O ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Wellington Dias, afirmou ontem (17) que o governo busca as alternativas técnicas para impedir o uso do cartão do Bolsa Família para o pagamento de jogos e apostas on-line, as chamadas bets. Em entrevista a uma rádio em Salvador (BA), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que, se a regulação desse mercado não funcionar, o governo pode suspender essa atividade no país.
O cartão do Bolsa, que tem a função débito e pode ser usado para compras na internet, entrará nas mesmas regras que impedem o uso dos cartões de crédito em apostas on-line. “O cartão terá limite zero para pagamento de apostas, um bloqueio feito com os sistemas das empresas”, afirmou o ministro após reunião com Fernando Haddad (Fazenda).
O bloqueio dos cartões do Bolsa Família será feito pela Caixa, banco estadual responsável pelo pagamento do benefício. “Tem, na verdade, um bloqueio feito e integrado com os sistemas das próprias empresas e a Secretaria de Jogos do Ministério da Fazenda”, disse.
Dias reforçou que há investigações dentro do governo para analisar se há lavagem de dinheiro e uso de CPFs de beneficiários do Bolsa Família de forma irregular nos sites de apostas. “Há indícios de que possam estar utilizando também de forma fraudulenta e cometendo crime de lavagem de dinheiro com o uso de CPF dessas pessoas (do Bolsa Família)”, afirmou.
A proibição para o uso do cartão do Bolsa Família ocorre depois que uma análise técnica sobre o mercado de apostas on-line do Brasil, realizada pelo Banco Central, mostrou que beneficiários do Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões em bets via Pix somente no mês de agosto. O montante destinado às empresas de apostas corresponde a 20% do valor total repassado pelo programa no mês.
O levantamento do BC mostrou que, do universo de 20 milhões de beneficiários do programa de transferência de renda, 5 milhões fizeram apostas naquele mês.
Na ocasião, o BC não esclareceu se o valor depositado saiu do programa ou de outra fonte de renda dos beneficiários. O Ministério da Fazenda pediu mais dados ao BC sobre o assunto.
Lula diz que regulamentação de bets pode ser suspensa se não der os resultados esperados
O presidente Lula afirmou ontem (17) que, se a regulamentação das empresas de apostas on-line não der os resultados esperados, o governo pode proibir esses serviços no Brasil. “Nós vamos ver se a regulação dá conta. Se a regulação der conta, está resolvido o problema. Se não der conta, eu acabo. Ficar bem claro. Você não tem controle do povo mais humilde, de criança com celular na mão fazendo aposta. Nós não queremos isso”, declarou à rádio Metrópole, de Salvador (BA).
As bets foram autorizadas no apagar das luzes do governo de Michel Temer (2018). O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) teve seu mandato para regular a atividade, mas não o fez, abrindo a porteira do país para empresas estrangeiras que atuavam sem pagar impostos.
Somente no fim de 2023 esse setor foi regularizado. Neste mês, a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), a pedido do governo, começou a derrubar os mais de 2 mil sites que não pediram autorização para a atividade no país a partir de janeiro de 2025.
A regulamentação do setor de apostas on-line está, portanto, em andamento. O governo diz que só vai fiscalizar ponto a ponto dessa “adequação” dos sites a partir de 2025.
O grande desafio do governo, no entanto, é fiscalizar as empresas que tentam driblar as regras. Levantamento feito pelo site g1 encontrou, na terça-feira passada (15), 18 bets irregulares funcionando em sites alternativos – e quase iguais – aos que estavam na lista da Anatel com mais de 2 mil endereços irregulares que deveriam ser bloqueados.
Crime e endividamento das famílias
A regularização do mercado de bets é uma das apostas do governo para aumentar a arrecadação. A projeção é de arrecadar cerca de R$ 3 bilhões com as outorgas para as plataformas de apostas esportivas em 2024.
Porém, um dos desafios da regulamentação é o risco de favorecer crimes, como a lavagem de dinheiro, e desestruturar o orçamento das famílias de diferentes níveis de renda.
A fala de regulamentação adequada, no entanto, pode gerar outro perigo, já abordado em campanha feita pelo ICL (Instituto Conhecimento Liberta), que é o endividamento excessivo das pessoas, o que pode desencadear uma crise econômica.
Como lembrou a jornalista Míriam Leitão, em seu blog em O Globo, a crise do subprime nos Estados Unidos é um dos exemplos emblemáticos de como o endividamento da população pode gerar uma crise econômica, como a de 2008.
Nesse caso, o endividamento descontrolado das famílias, que, estimuladas pelos bancos, usaram suas próprias casas como garantia para novos e novos empréstimos, fez com que o sistema financeiro acabasse entrando em colapso quando as dívidas se tornaram impagáveis.
Por isso, ela reforça que a regulamentação das apostas precisa ser abrangente, considerando diferentes aspectos: prevenir o vício de jogadores compulsivos, combater o crime que tem usado a atividade para lavagem de dinheiro e evitar uma bolha de endividamento das famílias, que pode resultar tanto em crises econômicas quanto em problemas pessoais e familiares.
Na avaliação dela, o presidente Lula tem razão ao afirmar que a regulamentação “tem que dar conta” desse setor.
Redação ICL Economia
Com informações do g1 e O Globo