Auditores enfrentam dificuldades para resgatar mulheres da escravidão doméstica e sexual, resultando em baixo número de notificações

A invisibilização do trabalho doméstico ajuda a explicar a pequena proporção de mulheres resgatadas da escravidão doméstica. O trabalho doméstico só ganhou legislação específica e ampliada em 2013, com a PEC das domésticas
4 de julho de 2023

A escravidão doméstica e sexual de mulheres é subnotificada no Brasil. Nos últimos 20 anos, 2.488 mulheres foram resgatadas de condições análogas à escravidão, informou a Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) do Ministério do Trabalho para o jornal Folha de S Paulo. O número é 5% do total de trabalhadores resgatados na série histórica. O Detrae começou em 1995, mas o primeiro registro de resgate de trabalho escravo doméstico é de 2017. Já a escravidão sexual só aparece em 2019. No geral, incluindo homens e mulheres, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) resgatou 918 trabalhadores em situação de escravidão entre janeiro e 20 de março de 2023.

Para a reportagem da Folha de S Paulo, a auditora do Detrae Jamile Virgílio  explicou que o preconceito, a ideia de que o homem é o provedor da família e a invisibilização do trabalho doméstico ajudam a explicar a pequena proporção de mulheres resgatadas.

A coordenadora da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) do Ministério Público do Trabalho (MPT), Lys Sobral Cardoso, também afirmou para a reportagem da Folha de S. Paulo que, ao consolidar o trabalho, a conclusão foi de que o trabalho escravo doméstico e a escravidão sexual estão invisibilizados.

Cobertura da escravidão doméstica e sexual está em fase inicial no Ministério do Trabalho

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crédito: Agência Brasil / Pedro Ventura

O trabalho sexual não tem caráter laboral reconhecido pela sociedade, nem pelo Judiciário. Já o trabalho doméstico ganhou legislação específica e ampliada em 2013, com a PEC das Domésticas.

Desde 2021, houve uma alta de denúncias envolvendo como vítimas empregadas domésticas, devido ao que os auditores chamam de “efeito Madalena”. Com a repercussão gerada pela história de Madalena Gordiano, resgatada há dois anos, as denúncias foram de 5, em 2020, para 31, em 2021.

Os crimes de tráfico de pessoas e exploração sexual no país não são competência do Ministério do Trabalho, mas do Ministério da Justiça. A cobertura da escravidão sexual e do tráfico de pessoas pelo Ministério do Trabalho no Brasil está em fase inicial, segundo os auditores.

No último plano de enfrentamento ao tráfico de pessoas, o Ministério da Justiça incluiu a necessidade de cruzamento de dados com a pasta do Trabalho. Segundo Marina Bernardes, coordenadora de gestão da Política e dos Planos Nacionais de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Ministério da Justiça, mesmo os dados do tráfico são reduzidos, e espalhados por diferentes órgãos públicos. Bernardes diz que o próximo passo é unificar os entendimentos dos juízes e procuradores sobre tráfico de pessoas e trabalho escravo.

Segundo dados do Detrae para a reportagem da Folha de S Paulo, o Ministério do Trabalho tem um efetivo pequeno para cobrir todas as atividades. Uma ação para resgatar uma trabalhadora poderia livrar 50 homens da escravidão rural. Dependendo do local, tem 200 trabalhadores nas vinícolas, mas não se encontram 200 mulheres em um prostíbulo. Isso mostra que os auditores têm dificuldade para resgatar mulheres da escravidão doméstica e sexual. No Brasil, prostituição não é crime, mas lucrar com prostituição alheia, sim.

A divulgação dos dados oficiais é só de trabalhadores resgatados, não se presta a dar um panorama de trabalho escravo no Brasil. Quanto mais o Ministério do Trabalho faz resgates, mais denúncias recebe.

Mundialmente, a exploração sexual é uma das principais formas de escravidão moderna. Em 2021, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), 54% das pessoas resgatadas eram mulheres. Quando desconsiderado o trabalho sexual e o casamento forçado, elas representaram 32% do total.

Fernanda Rangel, pesquisadora da UFRRJ (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro), estuda a subnotificação de mulheres escravizadas no país. A pesquisadora explicou para a reportagem a Folha de S Paulo, que os Estados Unidos e Europa têm se aprimorado em reconhecer casos de trabalho escravo para além do sexual, enquanto o Brasil precisa fazer o contrário. “A gente divulga bastante o que é a exploração laboral. Temos que treinar nossa sociedade a identificar possíveis casos de exploração sexual”, disse para a reportagem.

A reportagem da Folha de S Paulo informa que, nos Estados Unidos e na Europa, o combate à escravidão moderna começou pelo tráfico de pessoas para trabalho sexual. O Brasil seguiu uma ordem inversa. Aqui, o combate ao trabalho escravo começou dentro de uma lógica econômica laboral.

Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S Paulo e das agências de notícias

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