O Brasil bateu recorde de resgate de trabalhadores em condições análogas à escravidão no primeiro semestre deste ano. Dados de relatório da Comissão Pastoral da Terra, divulgado ontem (10), mostram que 1.408 foram resgatadas no período, um recorde para o período em 10 anos e um aumento de 44% em relação a iguais meses de 2022.
Embora o resgate seja uma boa notícia, os dados mostram que a prática de manter trabalhadores em condições sub-humanas de trabalho permanece em vigor no Brasil.
Em 2022, 2.218 pessoas foram libertadas no Brasil de trabalho escravo em setores ligados à agroindústria, conforme dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), ligada à CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil). Trata-se do maior resgate já feito em uma década.
Em relação a 2021, houve aumento de 29% no número de pessoas resgatadas de trabalhos em condições análogas à escravidão e alta de 32% na quantidade de casos. O setor sucroalcooleiro, responsável pela produção de açúcar, álcool e outros derivados da cana-de-açúcar, é o que teve o maior número de pessoas resgatadas: 523 trabalhadores.
O balanço mais recente da Pastoral da Terra também mostra outros dados alarmantes. Os conflitos no campo aumentaram 8% no 1º semestre deste ano, em relação a igual período de 2022. No total, foram 973 conflitos, sendo que a maioria foi por disputas por terra (714), seguidas pelo trabalho escravo rural (102), conflitos pela água (80), ocupação e retomada de terras (71) e acampamentos (6).
Quase 527 mil pessoas estiveram envolvidas nesses conflitos, o que representa uma pequena queda de 2% em relação ao ano passado.
Entre as vítimas, os povos indígenas estão na dianteira, correspondendo a 38,2% do total daqueles vitimados por conflitos de terra.
Por essa razão, não causou surpresa a reação de entidades ligadas ao agronegócio, que se queixaram do resultado da votação do STF (Supremo Tribunal Federal) contra a aplicação da tese do marco temporal na demarcação de terras indígenas, criada por ruralistas com o objetivo de restringir as demarcações.
Depois dos indígenas, os trabalhadores rurais sem terra (19,2%) estão entre as vítimas dos conflitos no campo envolvendo posse de terras, seguidos de posseiros (14,1%) e quilombolas (12,2%).
Trabalho escravo: número de assassinatos no campo teve queda de 50%. Maioria das vítimas é indígena
Ainda de acordo com o relatório da CPT, o número de assassinatos no campo teve queda de cerca de 50%, para 14, sendo os povos indígenas a maioria das vítimas de assassinatos (6), seguidos dos trabalhadores sem-terra (5), posseiro (1), quilombola (1) e funcionário público (1).
Outra triste marca é que aumentou a violência contra mulheres, que passou de 94 registros em 2022, para 107 somente no primeiro semestre de 2023.
A violência contra as mulheres em áreas rurais vem crescendo desde 2021. Segundo a CPT, o lamentável destaque deste ano foram os estupros de 30 adolescentes yanomami por garimpeiros, no mês de fevereiro.
Outros casos são de mulheres que sofrem com intimidação (20), ameaças de morte (16), agressão (6), criminalização (5), cárcere privado (5), entre outros.
Também subiu o número de danos causados por contaminação por agrotóxicos, que atingiu 327 pessoas. A contaminação por minérios afetou 55 pessoas.
O relatório da CPT é feito com base em dados coletados pelo Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno (Cedoc), por meio de agentes da pastoral pelo Brasil, notícias da imprensa e divulgações de órgãos públicos, movimentos sociais e organizações parceiras.
Na avaliação da Pastoral da Terra, o aumento dos resgates demonstra que os órgãos de fiscalização estão mais atentos ao tema.
Em abril passado, a Secretaria de Inspeção do Trabalho do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) publicou a atualização da chamada “lista suja” de empregadores acusados de submeter trabalhadores e trabalhadoras a condições análogas à escravidão. A maioria das empresas envolvidas com trabalho escravo é do agronegócio.
Ao todo, 289 empregadores, entre pessoas físicas e jurídicas, integram a atual relação de flagrados com mão de obra em situação análoga à escravidão. Na comparação com a lista anterior, 132 empresas ou pessoas passaram a integrar o cadastro, e 17 foram excluídas.
Redação ICL Economia
Com informações da Comissão Pastoral da Terra