O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), em entrevista coletiva nesta segunda-feira (30), não quis confirmar se o governo revisará junto ao Congresso Nacional a meta de déficit zero para 2024, se limitando a afirmar que “minha meta está estabelecida”. Na sexta-feira (27), o presidente Lula (PT) disse a jornalistas que dificilmente o governo conseguiria cumprir a meta de déficit zero no próximo ano.
Haddad afirmou que já apresentou soluções ao presidente e que, a pedido dele, também as apresentará a líderes partidários no Congresso Nacional. “Eu soube hoje, na reunião que tive com o presidente, ele pediu para o ministro Padilha convocar os líderes para que a mesma apresentação que eu fiz a ele seja feita aos líderes em relação a esses tópicos. E os mesmos cenários que apresentei a ele vou apresentar aos líderes no que diz respeito a medidas que seriam tomadas em 2024 e que talvez tenham que ser antecipadas. Vou anunciar as medidas quando forem validadas pelo presidente”. “A minha meta está estabelecida. Vou buscar o equilíbrio fiscal de todas as formas justas e necessárias para que tenhamos um país melhor, um descaso de dez anos que ninguém se importou mas nós nos importamos”, concluiu.
“O que eu levei ao presidente foram os cenários possíveis. E se eu tiver que antecipar medidas que ia tomar em 2024, e a Casa Civil, e o presidente, e a coordenação de governo concordarem, eu encaminho. O meu papel é buscar o equilíbrio fiscal. Eu farei isso enquanto eu estiver no cargo. Ponto. Não é por pressão do mercado financeiro, não é porque eu sou ortodoxo. É porque eu acredito que o Brasil, depois de dez anos, precisa voltar a olhar para as contas públicas. Tem amigo meu que me critica, ‘o Haddad está virando…’. Não, eu não estou fazendo uma coisa que eu não acredito. Aliás, eu não tenho esse perfil. Eu estou fazendo o que eu acredito, e estou dizendo: escolhi, inclusive, o caminho mais difícil para fazer, que é a correção das injustiças do sistema tributário. Era mais fácil fazer o que faziam no passado: inventa um imposto ou aumenta a alíquota. Não é o que nós estamos falando, não é o que estamos fazendo. Estamos repondo aquilo que foi perdido”, disse o ministro mais cedo.
‘Ralos tributários’ impedem crescimento da receita e podem dificultar déficit zero
Haddad ainda explicou que “ralos tributários”, impedem que a receita do país cresça na mesma proporção do crescimento do PIB e na velocidade com que a equipe econômica da administração Lula previa. “Tenho dito desde julho que a arrecadação vem sofrendo por uma série de fatores. Obviamente que a taxa de juros é uma coisa importante, as empresas estão lucrando menos em função das taxas de juro, e isso impacta o Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre Lucro Líquido. Mesmo quando o faturamento se mantém, e vocês sabem que o PIB está crescendo acima das projeções de mercado, mas você tem um efeito sobre a rentabilidade das empresas, isso está afetando a arrecadação desses dois tributos importantes, um dos quais diretamente relacionados ao FPM e ao FPE, razão pela qual os prefeitos e governadores bateram à porta do Ministério da Fazenda buscando reposição dos repasses, o que foi garantido pelo presidente na semana passada com a sanção da lei complementar que garantia um aporte adicional de repasse, para que não houvesse descontinuidade de serviços públicos essenciais, notadamente na área da saúde”.
Os chamados “ralos tributários” citados por Haddad são consequência, segundo ele, de decisões tomadas pelo Congresso Nacional e pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2017. “Em relação ao Congresso, a Lei Complementar 160 tem um dispositivo que alterou uma outra lei e que abriu uma brecha enorme para as tais subvenções. Só para vocês terem uma ideia do tamanho do problema: a Medida Provisória 1185 corrige essas distorções. Portanto, tudo dando certo, 2023 vai ser o último ano dessa enorme brecha que permite as empresas a abaterem da base de cálculo incentivos fiscais dados pelo estados e para além de incentivos fiscais dados pela União. Não obstante isso, o abatimento da base de cálculo da Contribuição Social sobre Lucro Líquido e Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, que no ano passado foi de R$ 149 bilhões, a estimativa para este ano, deste dispositivo, é de R$ 200 bilhões. Isso é uma das razões pelas quais a arrecadação do governo federal vem sofrendo um enorme prejuízo, a partir de uma emenda parlamentar que foi aprovada, foi objeto de veto presidencial em 2017 e que foi derrubado esse veto pelo Congresso, dando ensejo a essa espiral que, de 2017 para cá, saltou de R$ 39 bilhões para R$ 200 bilhões projetados para 2023. Então nós levamos ao conhecimento do presidente este problema. Ele tem que ser informado do que está acontecendo, do porquê o PIB cresce e a arrecadação não cresce na mesma proporção”.
“A segunda questão diz respeito à decisão do STF, também de 2017, por 6 a 5, que retirou da base de cálculo do PIS/Cofins o ICMS recolhido pelas empresas. Vou dar um dado que tomei conhecimento semana passada e levei ao conhecimento do presidente antes da sua declaração de sexta-feira: uma empresa de cigarro se credenciou a um crédito de PIS/Cofins R$ de 4,8 bilhões. Agora vejam do que eu estou falando, de uma empresa que vende cigarro. O consumidor pagou o PIS/Cofins que estava no preço do cigarro, ele pagou, a empresa recolheu o PIS/Cofins para a Receita Federal e a Justiça está mandando devolver esse tributo não para o consumidor, mas para a empresa, que não pagou pelo tributo. Recolheu em nome do verdadeiro contribuinte, que é quem comprou o produto. Estamos falando de muitas dezenas de bilhões de reais que estão sendo abatidos da base de cálculo do ICMS e estão, não só no corrente, como fazendo a conta de todo o recolhimento feito de 2017 para cá”, explicou.
Do Brasil 247