O pacote eleitoreiro do presidente Jair Bolsonaro, que inclui “bondades” previstas na Proposta de Emenda Constitucional – PEC dos Auxílios, já aprovada pelo Senado e que esta semana deve ser votada na Câmara dos Deputados, deixa os beneficiários do Auxílio Brasil sem saber o que acontecerá a partir de 1º de janeiro de 2023, uma vez que as medidas só têm validade até 31 de dezembro deste ano.
Esse fato apenas reforça o caráter eleitoreiro da PEC, que tem o claro objetivo de turbinar benefícios sociais às vésperas das eleições, apoiada em dribles nas leis eleitorais e fiscais. Entre outros benefícios, a PEC estabelece a elevação temporária dos repasses do programa Auxílio Brasil para R$ 600.
A necessidade de auxiliar os mais vulneráveis, neste momento de crise com alta inflação e disparada de preços, não está sendo questionada, mas sim a forma como está sendo decretada por um duvidoso “estado de emergência”, pela alteração de regras impostas pela Constituição e a exígua duração dos benefícios.
Ouvido pela reportagem da Folha de S. Paulo, o economista Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas Sociais da FGV (Fundação Getulio Vargas), afirma que o governo está “dobrando a aposta” em uma política que não está bem desenhada, justamente por tratar de forma igual cidadãos com diferentes graus de pobreza. Ele se refere, mais especificamente, à elevação temporária dos repasses do programa Auxílio Brasil ao valor mínimo de R$ 600: “o valor de R$ 600 é bom de divulgação, mas não de desenho.”
O economista chama a atenção para o fato de que, mesmo com recorde de recursos para programas sociais, as famílias seguem vivendo no que ele chama de “montanha-russa da pobreza”. “Não estamos usando como bússola o conceito de pobreza. Estamos gastando duas vezes mais, mas com eficiência menor”, diz.
Aumento do Auxílio Brasil não repõe nem a inflação no caso de famílias maiores
A fixação de um piso por família contribui para ampliar desigualdades e corroer a solidez do Cadastro Único, base de dados criada em 2001 e que virou referência para identificar quem são e onde estão os brasileiros em situação de pobreza e extrema pobreza.
Enquanto as pessoas que moram só viram seus benefícios saltarem de R$ 89 para R$ 400, com a entrada em vigor dos reajustes do Auxílio Brasil, em janeiro, famílias com mais integrantes tiveram apenas uma pequena recomposição e que nem compensou a inflação: o valor foi de R$ 535 (em 2019) para R$ 558 (agora).
Se atualizasse a inflação entre janeiro de 2019 e maio de 2022, o valor que uma família composta por seis pessoas, por exemplo, deveria receber com o Auxílio Brasil iria para R$ 673 —quase R$ 100 a mais do que o montante atual.
Agora, com o aumento anunciado pela PEC dos Auxílios, o reajuste previsto de R$ 42 nem vai recompor a inflação de três anos atrás.
Neste sentido, a socióloga Leticia Bartholo, que já foi secretária nacional adjunta de Renda da Cidadania, também afirma que a reversão do estrago causado pela PEC dos Auxílios será um grande desafio para o próximo governo. Segundo Bartholo, a tendência de desmembramento de famílias é reforçada com o adicional de R$ 200 até o fim do ano, uma vez que a mensagem de um mínimo por família, independentemente do número de integrantes, se mantém.
A socióloga ressalta também que a próxima gestão deverá ter como prioridade a retomada do pagamento de um valor mínimo por pessoa, como era feito no Bolsa Família, marca social das gestões petistas. “Pode calibrar valores mais altos para a primeira infância, mas a partir de um desenho que gere mais equidade”, diz.
Embora o adicional seja temporário, os próprios técnicos do atual governo admitem que será difícil, para qualquer que seja o presidente a partir de 2023, reduzir o montante total do programa. Em termos anuais, a parcela extra significa uma despesa de mais R$ 62 bilhões.
Jamilton Fernandes Santos é coordenador estadual do Cadastro Único e do Auxílio Brasil na Bahia, estado com maior número de beneficiários no país (2,2 milhões de beneficiários). Ele conta que o ministério lançou o Auxílio Brasil sem ouvir os coordenadores locais.
“O governo federal desconsiderou os 18 anos do programa Bolsa Família. Não houve a apresentação de um único estudo, pelo menos para nós, coordenadores e coordenadoras estaduais, sobre a viabilidade do Auxílio Brasil e suas bases conceituais e que justificasse a mudança”, afirma.
PEC dos auxílios dá carta branca a Bolsonaro
O texto da PEC dá carta branca ao presidente Bolsonaro para furar o teto de gastos, ignorar as restrições da Lei Eleitoral e usar R$ 41,25 bilhões para turbinar programas sociais a três meses das eleições.
Sobre a PEC, o colunista do UOL, Leonardo Sakamoto, resumiu seus objetivos, ao afirmar de forma categórica, em um artigo; “é republicano lembrar que a proposta não nasce para garantir o fim do desespero de famílias, isso pode ser consequência, não motivo. Ela tem como objetivo tentar reduzir o desespero eleitoral do bolsonarismo”.
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S. Paulo, UOL e das agências