Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *
Recentemente ocorreu um dos ataques mais baixos e repugnantes por parte do mercado e da grande imprensa a Marcio Pochmann, doutor em economia, professor da Unicamp e que tem em seu currículo uma passagem pela presidência do IPEA, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada do governo federal. Ele foi o escolhido pelo presidente Lula para presidir o IBGE, e os seus títulos e experiência já deveriam ser por si só uma justificativa plausível para a escolha do cargo, mas o que se viu foi um dos festivais dos mais lamentáveis a uma pessoa que esconde, na verdade, um ataque a uma categoria inteira de economistas.
Os ataques começaram questionando sua competência como gestor, devido a sua atuação no IPEA, visto por muitos como ideológico. As alegações foram do afastamento de dois economistas que estavam alocados na instituição, além de um concurso no qual muitos economistas da Unicamp e da UFRJ entraram, mostrando uma predileção, segundo estes, para economistas ideológicos e com pouca técnica econômica. Mas a jogada mais pesada veio a seguir, quando foi cogitado a possibilidade de que Pochmann poderia maquiar ou manipular os dados da instituição para melhorar a imagem do governo Lula.
Isso aconteceu há poucos dias de tudo o que agora sabemos do “dono” da economia brasileira, Roberto Campos Neto, que fez um modelo matemático de baixa qualidade, já dentro do cargo de presidente do Banco Central, que foi utilizado não somente pelo mercado financeiro, mas também pela campanha de Bolsonaro e de Tarcísio para tentar estimar o resultado das urnas. Além disso, avisou a quem quisesse ouvir quando que o COPOM iria começar o ciclo de baixa da taxa de juros, numa reunião com os maiores nomes do mercado brasileiro.
Esse conjunto todo mostra que o ataque a Pochmann é um ataque a qualquer economista heterodoxo brasileiro. A qualquer economista que levante questões ou dúvidas sobre o funcionamento correto dos ditos modelos econômicos sagrados. A crítica é a escola da Unicamp, um dos centros formadores dos economistas mais críticos ao modelo atual de condução econômica, e além de tudo, é uma forma de manter uma reserva de mercado que somente os ditos “técnicos”, que são os economistas liberais ortodoxos, mereceriam estar em tais cargos.
As acusações foram gravíssimas e levaram a desconfiança de todo o público. Já existem pessoas que estão duvidando dos dados oficiais do país depois dessa tentativa de queima de reputação ao vivo, e o estrago na cabeça do brasileiro pode ser maior do que o imaginado. Tudo isso pois é proibido que um economista heterodoxo, que seja crítico ao modelo liberal, tenha alguma visibilidade dentro de um governo progressista e de esquerda. E graças a isso diversos outros economistas deste campo sofreram acusações por parte do público de serem fracos tecnicamente, de não saberem utilizar modelos econômicos sofisticados, e até mesmo de não conseguirem trabalhar com matemática.
O que se viu recentemente foi um ataque, dos mais nefastos, a toda uma categoria de economistas, que ousaram dizer o óbvio, que a economia liberal não funciona, e que é preciso ter alguma solução alternativa a isto. E conseguiu novamente difamar a tal ponto que a própria ala progressista vê com alguma desconfiança essa parcela. A irresponsabilidade dessas pessoas vai cobrar caro, quando o governo for questionado pela lisura de seus dados numa instituição tão antiga quanto é o IBGE. Mas para manter a reserva de mercado, os liberais foram capazes de tudo, até mesmo de difamar pessoas sem provas, jogando a reputação de um ótimo quadro econômico, como é Pochmann, na lama. Mas ele, e todos os heterodoxos, vão sair maiores e melhores desse ataque violento, pois sempre foi assim e dificilmente as coisas vão mudar.
*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais
*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorando pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira