Estudo do Banco Mundial aponta que 40% do talento das crianças brasileiras é desperdiçado. Conforme o Índice de Capital Humano do Brasil (ICH), que consta no Relatório de Capital Humano Brasileiro, uma criança nascida no Brasil em 2019 deve alcançar, em média, apenas 60% do seu capital humano potencial quando completar 18 anos. O número deve cair ainda para perto de 50% com os efeitos da pandemia de Covid-19, com o Brasil voltando ao patamar que tinha em 2009.
O relatório do Banco Mundial, divulgado na semana passada, constata que o Brasil está voltando ao nível de 2009 em relação às crianças. “Em dois anos, a pandemia de Covid-19 reverteu o equivalente a uma década de avanços do ICH no Brasil”, observa a instituição. Em termos gerais, isso significa que 40% de todo o talento brasileiro de criança é deixado de lado, na média nacional.
Os investimentos em capital humano – o conhecimento, as habilidades e a saúde que as pessoas acumulam ao longo de suas vidas – são fundamentais para desbloquear o potencial de uma criança e para incrementar o crescimento econômico em todos os países. Por exemplo, as habilidades acumuladas determinam o nível de renda e as oportunidades de trabalho que uma pessoa vai ter em sua vida, o que gera impacto na capacidade de gerar riqueza de um país.
O estudo estima que o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil poderia ser 2,5 vezes maior (158%), se as crianças brasileiras desenvolvessem suas habilidades ao máximo e o país chegasse ao pleno emprego.
Na comparação com outros países em desenvolvimento na América Latina, o Brasil está abaixo, por exemplo, do Chile (índice de 0,65) e do México (0,61). Em países desenvolvidos como Japão e EUA, os índices de capital humano são bem maiores, 0,81 e 0,70, respectivamente, e, para alcançá-los, o Brasil precisaria de um prazo de 60 anos, segundo estimativa da entidade.
Banco mundial: talento das crianças e as desigualdades no país
O Banco Mundial alerta no documento para a desigualdades dentro do país. Em 2019, o indicadores do Norte e do Nordeste eram de 56,2% e 57,3%, respectivamente, enquanto os do Sul, Centro-Oeste e Sudeste variavam de 61,6% a 62,2%.
Ildo Lautharte, economista do Banco Mundial, ressalta que “60% a 70% dessa desigualdade regional é explicada pela educação, o que inclui tanto os anos que a criança fica na escola como a qualidade da educação, isto é, se ela consegue aprender aquilo que deveria ter aprendido na escola”.
Os dados revelam, ainda, a desigualdade racial no desenvolvimento do potencial dos brasileiros. Segundo o estudo, a produtividade esperada de uma criança branca, em 2019, era de 63% do seu potencial, comparado a 56% para uma criança negra e 52% para uma indígena.
A desigualdade racial está aumentando ao longo do tempo. O ICH das crianças brancas avançou 14,6% entre 2007 e 2019, enquanto o de crianças negras variou 10,2% e o das indígenas ficou praticamente estável (0,97%).
Para Lautharte, a explicação está nas desigualdades educacionais. Ele observa que essa diferença nos resultados de aprendizagem está ligada tanto à qualidade do ensino quanto às condições das crianças, que partem de bases muito desiguais.
Sobre a influência no mercado de trabalho, o Banco Mundial utiliza o ICHU (Índice de Capital Humano Utilizado), que pondera o ICH com a taxa de emprego nos mercados de trabalho formal e informal.
No Brasil, o ICHU é de 39%, o que significa que o mercado de trabalho brasileiro desperdiça boa parte dos seus talentos devido à baixa ocupação. Segundo o pesquisador, o Brasil não absorve seus talentos. “Quando se considera participação no mercado, o indicador de capital humano sai de 60% e chega a 32%, e isso considerando o mercado não só formal, mas informal também. A mensagem vai em linha com o argumento de que os países desenvolvidos têm sucesso não só em promover talentos dos indivíduos e fazê-los florescer em diversos contextos, mas também em conseguir alocar bem esses talentos”, disse.
Chama a atenção ainda o recorte do estudo entre homens e mulheres. Pelo ICHU, as mulheres chegam aos 18 anos com potencial acima dos homens. Elas tinham um Índice de Capital Humano de 60% em 2019, contra 53% para eles.
Apesar disso, elas são menos aproveitadas no mercado de trabalho. Enquanto o ICHU delas é de 32%, o deles é de 40%. Isso se deve a fatores que vão desde profissões que ainda hoje são entendidas como predominantemente masculinas, até a desigualdade no trabalho doméstico e no cuidado dos filhos.
A explicação para a diferença das mulheres chegarem aos 18 anos com um índice melhor é que, por exemplo, elas tendem a abandonar menos a escola para trabalhar e, por isso, acumulam, em média, mais tempo de estudo do que os homens.
Além disso, elas vivem mais, tanto por questões de saúde, como da maior propensão dos homens (particularmente dos negros) de morrerem de causas violentas.
Para entender:
O ICH (Índice de Capital Humano) é um indicador que combina dados de educação e saúde para estimar a produtividade da próxima geração de trabalhadores, se as condições atuais não mudarem. Os dados que compõem o ICH são: taxas de mortalidade e déficit de crescimento infantil; anos esperados de escolaridade e resultados de aprendizagem; e taxa de sobrevivência dos adultos. Com base nesse conjunto de dados, o indicador varia de 0 a 1, sendo 1 o potencial pleno — ou seja, não ter déficit de crescimento ou morrer antes dos 5 anos, receber educação de qualidade e se tornar um adulto saudável.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias