Tramita no Senado uma polêmica PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que pretende permitir a comercialização de plasma humano, incluindo para o exterior. A PEC do plasma estava na pauta de votação da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça da Casa) ontem (13), mas foi retirada a pedido do autor da matéria, o senador Nelsinho Trad (PSD).
Polêmica, a votação da PEC foi várias vezes adiada no Senado. A proposta, que visa alterar a Constituição para permitir a comercialização do plasma humano, enfrenta resistência de parlamentares governistas e desagrada o Ministério da Saúde, mesmo após uma série de mudanças no texto.
Um dos críticos da matéria, o senador Humberto Costa (PT-PE), que é médico e foi ministro da Saúde no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, se manifestou, na última terça-feira (12), em pronunciamento no plenário do Senado, contrário à PEC 10/2022.
Para o parlamentar, a prática representa “grande perigo” para a população, que está sujeita a riscos à saúde. “O que nós estamos discutindo aqui é a segurança sanitária […]. É nós termos a certeza de que quem doa sangue, quem doa plasma, esteja apto para fazê-lo, e que quem vai receber não está correndo risco de adquirir doenças infecciosas provenientes do doador […]. Nós estamos transformando isso numa atividade mercantil com todos os problemas que ela tem. Quem não lembra, na década de 1980, como funcionava o Sistema Nacional de Sangue? As pessoas vendiam o seu sangue. Daí veio a Aids, a hepatite C e tantas outras doenças que acometeram a população do nosso país”, disse o líder do governo no Senado.
O plasma é uma fração líquida que corresponde a 55% do volume de sangue e pode ser usado para a produção de medicamentos para o tratamento de hemofilia, câncer, Aids, doenças renais e imunodeficiências.
A proposta do senador Trad foi apresentada em 2022 após a percepção de desperdício de plasma nos laboratórios particulares do país.
Segundo estimativas da ABBS (Associação Brasileira de Bancos de Sangue), publicadas pelo jornal O Globo, cerca de 85% do total de plasma produzido pelos bancos de sangue privados é descartado. Os outros 15% são usados em transfusões de sangue.
A PEC propõe alterar parte do artigo 199 da Constituição Federal, que determina que a assistência à saúde é livre à iniciativa privada, mas proíbe “todo tipo” de comercialização de tecidos, órgãos e substâncias humanos, com “exceção do plasma”.
Para senadores opositores da PEC do plasma, brecha para comercialização colocaria hemocentros sob risco
Ao O Globo, a vice-líder do governo no Congresso, a senadora Zenaide Maia (PSD), disse que “uma brecha para a comercialização é grave porque temos o hábito de ter a doação voluntária”.
A parlamentar avalia que, “pela necessidade e pobreza, as pessoas venderiam o próprio plasma e isso colapsaria a Hemobrás e acabaria com o campo de política pública do SUS [Sistema Único de Saúde]. Plasma é uma parte do sangue humano, não é commodity para comercializar”, criticou.
A Hemobrás, vinculada ao Ministério da Saúde, é o único órgão autorizado a processar o plasma para transformá-lo em medicamentos ou usá-lo em pesquisas.
O racha em relação à proposta foi amplificado após alterações na proposta feitas pela relatora da PEC, a senadora Daniella Ribeiro (PSD), que incluiu no texto a possibilidade de comercialização do plasma por hemorredes e laboratórios privados para outras empresas, até mesmo para fora do Brasil.
A senadora também defendia a remuneração da coleta de plasma, modelo que permitiria que os doadores recebessem dinheiro pela doação — a última alteração, contudo, foi retirada da PEC após críticas de colegas e de secretários do Ministério da Saúde.
Na opinião da relatora, a comercialização do plasma vai ampliar e melhorar o atendimento dos laboratórios aos pacientes brasileiros. Ela aponta ainda que a Hemobrás precisaria ser quatro vezes maior para atender toda a demanda do país.
“Hoje somos completamente dependentes dos Estados Unidos no quesito medicamentos”, disse.
Por sua vez, o governo argumenta que a venda de plasma não resultaria em acesso aos medicamentos produzidos a partir da substância pela população de baixa renda, além de provocar desfalque no banco de sangue, prejudicando o desenvolvimento da Hemobrás.
O Ministério da Saúde também se posicionou contrariamente à venda de plasma parar o exterior. Para a pasta, as doações de sangue e plasma devem retornar como benefícios para os brasileiros, por meio de transfusões ou novos remédios e tratamentos.
Redação ICL Economia
Com informações da Agência Senado e de O Globo