É difícil de acreditar, mas, passadas mais de cem horas do temporal que atingiu a cidade mais rica do país na última sexta-feira (3), parte da população e do comércio de São Paulo ainda permanece no escuro. Diante do jogo de empurra da Enel, empresa de energia elétrica, e os governos municipal e estadual, coube ao Ministério Público de São Paulo propor que a companhia indenize os donos dos 2,1 milhões de imóveis atendidos pela concessionária no estado e que ficaram sem luz após o temporal daquele dia.
Desse modo, a promotoria quer evitar uma enxurrada de processos contra a empresa devido ao apagão, segundo o promotor Denilson de Souza Freitas, durante entrevista coletiva ontem (7).
Ontem à noite, a Enel informou que havia 107 mil endereços sem fornecimento de energia há mais de 24 horas.
O promotor disse, segundo a Folha de S.Paulo, que a proposta foi apresentada ainda ontem à empresa, que não havia respondido. A Enel tem 15 dias para se manifestar.
“Precisamos de um mecanismo que reduza os impactos durante efeitos adversos”, afirmou o promotor, que não detalhou o valor total de indenização. Contudo, ele defendeu que o pagamento varie de acordo com o tempo que cada imóvel ficou sem energia.
“Nós temos algumas investigações em relação à Enel. Eles apresentaram dificuldades no atendimento às pessoas e nós fizemos uma proposta de melhoria. A concessionária precisa prestar um serviço que atenda a esta demanda e pensar em outras situações que podem ocorrer, uma vez que nos próximos meses a tendência é de que as chuvas tendem a aumentar”, frisou o promotor.
Em entrevista à Folha ontem, o presidente da Enel no Brasil, Nicola Cotugno, afirmou que o caos na cidade não é motivo para a empresa se desculpar. “Não é para nos desculparmos, não. O vento foi absurdo”, afirmou ele, que disse que a resposta à emergência foi dificultada pela enorme quantidade de árvores que caiu, forçando a empresa a trocar postes e reconstituir quilômetros de rede.
MP instaura inquérito civil para investigar a atuação da Enel durante o blecaute após o temporal de sexta
Em outro frente, o Ministério Público instaurou um inquérito civil para investigar a atuação da Enel durante o apagão. O inquérito deve apurar os danos aos cofres públicos estaduais e municipais causados pelas fortes chuvas.
O promotor Silvio Marques já conduz um inquérito de 2019 sobre o enterramento de fios na capital. A mudança para a fiação subterrânea é uma das medidas para mitigar o problema causado por temporais e rajadas de ventos. Para Marques, isso só será possível se a população pagar pela medida.
“Não adianta tentar encontrar solução mágica porque não vai acontecer. O contrato [de concessão] com a Enel não previa isso [o enterramento dos fios]”, afirmou ele. “Vai ter que pagar quem quiser. Quem quiser, paga. Quem não quiser, não paga. Infelizmente, é isso.”
Na segunda-feira (6), o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, sugeriu a criação de uma taxa para que a população pague pelo enterramento da fiação de energia elétrica. Diante da reação negativa, ele voltou atrás.
A Enel é uma empresa de economia mista controlada pelo Estado italiano (detém 23,6% dela). No Brasil, ela comprou a estatal Eletropaulo em 2018 e, desde então, o serviço de distribuição de energia é alvo de diversas reclamações em sua área de cobertura.
Boa parte dos problemas é atribuída à falta de manutenção nas redes, uma vez que a empresa demitiu grande número de funcionários desde a privatização. Em contrapartida, em 2022, a Enel São Paulo teve lucro de R$ 1,4 bilhão.
Ou seja, a Enel é uma demonstração clara de que privatizar serviços essenciais à população, como quer fazer o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) com a Sabesp, concessionária de saneamento, é prejuízo certo a quem depende desses serviços.
Moradores protestam devido à falta de energia
A falta de energia provocou uma série de protestos ontem na capital paulista e na Grande São Paulo. Na manhã desta quarta-feira (8), moradores de Sapopemba, na zona leste de São Paulo, faziam um protesto pela volta da energia na avenida Custódio de Sá e Faria, segundo a Polícia Militar.
Outro protesto ocorreu ontem à noite Vila Leopoldina, na zona oeste. Moradores de um condomínio da rua Carlos Weber, que estava há mais de quatro dias sem luz, fecharam uma parte da via com galhos de árvores e gritaram palavras de ordem por volta das 19h. A falta de energia também afetou estabelecimentos comerciais nas ruas Brentano e Nanuque por mais de 96 horas, de acordo com moradores.
Na região do Morumbi, entre as zonas oeste e sul de São Paulo, um policial militar ficou ferido durante a manifestação na avenida Giovanni Gronchi. Em Cotia, moradores chegaram a fechar uma pista da rodovia Raposo Tavares. Um policial militar foi ferido com um tiro.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e da Folha de S.Paulo