Estudo mostra renda total das classes A e B subindo mais que o dobro em relação à da classe D/E. Ações do governo visam à mudança deste cenário

Em 2023, devido aos R$ 145 bilhões da PEC da Transição, o aumento de 6,4% na massa de renda total da classe D/E fica bem acima dos 2,2% da C, próximos dos 6% das classes A e B. Mas o percentual da classe D/E será diluído nos próximos anos, beneficiando os mais ricos. Governo Lula quer mudar esse cenário
2 de agosto de 2023


Reportagem da Folha de S Paulo, com o estudo da consultoria Tendências, mostra para os próximos anos a renda total das classes A e B subindo mais que o dobro da renta total da D/E. A classe C teria um aumento intermediário nos rendimentos. Um arsenal de medidas do governo Lula, que está sendo colocado em prática, tem o objetivo de mudar esse cenário visualizado na pesquisa. 

O aumento da pobreza no Brasil nos últimos quatro anos levou a maioria dos brasileiros das classes C, D e E a recorrer a empréstimos para conseguirem comer e pagar as contas básicas.

Como o Brasil não possui critério oficial para definir classes sociais, as consultorias usam parâmetros próprios para delimitá-las nas pesquisas. Nos critérios da consultoria Tendências, estão na classe D/E famílias com renda total domiciliar mensal até R$ 3.200. Na faixa A e B,  renda total superior a R$ 7.600. Na C, foi adotada renda total entre R$ 3.200 e R$ 7.600.

Segundo a reportagem, logo que Lula assumiu a presidência, reforçou programas sociais voltados à classe D/E, como o aumento do Bolsa Família e do Auxílio Gás, a redução da fila do INSS e a volta do Minha Casa Minha Vida, entre outros. Fez isso com recursos da PEC da Transição, que liberou R$ 145 bilhões, fora do teto de gastos, no Orçamento de 2023.

De acordo com o estudo da Tendências, essas ações produzirão neste ano aumento de 6,4% na massa de renda total da classe D/E, bem acima dos 2,2% da C. Com isso, os ganhos da classe D/E em 2023 ficarão próximos dos das classes A e B (6%) —que vêm se recuperando rapidamente desde o fim da pandemia.

Em entrevista para a Folha de S Paulo, Lucas Assis, analista de macroeconomia da Tendências, explica que os efeitos das medidas para os mais pobres são fortes em 2023, mas acabarão diluídos nos próximos anos, com a recuperação econômica beneficiando os mais ricos. “A mobilidade social daqui para a frente se dará em ritmo reduzido, num fenômeno típico de países com alta desigualdade”, afirma Assis. “Enquanto há lenta migração para a classe média, as classes mais altas liderarão a retomada e o crescimento da renda.”

Assis destaca, na reportagem, que não é esperada queda de renda em nenhuma das classes nos próximos anos. Mas que os mais ricos se beneficiarão de remuneração maior de seus investimentos (com juros altos), de aluguéis e do lucros de suas empresas, que devem voltar a patamares históricos, mais elevados que nos últimos anos . “Nas classes A e B há também concentração de funcionários públicos, em que a dinâmica da economia pouco interfere, pois eles têm estabilidade”, diz Assis.

Nos dois primeiros mandatos do presidente Lula, o Brasil contou com forte impulso externo e cresceu 4,1% ao ano, em média, ante 2,4% nos anos FHC (1995-2002).

Durante os governos do petista, a economia mundial teve o maior crescimento sincronizado desde a Segunda Guerra; e o PIB da China aumentou entre 10% e 12% ao ano, causando um boom nos preços das commodities que o Brasil exporta.

Lula encontrou, agora, o Brasil em situação pior nas contas públicas, mais difícil para a mudança da renda total nas faixas D/E

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Crédito: Fundação Perseu Abramo

A reportagem da Folha de S Paulo mostra que o Brasil encontra-se em situação muito pior no que se refere às contas públicas do que nos governo anteriores de Lula. Ele herdou superávits primários (para abater a dívida pública) do governo FHC e manteve as contas no azul em seu mandato.

O esforço do governo Lula agora é para repetir superávit e mudar o cenário traçado pelo estudo da Tendências Consultoria. 

A equipe do governo Lula está colocando em prática um arsenal de medidas. Entre as ações, estão projetos de lei para taxar investimentos em paraísos fiscais e mudar tributação de fundos exclusivos, focados em altíssima renda, além de tributar apostas esportivas. 

O objetivo do conjunto de medidas é aumentar as receitas e fechar o Orçamento de 2024 com déficit zero, meta estabelecida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A proposta orçamentária será enviada no dia 31 de agosto e, até lá, a previsão do Planalto é mandar ao Congresso uma série de projetos.

Cálculos internos estimam que será necessário levantar mais de R$ 120 bilhões para o governo federal zerar o déficit no próximo ano. Em 2023, o rombo nas contas públicas deve ficar próximo de R$ 100 bilhões. Ao lançar as medidas agora, a Fazenda consegue colocar as receitas estimadas na proposta orçamentária.

Técnicos do Ministério da Fazenda ainda estão fechando as contas do que exatamente vai entrar no Orçamento e quais as estimativas para cada uma das medidas.

Marcelo Neri, diretor da FGV Social, disse para a reportagem da Folha de S Paulo que a PEC da Transição aliviou a situação dos mais pobres neste ano, mas não se repetirá em 2024. “O ano que vem será de muita incerteza fiscal”, afirma. 

Dados da FGV Social mostram que, no fim de 2022, após a série de medidas eleitoreiras do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a renda familiar per capita (contando todas as fontes) dos 40% mais pobres chegou a R$ 374 —voltando ao mesmo patamar (corrigido pela inflação) do melhor ponto da série, de R$ 375, em 2014.

Para a reportagem, Neri explicou que houve recuperação, mas é uma década perdida nessa comparação. Para o economista, um dos problemas agora é que Lula vem tentando também criar programas para a classe média, ou C, como os descontos para a compra de carros populares. “Se a prioridade fosse voltada apenas para os mais pobres, seria mais fácil [do ponto de vista orçamentário] acomodar as coisas”, afirma Neri.

Análise do resultado da eleição de 2022 sugere que a classe C foi crucial para a votação expressiva de Bolsonaro, que acabou perdendo para Lula por apenas 2,1 milhões de votos.

Com poucas exceções, estados onde a classe C é relativamente maior deram mais votos a Bolsonaro. Na contramão, onde a classe D/E predomina, Lula se saiu melhor —o que explicaria o desejo do petista de agradar agora o público da classe C.

Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S Paulo, O Globo e das agências de notícias

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