O Ibama (Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais), que enfrenta um processo de sucateamento por parte do governo federal, que precariza o órgão para “deixar passar a boiada” e fazer vistas grossas a crimes ambientais, foi orientado pelo TCU (Tribunal de Contas da União) a melhorar o seu processo de aplicação de multas. O órgão fiscalizador apontou irregularidades nas multas do Ibama a quem comete infrações contra o meio ambiente.
De 2017 a 2021, o Ibama aplicou R$ 2,33 bilhões em multas, mas apenas o montante de R$ 25,5 milhões foram pagos. Entre as falhas apontadas pelo TCU, estão ausência de estruturação adequada dos mecanismos para conversão de multas em prestação de serviços de preservação, melhoria e recuperação do meio ambiente; insuficiência de mecanismos de estímulo para a adesão dos autuados à conciliação (quando a multa é convertida em prestação de serviço); tempo excessivo para conclusão do processo administrativo; descompasso entre o número de autuação de novos processos e o ritmo de instrução e de julgamentos em primeira instância; e morosidade no sistema de notificação.
Dentre os tópicos elencados pelo TCU, o órgão apontou que a conclusão dos processos administrativos leva cerca de seis anos, podendo chegar até o total de 11 anos e nove meses. Os prazos foram considerados excessivos pelo TCU.
Além disso, a área técnica do TCU observou que, em 2021, houve queda de 38,1% nos processos autuados em relação ao ano de 2019, enquanto nos processos julgados a redução foi de 76,3% no mesmo período. Em fevereiro deste ano, o número de processos aguardando triagem e distribuição era de 94 mil, mais de dez vezes o número de processos autuados em 2021.
Em relação à morosidade do sistema de notificação atualmente empregado pelo Ibama, o TCU verificou que as notificações têm demorado, em média, seis meses para serem realizadas de forma efetiva, enquanto o prazo ideal seria de até três meses.
Recentemente, uma reportagem elaborada pela BBC News Brasil mostrou que o governo federal pode deixar de arrecadar R$ 298 milhões em multas aplicadas por crimes ambientais, que correm o risco de prescrever. O montante se refere a 2.297 multas aplicadas pelo Ibama.
As estimativas foram feitas pelo órgão em junho passado com base em uma lei de 1999 sobre prazos de prescrição para ações punitivas do Estado brasileiro. A reportagem da BBC News Brasil obteve acesso às informações via LAI (Lei de Acesso à Informação). Beneficiados pela lei, os criminosos não temem as punições pois contam com a prescrição das multas sobre os crimes cometidos.
O volume de multas é apenas uma fração do enorme problema. Segundo o Ibama, mais de 90 mil multas ainda estão na fila para serem processadas e seus prazos de prescrição são desconhecidos. O órgão também desconhece os valores, pois podem variar de acordo com o tipo de análise, já que há vários tipos de prescrição previstos em lei, que variam entre três e cinco anos.
O imbróglio mostrado pela reportagem é a prova de que criminosos ambientais continuam cometendo seus crimes com a bênção do Estado brasileiro, em um ciclo que perdura há anos. Dentre esses crimes estão o desmatamento e a grilagem de terras, que beneficiam negócios como a venda e a exportação de produtos, como carne e madeira.
Entre suas recomendações ao Ibama, o TCU salientou que “é importante que aqueles que insistem em cometer crimes e/ou irregularidades com o meio ambiente tenham sempre presente que a atuação do Estado, enquanto ente fiscalizador, é, de fato, efetiva, o que, por certo, traduzir-se-á em favorável expectativa de controle de modo a dissuadir tais comportamentos desviantes”.
Em entrevista ao JN, Bolsonaro acusa órgão de “abuso”, mostrando que problema das multas do Ibama é apenas parte da questão
Primeiro presidenciável entrevistado pelo Jornal Nacional, o presidente Jair Bolsonaro aproveitou o horário nobre da TV Globo para dizer que o Ibama cometeu “abuso” em suas fiscalizações. O candidato à reeleição foi questionado sobre o aumento do desmatamento da Amazônia e sobre desautorizar a destruição de equipamentos por órgãos fiscalizadores.
“Primeira coisa. A destruição, como está em lei, é se você não puder retirar o equipamento daquele local. O que vinha acontecendo, e ainda vem, infelizmente, é que o material pode ser retirado do local, porque se chegou lá, pode ser retirado. E há o abuso de uma parte.” Perguntado sobre de qual parte seria o abuso, Bolsonaro respondeu: “Por parte do Ibama, sim, por parte do Ibama”.
Entrevistado pelo colunista Guilherme Amado, do portal Metrópoles, o servidor licenciado do instituto Roberto Cabral rebateu nesta terça-feira (23) as declarações do presidente.
Segundo Cabral, o aparato que dá suporte às fiscalizações está precário, o que dificulta o trabalho dos agentes. “Os caminhões que estão puxando toras de madeira são bem precários, sucateados, com freio quase arrebentando. Já houve situações em que o caminhão perdeu o freio e tombou com um agente nosso. E se o criminoso continua dirigindo o caminhão e sofre um acidente, a responsabilidade é do Estado”, disse.
Além disso, ele destacou a dificuldade de deslocamento na região Amazônica. “Tem que levar um caminhão prancha para retirar o maquinário. No meio da mata ainda não tem onde manobrar. Em vários quilômetros o caminhão vai ter de entrar de ré. A balsa só sai na época de chuva. E se sair com o trator, vai a cinco quilômetros por hora. Imagine rodar mais de 50 quilômetros só para chegar à estrada de chão”, falou, ao comentar a fala de Bolsonaro sobre a retirada de equipamento da floresta.
A versão do servidor corrobora, portanto, as informações de que o órgão tem sofrido, sim, sucateamento durante o governo Bolsonaro, que age parecendo proteger criminosos contra o meio ambiente.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias