O déficit da previdência dos funcionários aposentados do setor público chegou a R$ 6 trilhões, e tem sido apontado como o principal responsável pela queda do investimento público. Isso porque os governos federal, estaduais e municipais têm de destinar recursos para o pagamento das remunerações dos servidores aposentados, o que deixa o caixa mais magro para outros investimentos.
Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, o valor equivale a 93% da dívida pública líquida, atualmente em R$ 6,4 trilhões. A conta inclui o total de aposentados, inclusive civis, militares e do Judiciário, que geralmente recebem valores maiores.
Os cálculos mostrados pela reportagem foram feitos pelo especialista em contas públicas Raul Velloso. As contas dele apontam que, em pouco mais de 30 anos, só a despesa previdenciária da União saltou de 19,2% do total do gasto para 51,8%. Por outro lado, o montante de recursos que o governo federal tinha para usar livremente (gasto discricionário) caiu de 33,7% do total que gastava para 3,1%.
Desde 2006, o gasto previdenciário com os servidores apresentou taxa média de crescimento real (acima da inflação) de 12,5% ao ano nos municípios, 5,9% nos estados e 3,1% na União, segundo cálculos de Velloso.
Ainda segundo a reportagem, nessa equação que não fecha, os investimentos públicos foram os que mais sofreram com a falta de recursos, que caíram de 16% para 2,2%. No período, houve aumento também em despesas com saúde, educação e assistência social — comprimindo ainda mais os investimentos.
Na avaliação de Velloso, é fundamental que as administrações reformem seus regimes de previdência. Contudo, ele salientou que isso, por si só, não soluciona o problema, pois há milhares de servidores chegando à idade da aposentadoria, o que deve continuar pressionado o déficit.
Ele defende, por exemplo, a criação de fundos para capitalizar alguns ativos (como imóveis e royalties de petróleo e minério) para o pagamento das aposentadorias, como aconteceu no estado do Piauí, que adequou o sistema previdenciário às regras da reforma de 2019 e criou um fundo de capitalização.
Déficit da previdência do serviço público também se evidencia na queda do crescimento do PIB
De acordo com a reportagem da Folha, além dos impactos no investimento público, o aumento da despesa com inativos evidencia-se na queda do crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) nas últimas décadas.
Esse movimento ocorre porque, quando o setor público investe menos, o segmento privado, como consequência, também se retrai.
Entre 1980 e 2022, a taxa de investimento público em infraestrutura despencou de 5,1% para 0,6% do PIB.
Isso porque estados e municípios, diferentemente da dívida pública, que é “rolada” pela emissão de títulos do Tesouro, têm de promover cortes em outras despesas, como investimentos, em vez de deixar de pagar os salários, como aconteceu em 2017, no Rio de Janeiro, quando o ex-governador Luiz Fernando Pezão enfrentou protestos de centenas de servidores da ativa e aposentados por atrasos em seus salários.
Na aprovação da reforma da Previdência, em 2019, estados e municípios ficaram de fora das novas regras que dificultaram as aposentadorias. Por outro lado, eles ficaram liberados para aprovar, separadamente, em câmaras e assembleias locais, a adoção dos novos mecanismos de controle desses gastos.
Dados do governo federal mostram que, dos 2.146 municípios e estados que dispõem de regimes próprios de Previdência para seus servidores, somente 732 (34,1% do total) adotaram ao menos 80% das regras para os benefícios fixados na reforma da Previdência.
Entre os dois terços que não o fizeram, estão, por exemplo, o Distrito Federal, Pernambuco, Amazonas, Maranhão, Rio de Janeiro (capital), Belo Horizonte e Florianópolis. Nas cidades do interior, de 2.093 com regimes próprios, só 701 realizaram reformas amplas.
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo