Sempre que contrariado, o presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, não perde a chance de disparar falas carregadas de preconceitos. Desta vez, o alvo foi o povo do Nordeste. Depois de perder na região para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no primeiro turno das eleições, ontem (5), Bolsonaro disparou ofensa aos nordestinos, ao associar a vitória do petista ao analfabetismo na região. “Lula venceu em 9 dos 10 estados com maior taxa de analfabetismo. Você sabe quais são esses estados? No nosso Nordeste. Não é só taxa de analfabetismo alta ou mais grave nesses estados. Outros dados econômicos agora também são inferiores na região”, disse. Dando o nome que as coisas têm, Bolsonaro chamou o povo nordestino de ignorante.
No primeiro turno, Lula obteve 67% dos votos válidos contra 26,8% de Bolsonaro. O petista também venceu no Norte, mas no Sul, Sudeste e Centro-Oeste o atual presidente saiu vencedor.
Para tentar reduzir a diferença na região, Bolsonaro anunciou outro pacote eleitoreiro para tentar angariar votos da camada mais pobre da população, na qual ele tem ampla desvantagem em relação a Lula. Um dia depois do primeiro turno, ele prometeu que, se eleito, pagará um décimo terceiro salário a mulheres chefes de famílias beneficiárias do Auxílio Brasil.
As ofensas aos nordestinos não vieram somente do presidente. Logo após o resultado do primeiro turno, apoiadores dele dispararam mensagens preconceituosas aos nordestinosm Reportagem da BBC News Brasil mostrou que mensagens trocadas em grupos de WhatsApp e redes sociais de apoiadores do presidente chamam os eleitores nordestinos de “imbecis” e “jumentos”. A troca de mensagens começou antes mesmo do fim da apuração das urnas, no domingo.
Quando ofende os nordestinos, o presidente dá demonstrações não só de preconceito, mas também revela um total desconhecimento a respeito do Brasil que governa.
Dados do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) mostram que, dos 28 candidatos que obtiveram nota máxima na prova de redação do Enem 2020 (Exame Nacional do Ensino Médio), 12 estão no Nordeste, 11 no Sudeste, 3 no Norte, 2 no Centro-Oeste e nenhum na região mais bolsonarista do país, o Sul.
Além disso, dados do Inep mostram que o Nordeste tinha 413.709 universitários no ano 2000, portanto, antes do primeiro governo Lula. Em 2012, esse número saltou para 1.434.825, graças às políticas de inclusão social dos governos petistas. O número de cursos de doutorado e mestrado também cresceu 33% entre 2010 e 2012 no Nordeste.
Com isso, a região ultrapassou o Sul e passou a segunda com maior número de estudantes do ensino superior – 20% do total –, atrás apenas do Sudeste. Sete das 18 universidades criadas nas gestões petistas estão no Nordeste. E cada uma mantém unidades em mais de um município, beneficiando 28 cidades.
Além de dirigir ofensa aos nordestinos, Bolsonaro diz que região tem baixo desenvolvimento econômico por ser governada pelo PT
Em um discurso mais moderado na terça-feira (4), o presidente Jair Bolsonaro havia dito que o Brasil é um só e que tentar culpar os nordestinos por não ter vencido as eleições no primeiro turno não é correto. Mas, como sempre acontece com o presidente falastrão, ontem ele mudou o discurso e disparou a ofensa.
Além de chamar os nordestinos de analfabetos, Bolsonaro culpou as gestões dos governos petistas pelo índice de desenvolvimento econômico na região. “Esses estados do Nordeste estão há 20 anos sendo administrados pelo PT. Onde a esquerda entra, leva o analfabetismo, leva a falta de cultura, leva o desemprego, leva a falta de esperança. É assim que age a esquerda no mundo todo”, afirmou em transmissão ao vivo nas redes sociais.
Como de costume, o presidente mentiu, porque a maioria dos estados da região não é governada pelo PT. Para verificar a falácia, basta dar um Google e ver que é mentira deslavada.
Ao contrário do que disse Bolsonaro, Lula venceu no Nordeste porque a região, historicamente negligenciada pelos governos anteriores, melhorou seus indicadores nas gestões petistas. No entanto, ao longo da administração Bolsonaro, muitas dessas políticas foram desmontadas.
Além do Bolsa Família, que contribuiu para tirar muitas famílias da linha da pobreza e do mapa da fome, os governos Lula e de Dilma Rousseff realizaram uma série de outras políticas sociais inclusivas e grandes obras de infraestrutura, que contribuíram para o desenvolvimento social e econômico na região dos nordestinos.
Entre 2003 e 2013, o Nordeste teve índice de crescimento de 4,1% ao ano, enquanto o país ficou na marca de 3,3%, de acordo com o Banco Central. Só no ano de 2012, por exemplo, a economia local cresceu o triplo da brasileira.
Em 2014, a região passou a ser a segunda maior em consumo, atrás apenas do Sudeste, e corresponde a 13,8% da economia nacional.
Dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) apontam que, entre 2001 e 2012, o nordestino teve o maior ganho de renda entre todas as regiões, o que fez com a participação da base da pirâmide social caísse 66% para 45%.
Tudo isso fez com que a classe média deixasse de representar apenas 28% da população nordestina em 2002, para ser 45% em 2012.
Além disso, as ações petistas no Nordeste também geraram mais empregos. Em 2002, apenas 5 milhões de nordestinos tinham emprego formal, número que subiu para 9 milhões em 2013.
Mas a mudança maior veio na inclusão social. Em 2002, quando o presidente Lula foi eleito, mais de 21,4 milhões de nordestinos viviam em situação de pobreza. Em 2012, esse número caiu para 9,6 milhões, segundo estudo da Fundação Perseu Abramo, com base em dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Outra pesquisa divulgada no Fórum Brasil Regional, em junho de 2015, aponta que o Nordeste responde por 61% na redução da pobreza no país entre 2003 e 2013.
Redação ICL Economia
Com informações do site Fundação Perseu Abramo