Levantamento inédito, elaborado pelo observatório “De olho nos ruralistas”, mostra a participação direta de multinacionais no lobby ruralista no governo Bolsonaro. De acordo com o relatório, além de grandes companhias atuarem em associações que financiam o Instituto Pensar Agro (IPA), empresas mantiveram 278 reuniões com o alto escalão do governo Bolsonaro para discutir assuntos como a flexibilização de regras para agrotóxicos, a autorização de testes de novas substâncias químicas direto em campo (ao invés de laboratórios) e a autofiscalização sanitária.
Chamado de “Os Financiadores da Boiada: como as multinacionais do agronegócio sustentam a bancada ruralista e patrocinam o desmonte socioambiental“, o relatório apresenta um ranking das empresas no lobby ruralista, que mais se reuniram com o governo. São elas: a Syngenta, como campeã na interlocução com o governo, com 81 reuniões; seguida por JBS, com 75; Bayer, 60; Basf, 26; Nestlé, 23; e Cargill, 13.
Instituto Pensar Agro (IPA), mantido por grandes multinacionais, seria face institucional do lobby ruralista
O Coordenador de projetos e pesquisador do “De olho nos ruralistas”, Bruno Bassi, durante entrevista ao programa ICL Notícias, do dia 1 de agosto, explicou que o levantamento sobre lobby ruralista é um ponto de partida. “A gente identificou apenas as reuniões com o Ministério da Agricultura. Mas essas multinacionais têm um acesso livre ao gabinete e a outros ministérios. Então, esses números têm como base reuniões agendadas”, afirma Bassi. O ranking está baseado somente nas visitas ao Ministério da Agricultura.
Além da pasta de Agricultura, as empresas de lobby ruralista foram recebidas nos ministérios da Economia (33), do Meio Ambiente (4), da Justiça e Segurança Pública (1) e da Educação (1), segundo pesquisa do “De olho nos ruralistas”.
O IPA e a Frente Parlamentar da Agricultura (FPA) passaram a ter presença maior no governo federal desde a posse de Bolsonaro. Além das reuniões com empresas, o dossiê “Os Financiadores da Boiada” mostra que lobistas e líderes ruralistas se reuniram 160 vezes com servidores do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Destas, 20 contaram com a presença da então ministra Tereza Cristina, ex-presidente da FPA.
O levantamento de reuniões sobre lobby ruralista levou em consideração os encontros registrados na agenda oficial de autoridades do Ministério da Agricultura entre janeiro de 2019 e junho de 2022. No entanto, os registros de entrada no Mapa, obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI), contam outra história.
Durante esse período, a ex-chefe de Assuntos Públicos da Bayer, por exemplo, esteve presencialmente 25 vezes na sede do ministério. Destas, 16 não foram registradas em agenda oficial. Na Câmara a executiva esteve 14 vezes, entre 2018 e 2019, segundo
Algumas das multinacionais que integram associações mantenedoras do IPA são gigantes, como as produtoras de agrotóxicos e sementes transgênicas Bayer, Basf e Syngenta, as processadoras de soja Cargill, Bunge, ADM e Louis Dreyfus; os frigoríficos JBS e Marfrig e indústrias do setor alimentício como Nestlé e Danone. O IPA Instituto inclui 48 associações setoriais, de diferentes setores, cerveja, laticínios, soja, algodão, laranja, entre outros.
“O IPA coordena o financiamento e a articulação do setor privado com o governo. É a face institucional da bancada ruralista, como se tornou conhecida nos últimos anos. É a mais poderosa do Congresso Nacional. O instituto congrega interesses, pautas, transforma em relatórios para medidas que estão passando na Câmara e no Senado”, afirma Bruno Bassi. “A bancada do campo quer a liberação do agrotóxico na lavoura. É isso que nós precisamos fiscalizar. A bancada dos ruralistas trabalha como despachantes a serviço dos interesses dessas grandes companhias”, completa.
O economistas Eduardo Moreira, fundador do ICL, explica que o último censo mostra a concentração de terra cultivável no Brasil. Apenas 0,04% por cento das propriedades no Brasil tem, mais ou menos, 15% das terras cultiváveis. “A gente está falando, provavelmente, de menos de 2 mil indivíduos que têm quase 300 representantes, mais da metade na Câmara dos Deputados, representando o interesse dessas multinacionais. Enquanto a população do País – 210 milhões de brasileiros –, não é representada Congresso Nacional”, diz Moreira.
Redação ICL Economia
Com informações da entrevista veiculada no ICL Notícias