Micro e pequenas empresas também foram afetadas pelo imbróglio judicial envolvendo a rede Americanas, que entrou em processo de recuperação na Justiça do Rio de Janeiro após a divulgação de um rombo bilionário de quase R$ 50 bilhões. Grande parte da dívida da varejista é com bancos públicos e privados, além de grandes fornecedores. No entanto, estima-se que a companhia tenha um débito de R$ 875 milhões com pequenos fornecedores.
De acordo com reportagem do jornal O Estado de S.Paulo, são 6 mil micro, pequenas e médias empresas que eram fornecedoras de produtos ou serviços para a Americanas. O impacto sobre esses fornecedores é tão grande que alguns deles, com o caixa desfalcado devido ao não pagamento das dívidas pela varejista, já começam a reduzir produção, fazer cortes no quadro de funcionários e buscar financiamento bancário.
A reportagem do Estadão fez o cálculo da dívida aos pequenos fornecedores com base na lista de credores entregue à Justiça. Entre esses credores estão empresas de alimentos, indústrias, editoras de livros, prestadoras de serviços de TI e manutenção. Não foram considerados na conta passivos trabalhistas, bancos, grandes empresas, sindicatos e associações, fundos, aluguéis e empresas de luz e internet.
No âmbito das micro e pequenas empresas, cujo impacto da dívida no caixa é maior, a Americanas deve R$ 109,4 milhões, conforme os dados consultados pelo Estadão. Do total de credores nessa categoria, 20 têm mais de R$ 1 milhão a receber e 102 aguardam pagamentos entre R$ 100 mil e R$ 1 milhão.
O maior número de credores entre os pequenos (441) têm entre R$ 1 mil e R$ 50 mil a receber. Para outros 73 fornecedores, a Americanas deve entre R$ 50 mil e R$ 100 mil, e 315 arcam com dívidas de até R$ 1 mil.
Dos pequenos credores, a maior dívida é com a Ingram Micro Brasil, distribuidora americana de produtos e serviços de tecnologia da informação, cuja dívida é de R$ 26,4 milhões.
Entre os micro e pequenos credores da Americanas, está um fornecedor de material escolar, o qual, antes da pandemia, selecionou os melhores clientes para escapar do risco de inadimplência que aumentaria com a crise sanitária. Entrevistado pela reportagem, ele resumiu o sentimento sobre a dívida: “É como se alguém tivesse entrado na minha empresa, tirado 35% do meu caixa e saísse andando pela porta da frente. É mais ou menos desta forma como eu me sinto”. A dívida da Americanas com a empresa equivale a pouco mais de um terço do seu faturamento.
Em 10 de janeiro, após o fechamento do mercado, a Americanas veio a público comunicar a saída do CEO Sérgio Rial do cargo, a pedido dele, ocasião em que também informou ter encontrado “inconsistências contábeis” no valor de R$ 20 bilhões. Contudo, com o passar dos dias, foi revelado que o rombo, na verdade, é de R$ 47,9 bilhões, sendo a maior parte dos credores bancos públicos e privados.
Carnaval ajuda a salvar pequenos credores da rede Americanas. Justiça do Rio autoriza a empresa a captar R$ 2 bilhões
O movimento da rede Americanas era essencial para o caixa de muitos dos pequenos fornecedores. Muitos tinham a varejista como um importante carro-chefe de seus negócios. Entre elas está a Porto Fabricação de Bandeiras e Serviços Ltda., do Rio de Janeiro. Depois do rombo anunciado, a fabricante mudou a estratégia e foi salva pelo carnaval, “do contrário o impacto na empresa teria sido grande”, disse Gilberto Porto, dono do negócio, à reportagem do Estadão.
A dívida da Americanas com a Porto é de R$ 684 mil. O dono disse que isso fez com que a empresa se descapitalizasse “um pouco”. Mas a venda de bandeiras e estampas para escolas de samba conseguiu manter os 35 funcionários, pois as encomendas para esse segmento foram grandes.
A Porto tinha a expectativa de nova encomenda de uniformes pela Americanas, mas o pedido está travado. “A Americanas sempre pagou direitinho mas, a partir de agora, vai ser só com pagamento à vista”, disse o empresário. “Tenho certeza de que vou receber, nem que tenha de esperar um ano, a não ser que a Americanas quebre de vez. Mas eu acho isso muito difícil de acontecer.”
Na lista de credores, o grupo aparece com outro crédito de R$ 1,38 milhão, mas o empresário disse já ter recebido esse valor antes da Recuperação Judicial.
O presidente da SBVC (Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo, Eduardo Terra, disse que a dívida da Americanas “provoca estragos junto aos pequenos num cenário no qual está muito difícil captar dinheiro no mercado, e não serão todos que vão conseguir sobreviver”.
Ele acredita que a situação da varejista impacta negativamente toda a cadeia de produção de fornecedores que dependem do funcionamento da companhia nas próximas semanas e nos próximos meses.
Na quinta-feira passada (9), a Justiça do Rio autorizou o financiamento de até R$ 2 bilhões para a Americanas. O financiamento será estruturado na forma de emissão de debêntures, com disponibilização de 2 mil debêntures de valor nominal unitário de R$ 1 milhão cada, totalizando R$ 2 bilhões. Desse total, R$ 1 bilhão é proveniente dos acionistas de referência, que são o trio de bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira, para garantir capital de giro à varejista.
De acordo com a decisão, serão oferecidas aos credores da companhia, “contemplando a possibilidade de apresentação de propostas mais vantajosas a serem consideradas pela administração da empresa, e sob a supervisão da Administração Judicial e do Juízo.”
O ingresso de recursos se daria em dois momentos. Primeiramente o montante de R$ 1 bilhão para desembolso emergencial e imediato, subscritos por “acionista de referência”, caso não haja outros credores das Recuperandas interessados na participação no Financiamento DIP.
Por essa razão, o presidente da SBVC acredita que “a operação da Americanas não vai parar” e que muitos pequenos fornecedores podem também aproveitar para vender para outros varejistas que ocuparam parcela de mercado deixada pela Americanas.
Redação ICL Economia
Com informações de O Estado de S.Paulo