Em meio à polêmica dos últimos dias sobre o financiamento de shows com dinheiro público, que envolveu artistas famosos ganhando somas volumosas de municípios pequenos, o governo federal vai transferir R$ 3,2 bilhões para a conta de prefeituras que poderão ser usados em plena campanha eleitoral, ou seja, com fim eleitoreiro.
Os recursos serão provenientes do chamado “Pix orçamentário”, ou seja, o dinheiro vai para a conta das prefeituras e não há fiscalização por órgãos de controle. Isso porque, quando o Congresso aprovou a medida, não definiu a fiscalização do uso do dinheiro.
Os R$ 3,2 bilhões foram empenhados (compromisso de pagamento) pelo governo no último dia 17 de maio e, conforme apurou reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, o dinheiro já começa a chegar às prefeituras nesta quarta-feira (1). Os recursos podem ser usados para várias atividades que incluem shows de artistas e compras de bens públicos, como tratores e caminhões de lixo.
É a primeira vez que os municípios vão receber dinheiro para aplicar no meio de uma eleição geral. No total, 444 deputados e 58 senadores optaram por enviar dinheiro por essa modalidade do “Pix orçamentário” para bases eleitorais. A maioria dos deputados (60%) é da base do governo Bolsonaro.
Ainda segundo a reportagem, deputados e senadores fazem acordos informais com os prefeitos indicando a aplicação do dinheiro, por meio do WhatsApp ou até por bilhetes escritos à mão sem qualquer transparência.
Parlamentares destinam verba para shows com dinheiro público
O cantor Gusttavo Lima, que recentemente teve revelado o valor de seu cachê de R$ 1,2 milhão para um show no pequeno município de Conceição do Mato Dentro, em Minas Gerais, está entre as indicações do “Pix orçamentário” do pré-candidato ao Palácio do Planalto, o deputado André Janones (Avante-MG), para uma apresentação ao lado de outros artistas na cidade natal do parlamentar, Ituiutaba (MG). O valor para bancar a festa ficou em R$ 1,9 milhão. A apuração é do jornal O Estado de S. Paulo.
Assim como Janones, outros parlamentares têm indicação dos recursos para shows e priorizam prefeituras governadas por parentes.
Sertanejos e o desconhecimento sobre a Lei Rouanet
A contratação do cantor Gusttavo Lima para evento em Conceição do Mato Dentro no próximo dia 20 de junho (evento cancelado pelo prefeito depois de o assunto ser amplamente divulgado) foi envolvida por discussões sobre a origem do dinheiro que paga o cachê dos cantores sertanejos.
Tudo isso começou depois que o cantor Zé Neto, dupla do Cristiano, atacou artistas que usam o incentivo da Lei Rouanet. Durante um show em Sorriso (MT), ele disse: “Nós somos artistas que não dependemos de Lei Rouanet. Nosso cachê quem paga é o povo”, ele disse.
A questão é que tanto os shows patrocinados com a Lei Rouanet, quanto os shows pagos diretamente por prefeituras no Brasil usam dinheiro público. Aí está a incoerência dita (e praticada) por parte dos artistas, principalmente do meio sertanejo, e até do presidente Bolsonaro que ganhou votos criminalizando o incentivo à cultura por meio da uso da Lei Rouanet, tendo sempre como alvo os artistas críticos a ele ou de esquerda.
Diferentemente do uso direto dos recursos da prefeitura, que são sem licitação, pouco transparente, e muitas vezes feito por interesses que não o público, a Lei Rouanet é o principal mecanismo de fomento à cultura no Brasil. Para ter acesso aos seus recursos, os artistas têm que submeter seus projetos à Secretaria Especial da Cultura e passam por avaliação do órgão. Depois de aprovado, o autor do projeto tem a permissão de procurar empresas ou pessoas interessadas em apoiar financeiramente o projeto. O valor pode ser repassado através de doação ou patrocínio e os incentivadores podem deduzir de seu Imposto de Renda (IR) uma parte ou 100% do valor investido.
Um estudo do extinto Ministério da Cultura, em 2018, mostrou que a cada R$ 1 investido por patrocinadores em projetos culturais por meio da Lei Rouanet, R$ 1,59 retorna para a economia do país, levando em conta o impacto econômico direto (valor total dos patrocínios captados, corrigido pela inflação) e o impacto indireto (relacionado à cadeia produtiva, como a produção de empregos).
Redação ICL Economia
Com informações de O Estado de S. Paulo e demais agências