Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *
A meta fiscal voltou a ser assunto semana passada depois de falas do presidente Lula e do Ministro
Fernando Haddad sobre o tema. A discussão começou com Lula falando que não era nenhum problema
o Brasil não atingir a meta de zerar o déficit primário no próximo ano, porém, Haddad voltou a se
comprometer com a meta, falando da importância em manter um ambiente fiscal saudável e que, para
isso, seria importante manter a previsão de zerar o déficit no próximo ano.
Com isso, os grandes analistas econômicos de mercado voltaram ao seu assunto preferido, o chamado
risco fiscal, que é uma palavra bonita, que assusta os mais leigos, mas que não tem muito significado e
não é muito relevante para a situação brasileira como um todo. esmo assim, o assunto pautou todo o noticiário econômico. Então, essa coluna vai dar alguns pitacos sobre esse tema a partir de agora.
Primeira coisa é que o compromisso fiscal demasiado que Haddad possui é um tanto quanto
exagerado. É uma visão mais ligada ao liberalismo e à ortodoxia econômica do que a uma visão mais
progressista da economia. É a lógica de que é preciso primeiro formar poupança interna para depois
realizar os gastos necessários. É a velha comparação do orçamento público com o orçamento de uma
casa. Mas essa visão é completamente equivocada, pois a única forma de conseguir fazer poupança é
gastando antes, que vai gerar renda e que, somente depois, vai acabar gerando poupança.
Então, temos um ministro da Fazenda que é mais conservador na economia do que o presidente Lula. E isso obviamente causa impasses. E, na realidade, esse problema do déficit zero foi algo que o próprio
Haddad criou, e agora ele precisa cumprir isso mesmo com todas as dificuldades que se apresentam no
momento. Aliás, neste mesmo espaço, em vários artigos passados, tratamos das novas regras fiscais e
dos problemas que eles poderiam gerar, e esse foi um dos que foram ventilados aqui. E o problema veio.
Não que seja um problema de fato, mas, dentro das regras estabelecidas, ele precisa ser resolvido pois
o governo pode ser penalizado em caso de não cumprimento.
Na nova regra fiscal proposta por Haddad, existem cláusulas de redução do aumento do orçamento
para o próximo ano caso a meta de superávit ou de déficit não seja cumprida. E esse mecanismo
obviamente tornaria a questão fiscal um tanto quanto sufocante para a economia brasileira. O governo
precisa buscar novas fontes de arrecadação ou será obrigado a cortar gastos numa economia que
precisa de altos investimentos para o seu desenvolvimento. E o que está ocorrendo é que as
perspectivas de arrecadação de novas fontes estão decepcionando, com resultados abaixo do esperado pelo governo.
Então, resta somente o corte de gastos, e isso significa reduzir o dinheiro para saúde, educação,
investimento e outros gastos necessários para um bom funcionamento do governo. E isso pode causar
uma desaceleração econômica não desejada. Mas é a única alternativa dentro da regra estabelecida.
Logo, vemos que a nova meta fiscal começa a apresentar problemas para o próprio governo, um
problema que ele mesmo criou.
Agora temos que ver como o ministério da Fazenda vai fazer para resolver uma situação na qual
ele mesmo se colocou. Ele deu muita importância para a questão fiscal e agora o mercado exige dele o
cumprimento da meta. Mas o resultado disso pode ser uma desaceleração econômica em um ano
eleitoral. É uma situação que não é fácil de ser resolvida, mas novamente, foi um problema que o
próprio governo criou para si mesmo.
*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais
*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorando pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira