Quilombola compra ação da Vale para participar de reunião e denunciar impactos do projeto Serra da Serpentina

Projeto Serra da Serpentina, para extração e transporte de minério de ferro, com instalação de cavas, uma usina e um mineroduto de 115 km, além de pilhas de rejeitos, está em processo de licenciamento
3 de maio de 2023

Reportagem publicada na Folha de S Paulo conta a estratégia usada pela quilombola Marlene Mateus de Sousa, 52, que comprou uma ação da Vale, por R$ 79,90, para ter direito a participar da reunião de acionistas sobre o projeto Serra da Serpentina. Como portadora da ação, ela teve direito de falar em assembleia online na sexta-feira (28) para protestar contra uma iniciativa da empresa e denunciar o que ela considera como violações do projeto Serra da Serpentina, em Minas Gerais.

O projeto Serra da Serpentina prevê a instalação de cavas, uma usina e um mineroduto de 115 km, ligando os municípios de Conceição do Mato Dentro e Nova Era, além de pilhas de rejeitos. A iniciativa, para extração e transporte de minério de ferro, está em processo de licenciamento.

Os habitantes de Brumadinho, em Minas Gerais,  onde ocorreu o rompimento da barragem da Vale há 4 anos,  ainda sofrem com problemas relacionados à contaminação do solo, do ar e da água da Bacia do Rio Paraopeba. Ao mesmo tempo, a Vale nega aos atingidos a participação nos debates sobre as ações de reparação.

Marlene Mateus de Sousa é coordenadora da Comissão das Comunidades Quilombolas do Alto e Médio Rio Doce, que representa mais de 40 comunidades tradicionais, entre quilombolas e indígenas. Uma das principais reclamações dos moradores é que o novo projeto na Serra da Serpentina, desenvolvido pela mineradora, contraria a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que determina que comunidades tradicionais afetadas sejam previamente consultadas.

“Como mulher preta quilombola e coordenadora da comissão, trabalho para que o rio Doce e seus afluentes não sejam palco de mais um crime. Vimos como foi devastadora a tragédia em Mariana para as comunidades”, afirmou Marlene para a reportagem da Folha de S Paulo. “Para os povos tradicionais, ela ressalta, o rio “é uma divindade”. “Não se trata só de uma terra, mas de um território sagrado”.

Quilombolas temem que o empreendimento da Vale cause danos ambientais na Serra da Serpentina

represa, Mariana, rompimento, Vale, Serra da Serpentina

Crédito: Fred Loureiro/ Secom ES

Além da reclamação sobre não terem sido consultados em relação aos impactos do projeto na Serra da Serpentina, os quilombolas temem que o empreendimento cause danos ambientais na região. Segundo eles, o mineroduto, por exemplo, está previsto para passar dentro do território de algumas comunidades.

Outras preocupações são a poluição dos rios da região, o barulho, o desmatamento e a chegada de um grande volume de trabalhadores de outros locais.

Ao todo, a estimativa é que sejam atingidos 51 quilombos em 11 cidades mineiras. Entre os municípios estão: Antônio Dias, Carmésia, Conceição do Mato Dentro, Dom Joaquim, Itambé do Mato Dentro, Morro do Pilar, Nova Era, Passabém, Santa Maria de Itabira, Santo Antônio do Rio Abaixo e São Sebastião do Rio Preto.

A Vale afirmou para a reportagem da Folha de S Paulo que, “com a oportunidade de escuta ampla e ativa, considerando interlocutores da empresa”, o projeto Serra da Serpentina está em revisão.

No texto publicado, a  Vale afirmou que o projeto está sendo revisado e novo EIA [Estudo de Impacto Ambiental] será protocolado tão logo os estudos atualmente em andamento sejam finalizados. Ainda avisou que “aguarda emissão da autorização de manejo de fauna terrestre e aquática pelo órgão ambiental para finalizar os levantamentos para o EIA do novo projeto”.

Segundo o governo do estado de Minas Gerais, a avaliação do órgão estadual responsável ainda está em curso, em fase inicial de análise. O pedido de licenciamento foi formalizado em setembro do ano passado.

“Todos os impactos ambientais bem como as propostas de medidas de controle e mitigação, inclusive no que se refere aos impactos socioeconômicos, serão avaliados no curso do processo”, diz, em nota para a reportagem da Folha de S Paulo.

Ainda de acordo com a gestão Romeu Zema (Novo), não há qualquer ato administrativo que ateste a viabilidade do empreendimento, a instalação ou operação da atividade até o momento.

A Comissão de Comunidades Tradicionais decidiu também entrar na Justiça com uma ação contra a Vale e o estado de Minas Gerais para a suspensão do projeto Serra da Serpentina.

Para Matheus Leite, advogado dos quilombolas, a mineradora mente ao afirmar que as operações não vão causar impactos nas comunidades. “É desmentida por seu próprio EIA-Rima”, opina.

O estudo da mineradora encaminhado aos órgãos licenciadores, diz o advogado, está em grande parte baseado em dados secundários, porque a empresa não enviou equipes para fazer o levantamento das informações in loco nas comunidades.

Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S Paulo

Continue lendo

Assine nossa newsletter
Receba gratuitamente os principais destaques e indicadores da economia e do mercado financeiro.