Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *
A semana passada foi marcada por diversas divulgações de índices inflacionários ao redor do mundo, e os dados surpreenderam pela queda observada da inflação. Até mesmo no Brasil, com uma nova pressão dos combustíveis, o índice veio abaixo do esperado, e não existe nenhum dado que sugira uma volta da inflação nos níveis vistos até meados do ano passado. E tudo isso veio após um forte ciclo de aperto monetário dos diversos bancos centrais ao redor do mundo. Mas será que isso realmente foi o responsável pela queda da taxa de inflação que estamos observando agora?
O caso mais emblemático é o dos Estados Unidos, que está em um longo ciclo de aperto monetário, com altas taxas de juros básicas para o histórico do país, e teve agora uma inflação abaixo do que era esperado. Ao mesmo tempo, vemos que o resultado esperado na economia americana não aconteceu. A alta taxa de juros não conseguiu reduzir o ritmo de atividade econômica nem mesmo aumentar o volume de desempregados. E, mesmo assim, a inflação começou a ceder. Então o que ocorreu neste caso?
Cada vez mais, principalmente após a pandemia, o debate moderno fala sobre uma possível inoperância da política monetária em influenciar a atividade econômica dos países. Pouco ela altera de fato a inflação e não é considerada um bom acelerador econômico em caso de queda. O que ela consegue fazer, na maioria dos casos, é resfriar o nível de atividade econômica, fazendo com que a economia tenha uma queda inflacionária pela falta de atividade econômica do país. Quando não tem ninguém querendo comprar nada, os comerciantes não têm condição de aumentar seus preços,
mesmo com alta de custos.
Podemos ir ao caso europeu, que sofre com as maiores consequências da guerra entre Rússia e Ucrânia, com uma economia bastante desaquecida e com elevada inflação. A taxa de inflação lá não é nem de perto culpa de uma demanda aquecida, é resultado do aumento do custo com energia e alimentos, já que a região do conflito era a maior fornecedora desse tipo de bens para o restante do continente. Mesmo assim, elevaram a taxa de juros para coibir a inflação. Lá o resultado deu certo, mas não reduziu o preço dos alimentos nem dos bens energéticos. O que ocorreu foi uma estagnação do preço de todos os outros bens, resultado direto de uma economia que pouco produz e pouco consome
com tal movimento monetário.
Então, o que de fato esse aperto monetário gerou não foi nenhum bom controle monetário. Ele conseguiu gerar uma desaceleração econômica que estrangulou as economias locais, e acabou assim conseguindo corrigir a inflação. É como você tratar uma doença com o remédio errado. Na tentativa de acabar com a febre do paciente, fizeram um tratamento agressivo, o que resultou na morte do paciente. A febre foi embora, já que um paciente morto não tem febre, então o “problema” foi resolvido. Mas a que preço?
É preciso repensar esse movimento único, de tentar controlar a inflação somente com base na taxa de juros. É evidente que existem muitas fontes inflacionárias, e boa parte delas não são afetadas por apertos monetários. Mesmo assim, os bancos centrais do mundo só se utilizam deste único método para isso. É preciso repensar globalmente tal atuação, pois vimos o resultado desastroso do aperto monetário em todo o mundo, que foi uma economia inerte e gerando cada vez mais problemas sociais.
*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais
*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorando pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira