Projeto de lei do marco temporal das terras indígenas deve ser votado hoje (30). Junção de provas, prevista no texto, é vista como inacessível

Para as terras indígenas serem consideradas terras ocupadas tradicionalmente, os povos indígenas deverão comprova objetivamente que elas, na data de promulgação da Constituição, eram habitadas em caráter permanente
30 de maio de 2023

O presidente da Câmara, Arthur Lira, afirmou que deve colocar o projeto de lei do marco temporal das terras indígenas, em votação, nesta terça (30). A Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira (24), por 324 votos a favor e 131 contra, o requerimento de urgência para o projeto de lei do marco temporal na demarcação de terras indígenas (PL 490/07). O projeto restringe a homologação de terras àquelas já tradicionalmente ocupadas por esses povos em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição federal.

Isso significa que, para serem consideradas terras ocupadas tradicionalmente, deverá ser comprovado objetivamente que elas, na data de promulgação da Constituição, eram habitadas em caráter permanente, usadas para atividades produtivas e necessárias à preservação dos recursos ambientais e à reprodução física e cultural. 

O projeto de lei do marco temporal entra em contradição com proposta do governo Lula, durante a campanha eleitoral, que era revogar normas que abrem brechas para exploração de madeira em terras indígenas.

Medida pode impactar quase 100% das terras indígenas, estejam elas com procedimento em aberto ou sem demarcação

Após requerimento de urgência para aprovar o projeto de lei, representantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) afirmaram que a medida pode impactar quase 100% das áreas reivindicadas por indígenas — sejam elas com procedimento em aberto ou sem demarcação —, e ainda os territórios já homologados depois da Constituição Federal de 1988.

Entre as 1.393 terras indígenas no Brasil, apenas 437 foram homologadas — o número corresponde a atos de antes e depois da Constituição. Do total de territórios, 871 (62%) seguem com pendências para sua regularização, sendo que 598 são áreas reivindicadas que não contam com qualquer providência do Estado para o início de processo de demarcação.

O assessor jurídico do Cimi, Rafael Modesto, explicou para a reportagem do G1 que, com o marco temporal, os indígenas que vivem em terras homologadas podem ser obrigados a comprovar que já habitavam o local antes de 1988. Esse processo de junção de provas, no entanto, é inacessível, visto que muitos povos foram desapropriados de seus territórios de origem e tiveram que se refugiar para sobreviver.

Outro ponto, relatado por Modesto, que deve ser levado em consideração é que também há povos que ainda vivem em seus territórios de origem e podem comprovar, mas a homologação seria de pequenas proporções de terra, visto que boa parte das áreas foi explorada.

No grupo de terras com pendências ou que foram reivindicadas mas ainda não têm um parecer, a necessidade de comprovar a data inicial de ocupação pode tornar todo o processo ainda mais demorado.

Na avaliação do advogado do Cimi, o Marco Legal é visto como um retrocesso pois pode desalojar povos. E as terras que estão em processo de homologação podem retornar ao estado. Sendo assim, onde vão colocar os habitantes dessas comunidades?

A notícia foi recebida com indignação pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Para a entidade, o projeto vai aumentar ainda mais os conflitos, e aumentar a insegurança dos povos. Mesmo não sendo uma casa com a maioria a nosso favor, Apib quer dialogar com a pauta constitucional e avisa que não é possível traçar uma projeção das solicitações de territórios a serem demarcados que poderão ser afetadas, caso a pauta realmente seja aprovada. Há uma grande demanda de terras indígenas, desde as judicializadas às suspensas.

A avaliação do governo Lula vinha sendo positiva para efetivar o compromisso com os povos indígenas, mas a Apib entende que há interferência da coalizão que ajudou a eleger o presidente. O Ministério dos Povos Originários já sofre com ataques e está sendo esvaziado. A transferência da responsabilidade para o Ministério da Justiça requer a criação de um espaço específico dentro da pasta.

O Brasil tem 1.652.876 pessoas indígenas, de acordo com dados parciais do Censo de 2022, divulgados no início de abril pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O número preliminar ainda pode aumentar na divulgação dos resultados definitivos da pesquisa. Na comparação com o Censo de 2010, quando o total era de cerca de 870 mil indígenas, o aumento é de 84%. No total, eles estavam distribuídos em 305 etnias, que falavam 274 línguas diferentes. Este número ainda sofrerá atualização com o novo levantamento nacional.

Redação ICL Economia
Com informações do site G1

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