pelo atual governo foi o chamado Alimenta Brasil – novo nome dado ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
Criado em 2003 pelo governo Lula, o PAA garantia compra de produtos da agricultura familiar para conectá-los a outras políticas públicas, como merenda. Mas, além de mudar o nome, o atual governo mudou também o alcance, que a cada ano a verba míngua mais. No ano que vem, o corte no orçamento do programa é quase total (97%), como informa Murilo Pajolla, do Brasil de Fato.
Sintoma de um governo com nada de bom para mostrar. O Gabinete de Transição tem pedido reiteradamente dados oficiais atualizados do desmatamento. No ano passado, as informações chegaram somente depois da COP-26, em Glasgow, Escócia, para onde Jair também não foi. Os números eram muito ruins, mas mesmo assim o governo brasileiro prometeu uma redução de 15% ao ano no desmatamento entre 2022 e 2024. Do mesmo modo, neste ano os dados não estão atualizados porque, quando o forem, tornarão evidente que o governo mentiu.
Construir demora, destruir é fácil
O compromisso do governo brasileiro incluía chegar a 40% ao ano em 2025 e 2026. E mais: zerar o desmatamento ilegal em 2028. Porém, que conhece o governo do “passar a boiada” sabe que só haveria duas formas de esse desmatamento ilegal zero ocorrer. Uma delas seria mudar a lei e legalizar tudo o que hoje é crime, e a outra seria deixar desmatar tudo até 2027 – daí em 2028 não haveria mais o quê desmatar. Felizmente, já está para ir embora.
Foi com Marina que Lula se reuniu nesta terça, no Egito. Ele pretende levar uma mensagem que inclua a sociedade civil brasileira na construção na nova política ambiental do país – aliás, muita esperada pelo mundo. E Marina passou o dia de ontem reunida com movimentos populares e organizações do mundo urbano e das comunidades originárias, justamente para ouvi-los.
Para se ter ideia de como é difícil reduzir o desmatamento, seja legal ou ilegal, o Brasil terminou o ano de 2002 com 25 mil km2. Mesmo depois de assumir um novo governo, com Lula na Presidência e Marina Silva no Meio Ambiente, o desmatamento ainda demorou a diminuir. Repetiu-se em 2003 , subiu em 2004 e somente em 2005, terceiro ano de governo, caiu para 19 mil km2. As quedas seguiram até chegar em 2010 – último ano de governo Lula – a 7 mil km2.
Agora, com Jair Bolsonaro, boiada vai boiada vem, o desmatamento na Amazônia chegou em 2021 ao maior volume desde 2006. Depois de uma taxa média de 6.500km2 nos 10 anos anteriores, bateu em 13.235km2. E apesar da ausência de dados oficiais atualizados, indicadores apontam para um aumento de 44% até outubro, na comparação com o ano passado, segundo reportagem da BBC Brasil.
Entre a reunião do G20 hoje na Indonésia e a COP-27 no Egito, a verdade sobre o Brasil também encontrou espaço ser maltratada em Genebra, Suíça, nesta segunda (14). Especialmente no que diz respeito ao combate à covid-19 entre as comunidades indígenas. O governo do Brasil apresentou ao Conselho de Direitos Humanos da ONU relatório em que afirma que desde o início da pandemia da Covid-19 o Brasil se engajou na proteção dos indígenas. Em nota, a Articulação Brasileira dos Povos Indígenas (Apib) reagiu indignada.
A entidade lembra que precisou recorrer ao Supremo Tribunal Federal para que o governo mantivesse medidas de proteção aos povos indígenas. “A Apib denunciou ao mundo essa prática genocida de Bolsonaro, inclusive ao Tribunal Penal Internacional em Haia, uma vez que o sistema de justiça brasileiro se mostrou incapaz de investigar, processar e julgar essa conduta criminosa”, diz o movimento.
Enquanto isso no G20
A proximidade da hora da saída, ou de o atual presidente já ir embora, coincide com a chegada de notícias positivas para o Brasil. Um dia após a vitória eleitoral de Lula, a Noruega afirmou interesse em reativar o Fundo Amazônia, que foi suspenso pelo país em 2019, depois do aumento no desmatamento e de mudanças promovidas no governo do presidente Jair Bolsonaro.
Nesta terça, na Cúpula do G20, o presidente Joe Biden, dos Estado Unidos, anunciou parceria com a União Europeia que pode trazer US$ 30 bilhões (algo em torno de R$ 160 milhões) em investimentos ao Brasil. Os recursos irão para desenvolver no país instalações para manejo de minerais destinados a fabricação de veículos elétricos, como cobalto e níquel.
A ação faz parte de Parceria para Infraestrutura e Investimento Global (PGII, na sigla em inglês). E prevê uma série de outras ações em países da Ásia, África e América Central. Mas a iniciativa, do G7, não chega a ser uma generosidade. Representa uma resposta do capitalismo global ao megaprojeto chinês de desenvolvimento em infraestrutura conhecido como Rota da Seda. Ou seja, colocar o pé de empresas americanas e europeias na porta da transição energética, antes que aventureiros chineses o façam.
Mesmo assim, o fato de expectativas chegarem agora não deve ser visto com preconceito pelo governo que está para começar. Desde que a soberania nacional dê o norte, não deve haver preconceitos para a chegada de novos investimentos. Algo que não se poderia pensar com o governo que já está para ir embora.
Confira agenda de Lula na COP-27 (horário de Brasília)
- Quarta-feira (16) – Lula participa, às 5h da manhã do evento “Carta da Amazônia – uma agenda comum para a transição climática”. O encontro tratará da retomadas de medidas de proteção ambiental junto com governadores da Amazônia. São eles Waldez Góes (PDT), do Amapá, Gladson Cameli (PP), do Acre, Mauro Mendes (PP), do Mato Grosso, Helder Barbalho, do Pará, Wanderlei Barbosa , do Tocantins, e Marcos Rocha, de Rondônia.
- Às 10h15 – Lula faz seu pronunciamento na COP-27, na área da ONU.
- Quinta-feira (17), 4h da manhã – Encontro com representantes da sociedade civil brasileira,
Às 15 horas – Fórum Internacional dos Povos Indígenas/Fórum dos Povos sobre Mudança Climática. - O presidente eleito deve manter ainda encontros bilaterais com dirigentes globais, entre eles da França, Alemanha e o presidente da Autoridade Climática dos Estados Unidos, John Kerry. Lula deve propor a criação de uma Autoridade Climática no Brasil e a realização da COP-30 no país, em 2025.
- Na sexta-feira (18) – Viagem a Portugal para encontro com autoridades portuguesas. Retorna ao Brasil no fim de semana.
Redação ICL Economia
Com informações do G1 e da Rede Brasil Atual