Em retrocesso, o país vê a fome atingir 33,1 milhões de pessoas no Brasil. O número aumentou mais de 50% em dois anos, quando a estimativa era de 19 milhões passando fome (o termo técnico é insegurança alimentar grave).
Os dados são do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, divulgado nesta quarta-feira (8) pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.
O estudo revela que seis em cada dez domicílios não conseguem manter acesso pleno à alimentação e possuem alguma preocupação com a escassez de alimentos no futuro, sendo as regiões Norte e Nordeste as mais impactadas.
A insegurança alimentar, em diferentes graus, já atinge mais da metade (58,7%) da população brasileira. Em números absolutos, são 125,2 milhões de brasileiros nessas condições, o que representa um aumento de 7,2% desde 2020 e de 60% na comparação com 2018.
Brasil no Mapa da Fome
Esta segunda edição da pesquisa mostra que o Brasil teve um retorno ao mesmo patamar de fome de quase 30 anos atrás e está de volta ao Mapa da Fome da ONU – condição que havia deixado em 2014. Em 2020, a fome no Brasil já tinha voltado para patamares equivalentes aos de 2004, mas agora, com o agravamento da crise econômica retorna a níveis da década de 1990. Em 1993, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estimou 32 milhões de brasileiros em situação de fome, embora sob outra metodologia.
Ouvida pela reportagem da Folha de S. Paulo, a médica sanitarista Ana Maria Segall, professora aposentada da Unicamp e pesquisadora da Rede Penssan, explica que entre 2004 e 2013 houve um incremento “muito significativo” no acesso das famílias a alimentos. “Depois de 2013, você tem um precipício, e derrocada da segurança alimentar ocorre de maneira muito rápida. Houve uma piora rápida e muito expressiva do acesso a alimentos que continua até hoje e é pior dentro dos grupos que já viviam em algum nível de insegurança alimentar”, afirma a média que integrou o Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), extinto pelo governo de Jair Bolsonaro.
Fome faz parte do dia a dia de 25% das famílias do Norte
A pesquisa revelou que a fome fez parte do dia a dia de 25,7% das famílias na região Norte e de 21% no Nordeste. No Sudeste essa média é de aproximadamente 15% e no Sul é de 10%.
O mesmo agravamento é percebido quando se compara o campo e a cidade. Nas áreas rurais, a insegurança alimentar, em todos os níveis, esteve presente em mais de 60% dos domicílios. Até quem produz alimento está pagando um preço alto: a fome atingiu 21,8% dos lares de agricultores familiares e pequenos produtores.
O professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e pesquisador da Rede, Nilson Maciel, ouvido pela CNN, explica que “o Brasil tem uma população muito desigual financeiramente. Os dados comprovam isso. Atualmente, o país vive um cenário de catástrofe no quesito de insegurança alimentar. Podemos dizer também é que a fome tem endereço, cor e identidade social”.
Vergonha de passar fome
O desemprego crescente, a queda do salário mínimo e o desmonte de programas sociais são reflexos da falta de políticas públicas do atual governo para reduzir esses impactos na vida do brasileiros e são revelados em outra triste constatação da pesquisa:15,9 milhões de pessoas, ou seja 8,2% das famílias entrevistadas, relataram sensação de vergonha, tristeza ou constrangimento pelo uso de meios que ferem a dignidade para conseguir colocar comida na mesa.
A fome é maior onde o chefe de família está desempregado (36,1%), tem emprego informal (21,1%) ou trabalha na agricultura familiar (22,4%).
Outra pesquisa, divulgada nas últimas semanas pelo Instituto Gallup, também já havia indicado que a taxa de insegurança alimentar na população brasileira dobrou a partir de 2014 e passou de 30% para 36% nos últimos dois anos.
Redação ICL Economia
Com informações das agências