“Não podemos voltar à época em que só havia deveres e não direitos”, diz Lula ao assinar proposta para motoristas de aplicativos

A proposta contempla questões essenciais como remuneração, previdência, segurança e saúde, e transparência, e será enviada ao Congresso Nacional para aprovação.
4 de março de 2024

O presidente Lula (PT), assinou, nesta segunda-feira (4), em cerimônia no Palácio do Planalto, uma Proposta de Projeto de Lei Complementar (PLC) que tem por objetivo garantir direitos mínimos para motoristas de aplicativos. O documento aponta para a criação de mecanismos previdenciários e melhoria das condições de trabalho, a partir de quatro eixos: remuneração, previdência, segurança e saúde e transparência. O PLC será enviado ao Congresso Nacional e, caso seja aprovado, entrará em vigor após 90 dias.

O PLC é resultado de acordo no Grupo de Trabalho Tripartite, criado em maio de 2023, coordenado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com representantes dos trabalhadores, das empresas e do Governo Federal e teve acompanhamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Ministério Público do Trabalho (MPT) entre outros.

O “trabalhador autônomo por plataforma”, nome para fins trabalhistas da nova categoria, receberá R$ 32,09 por hora de trabalho e remuneração de, ao menos, um salário-mínimo (R$ 1.412) e contribuição de 7,5% ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

O período máximo de conexão do trabalhador a uma mesma plataforma não poderá ultrapassar 12 horas diárias. Para receber o piso nacional, o trabalhador deve realizar uma jornada de 8 horas diárias efetivamente trabalhada.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, o Brasil tinha 778 mil pessoas que exerciam o trabalho principal por meio de aplicativos de transporte de passageiros, representando 52,2%, de um total de 1,5 milhão de pessoas que trabalhavam por meio de plataformas digitais e aplicativos de serviços, o equivalente a 1,7% da população ocupada no setor privado.  O levantamento mostra que enquanto 44,2% dos ocupados no setor privado estavam na informalidade, entre os trabalhadores de aplicativos esse percentual chega a 70,1%.

Vários países do mundo discutem a regulação do trabalho com as empresas que operam aplicativos, de modo a reconhecer a responsabilidade destas com os trabalhadores e trabalhadoras.

Hoje, o segmento dos trabalhadores e trabalhadoras de aplicativos são unânimes nas reclamações pela falta de direitos. Muitos profissionais relatam rotinas com muitas horas de trabalho, alto custo com manutenção dos carros, aumento da instabilidade financeira, falta de cobertura previdenciária em casos de ausência por doença ou força maior e desgastes físico e emocional.

Lula diz que este é um dia histórico para motoristas de aplicativo

Durante o evento, o presidente Lula celebrou os avanços nas discussões trabalhistas durante a assinatura da Proposta de Projeto de Lei Complementar voltada para motoristas de aplicativos, marcando um momento histórico na busca por garantias mínimas de direitos para esses trabalhadores.

Lula iniciou seu discurso com uma dose de humor, dirigindo-se ao senador Jaques Wagner (PT-BA), e destacou a importância de convencer os empresários de setores correlatos a participarem das negociações. “O dono do iFood é da Bahia e, portanto, como todo bom baiano, a gente tem que convencê-lo a entender que é prudente ele sentar na mesa de negociação para a gente fazer um bom e grande acordo”, disse o presidente.

O cerne das declarações de Lula girou em torno da necessidade de equilibrar os direitos dos trabalhadores com as demandas empresariais, evitando retrocessos. “Não podemos voltar a um tempo em que as pessoas só tinham deveres e não tinham direitos”, enfatizou. “Eu pensava: como é que vamos encontrar uma solução para dar o direito aos empresários investirem e terem um lucro com isso, mas também aos trabalhadores saberem que vão prestar serviços, ser respeitados por isso e quando tiver um infortúnio na vida deles, eles não ficarão abandonados na rua da amargura. Porque se não tiver uma regulação, é isso que vai acontecer”, acrescentou.

“O dia de hoje para alguns pode parecer normal. Mas a história vai provar que esse é um dia especial. É um dia especial porque há um tempo atrás ninguém acreditava que seria possível estabelecer uma mesa de negociação entre trabalhadores e empresários e fosse sair um projeto como este, que garante direitos aos trabalhadores por aplicativo de transporte de passageiros”, celebrou o presidente.

Lula também destacou a necessidade de dar autonomia a empresários e trabalhadores, mas de forma a manter as garantias trabalhistas. “Vocês [quem participou da confecção da proposta e das discussões] acabaram de criar uma nova modalidade no mundo do trabalho. Foi parida uma criança nova no mundo do trabalho. As pessoas querem ter autonomia e terão, mas, ao mesmo tempo, as pessoas resolveram acordar com os empresários e com o governo de que querem autonomia mas precisam de um mínimo de garantia”, enfatizou o presidente.

Em sua fala, Lula lembrou da resistência às mudanças tecnológicas, mas ressaltou a capacidade das categorias profissionais de se adaptarem e se organizar. Ele também destacou a importância de resolver os impasses através do diálogo e do entendimento mútuo entre trabalhadores, empresários e governo.

“Não adianta o sindicato ficar de cara ruim quando o empresário quiser reclamar de uma coisa e chamar para conversar; e também não adianta o empresário ficar de cara ruim quando os trabalhadores quiserem conversar. Para resolver esses impasses de cara feia, a gente dá um sorriso e fala o seguinte: Nós vamos vencer, somos um povo que não desiste nunca, é só a gente querer”, afirmou.

Ele cobrou esforços dos ministérios envolvidos para negociar com as lideranças do Congresso Nacional pela aprovação da proposta e garantiu: “o governo federal vai fazer o máximo possível para aprovar o mais rápido possível. Vão ter pessoas contra, mas é preciso de paciência.”

As propostas do Projeto de Lei Complementar

Cobertura dos custos – Para cada hora efetivamente trabalhada, será pago um valor de R$ 24,07/hora, destinado a cobrir os custos da utilização do celular, combustível, manutenção do veículo, seguro, impostos, entre outros. Esse valor é indenizatório e não compõe a remuneração.

Previdência – Os trabalhadores e trabalhadoras serão inscritos obrigatoriamente no Regime Geral da Previdência Social (RGPS), com regras específicas para o recolhimento da contribuição de cada parte (empregados e empregadores):

1) Os trabalhadores irão recolher 7,5% sobre os valores referentes à remuneração (que compõe 25% da hora paga, ou seja, R$ 8,02/hora);
2) Os empregadores irão recolher 20% sobre os valores referentes à remuneração (que compõe 25% da hora paga, ou seja, R$ 8,02/hora);
As empresas devem realizar o desconto e repassar para a Previdência Social, juntamente com a contribuição patronal.

Auxílio maternidade – As mulheres trabalhadoras terão acesso aos direitos previdenciários previstos para os trabalhadores segurados do INSS.

Acordo coletivo tripartite – O trabalhador em aplicativo será representado por entidade sindical da categoria profissional “ motorista de aplicativo de veículo de quatro rodas”. As entidades sindicais terão como atribuições: negociação coletiva; assinar acordo e convenção coletiva; e representar coletivamente os trabalhadores nas demandas judiciais e extrajudiciais de interesse da categoria.

Sobre o Grupo de Trabalho Tripartite : As centrais sindicais que participaram do Grupo Tripartite foram: Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical (FS), Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST) e a União Geral dos Trabalhadores (UGT).

Os representantes das empresas Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), iFood, Uber, Zé Delivery, Lalamove, Movimento de Inovação Digital (MID), Mercado Livre, Rappi, 99, inDrive, Mercado Livre, Rappi, Associação Latino-Americana de Internet (Alai).

O grupo do governo federal que trabalhou na construção do documento teve representantes dos Ministérios do Trabalho e Emprego (MTE), da Previdência Social (MPS), do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), da Fazenda (MF), da Justiça e Segurança Pública (MJSP), da Casa Civil e da Secretaria Geral da Presidência da República e da Advocacia Geral da União (AGU).

Do Brasil 247 

 

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