Ministério de Minas e Energia pede suspensão da demissão voluntária na Eletrobras. Eletricitários afirmam que apagão reflete sucateamento da empresa após privatização

Em carta enviada à Eletrobras, o Ministério de Minas e Energia pediu a suspensão do desligamento de 1.500 trabalhadores no plano de demissão voluntária. A saída em bloco pode ter consequências para a confiabilidade do suprimento de energia elétrica
17 de agosto de 2023

O Ministério de Minas e Energia (MME) pediu a suspensão do novo Plano de Demissão Voluntária (PDV) em curso na Eletrobras. A reportagem da Folha de S Paulo explica que o documento, com o pedido, foi enviado em 20 de julho. A Eletrobras manteve o cronograma do programa e não deu resposta à pasta. O Ministério MME ainda investiga as causas do apagão ocorrido em 25 estados e no Distrito Federal. As autoridades competentes, Ministério de Minas e Energia, Agência Nacional de Energia Elétrica e Operador Nacional do Sistema (ONS), lidam com o tema e solicitaram ao Ministério da Justiça e Segurança Pública que a Polícia Federal e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) também investiguem, com detalhes, as causas da falta de energia. Não estão descartadas sabotagens.

Em relação à Eletrobras, o MME afirma que é responsável por zelar pelo equilíbrio entre a oferta e a demanda de energia elétrica no país e disse estar preocupado com o desligamento de 1.500 trabalhadores no segundo PDV desde a capitalização.

Na carta enviada à empresa, o MME avaliou que se trata de um número expressivo de funcionários, e que a saída em bloco pode ter consequências para a confiabilidade do suprimento de energia elétrica.

“Sendo a União a maior acionista da empresa, manifesto minha apreensão em relação à possível saída desses funcionários qualificados e treinados pela empresa no decorrer de suas carreiras profissionais, e o respectivo impacto no resultado da prestação do serviço adequado de energia elétrica para a sociedade brasileira”, afirma o texto da carta do MME.

A carta foi assinada pelo secretário-executivo Efrain da Cruz e enviada ao então presidente da empresa, Wilson Ferreira Junior, que renunciou ao cargo nesta segunda-feira (14).

A pasta pediu que a Eletrobras elaborasse um plano de ação para manter a prestação adequada do serviço nas suas áreas de atuação, esclarecendo o potencial impacto com a saída dos trabalhadores que aderirem ao PDV e ainda mostre qual é o plano de investimentos para os próximos anos, tanto na geração quanto na transmissão, com os devidos esclarecimentos de como a sua execução será possível sem essa força de trabalho.

Ao final, a carta pede que a Eletrobras avalie a possibilidade de suspender o PDV até que o ministério examine o plano solicitado.

Demissão voluntária mostra redução de recursos típica da privatização

Após o apagão, profissionais de operação e manutenção dos sistemas de geração e transmissão da Eletrobras escreveram uma carta ao presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em crítica à desestatização da empresa. “Senhor Presidente, para finalizar esta carta é um pedido de socorro à Eletrobras”, indicam os trabalhadores, que denunciam o “sucateamento acelerado do quadro técnico operacional das empresas Eletrobras”.

Para Leandro José Grassmann, engenheiro eletricista, presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Paraná (Senge-PR), a privatização da Eletrobras segue a “mesma cartilha” de todas as situações em que a gestão dos serviços públicos é terceirizada para iniciativa privada: redução drástica nos recursos para manutenção e do quadro de funcionários. A finalidade passa a ser o aumento do lucro, atentando apenas interesses do mercado financeiro.

Desde o processo de privatização, trabalhadores da Eletrobras têm chamado atenção para as demissões em massa, aumento de acidentes de trabalho e casos de assédio moral. “Aumentam o salário dos gestores em todos os níveis, capturando-os para que façam parte do processo de ‘modernização’. Aumenta a pressão nos empregados para que produzam mais. Não raras vezes, passam por cima da ética e de normas técnicas, obrigando os profissionais a assumirem riscos para aumentar a produtividade e lucro. Quem questiona as novas metodologias é segregado, assediado e perseguido”, assinala.

Roberto Nigro Mattos, engenheiro eletricista, diretor financeiro do Sindicato dos Eletricitários de Londrina e Região (Sindel) e coordenador da Intersindical dos Eletricitários do Sul do Brasil (Intersul), que é participante Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE), também sinaliza que, com a privatização, o corte de custos com pessoal tem sido realizado de maneira “irresponsável” pela diretoria. Para a liderança, a falta de profissionais compromete a qualidade do serviço prestado e a tendência é que a resolução de falhas demore cada vez mais. Na última terça-feira, as regiões Norte e Nordeste chegaram a ficar mais de sete horas sem abastecimento de energia, afetando outros direitos essenciais desde o fornecimento de água ao fechamento de escolas.

“Além da redução dos quadros técnicos na Eletrobras, com a demissão de trabalhadores, há também o reflexo da gestão do medo na atuação destes profissionais. A campanha publicitária caríssima denominada ‘Eletrobrasilidade’ da Eletrobras, tem por base sobrecarregar o quadro técnico, descumprir normas de segurança, aumentar os acidentes de trabalho, diminuir salários e benefícios dos trabalhadores enquanto diretores aumentam suas próprias remunerações em até 3.000% e a consequência é o adoecimento do quadro técnico. Depressão, síndrome do pânico, atentados às próprias vidas são situações corriqueiras na categoria eletricitária atualmente”, adverte.

Ainda, segundo Grassmann, outro problema enfrentado pelos trabalhadores da empresa que deixou de ser estatal é a promoção de programas de demissão voluntária, o que tem gerado o esvaziamento de um quadro mais autônomo. Tais profissionais, quando substituídos, dão lugar para outros funcionários contratados com remunerações inferiores. “A intenção é que os ‘velhos’, leia-se aqueles que tem argumentos técnicos para contestar o que está sendo feito saiam e entrem profissionais mais novos, obviamente por uma fração do salário”, aponta.

Em julho, a Justiça do Trabalho suspendeu demissões da Eletrobras em todo o país até que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7.385, ajuizada pelo governo Lula. O documento é responsável por contestar ilegalidades no processo de venda da empresa. Com a decisão ficam proibidos quaisquer desligamentos no período de 01 de maio de 2023 a 30 de abril de 2024.

Redação ICL Economia
Com informações do jornal O Estado de S Paulo e do Portal Verdade

 

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