O presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, vem insistindo em seus discursos de que a economia brasileira e o mercado de trabalho estão “bombando”. Essa percepção só ocorre mesmo no mundo de fantasia de Bolsonaro e de um de seus principais cabos eleitorais, o ministro da Economia, Paulo Guedes. Mas, segundo especialistas, a narrativa não deve colar no eleitor no segundo turno, a ser realizado no dia 30 de outubro. A propósito, dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) mostram que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) venceu em oito dos 10 municípios com as piores taxas de desemprego.
Desde antes do primeiro turno, Bolsonaro, que ficou 6 milhões de votos atrás de Lula no primeiro turno, e também seu aliados têm usado o discurso exageradamente otimista, tanto nas redes sociais como na propaganda eleitoral gratuita, sobre o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), aumento na criação de vagas de emprego, queda no preço dos combustíveis e obras em andamento ou finalizadas.
Porém, como se viu no resultado do primeiro turno, as medidas eleitoreiras implementadas por Bolsonaro somente visando ganhar a eleição têm efeito artificial sobre a economia, com validade apenas no curto prazo, como a redução dos preços dos combustíveis. Nem mesmo o início do pagamento do Auxílio Brasil de R$ 600 foi suficiente para Bolsonaro ganhar votos dessa fatia do eleitorado, majoritariamente eleitor de Lula.
Nesta terça-feira (11), será divulgado, pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o IPCA de setembro. A expectativa do Banco Central é de novo recuo, para menos 0,21%, com alívio nos preços do setor alimentação, que pesa mais na faixa mais vulnerável da população. Contudo, grande parte da população não vem sentindo os reflexões da queda no custo de vida, que permanece alto para essa camada da população. Lembrando que a inflação de alimentos avançou para 13,43% em 12 meses até agosto.
Apesar de todos esses prognósticos, o economista Heron do Carmo, professor da FEA-USP (Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo), destacou que os brasileiros não vão esquecer o saldo dos aumentos anteriores.
“A pessoa pode até perceber essa estabilização de preços, até a ligeira queda de alguns produtos agora. Mas, quando comparado com seis meses atrás, o quadro ainda é muito desfavorável”, disse à Folha de S.Paulo.
Na opinião dele, os indicadores econômicos, como o IPCA, são “ficção” para boa parte da população. “Como a referência das pessoas é baseada num período mais longo de observação, a melhora da economia tem um efeito para o candidato da situação, mas não dá para dizer que isso seja determinante a ponto de mudar o resultado da eleição”, disse.
O cientista político Carlos Melo, do Insper, também entrevistado pela Folha, tem a mesma percepção. “Houve deflação? Houve. Mas houve deflação de alimentos, de saúde? Não houve, pelo contrário. Enquanto essa melhora não chegar no carrinho de supermercado, o grande eleitor desse país, que são as mulheres, que são as pessoas que vão ao mercado, que cuidam das finanças da família, vai continuar sentindo a barra pesar”, pontuou.
Dados do emprego também não devem trazer vantagem a Bolsonaro no segundo turno das eleições
Outra narrativa de Bolsonaro de que o mercado de trabalho vai muito bem, não encontra espelho na realidade. O trabalhador brasileiro está sendo contratado por valores menores do que aqueles pagos no ano passado. Dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), do Ministério do Trabalho e Previdência, mostram que o salário médio de contratação no país, em empregos com carteira assinada, foi de R$ 1.926,54 em julho, ou seja, 2,82% abaixo dos R$ 1.982,55 pagos no mesmo mês do ano passado.
Ou seja, somado ao poder de compra corroído pela inflação ao longo do último ano, os brasileiros convivem com um mercado de trabalho mais precarizado e com salários mais defasados, embora tenha havia uma recuperação de renda no pós-pandemia de Covid-19.
Segundo Luiza Nassif, diretora do Centro de Pesquisas em Macroeconomia das Desigualdades da FEA/USP, a recuperação da renda é desigual. “A recuperação é mais rápida entre homens brancos, ela é mais rápida no Sudeste. Na verdade, ninguém alcançou ainda a renda média. E isso considerando o auxílio emergencial e o Auxílio Brasil”, disse à Folha.
Essa situação se refletiu no resultado do primeiro turno, a despeito do discurso de Bolsonaro. Das 10 piores no ranking de desemprego, 8 deram mais votos ao ex-presidente Lula no primeiro turno.
De acordo com a reportagem da Folha, as quatro cidades que mais perderam empregos até agosto, em números absolutos, estão na região Nordeste e registram saldos negativos de mais de 2.200 postos de trabalho cada uma: Sirinhaém (PE), Capela (SE), São José da Laje (AL) e Rio Formoso (PE). Em seguida, aparecem Indianópolis (MG), Parauapebas (PA), Lucélia (SP), São Miguel dos Campos (AL), Santo Antônio dos Lopes (MA) e Campo Alegre (AL).
Entre as cidades que compõem o ranking, Bolsonaro só teve mais votos do que Lula no município paraense e no paulista.
Por outro lado, nas 10 cidades que mais abriram postos de trabalho formais no ano, Bolsonaro obteve mais votos do que os demais candidatos em 6: Rio de Janeiro (47%), Brasília (51,6%), Belo Horizonte (46,6%), Curitiba (55,3%), Goiânia (56,1%) e Manaus (53,6%). Os dados são do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e do Caged.
Especialistas reconhecem que, de fato, há um saldo positivo de 1,853 milhão de vagas de janeiro a agosto no país. Mas os impactos do desemprego são muito mais prejudiciais em municípios menores. “Em cidades pequenas, o fechamento de vagas tem um impacto brutal. Muitos dependem do setor público para ter emprego também”, diz Sergio Firpo, pesquisador do Insper e colunista da Folha. “A mobilidade nesses locais é menor e a transição de um emprego para o outro ocorre em um intervalo maior.”
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e da Folha de S.Paulo