Em agosto passado, o presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, vetou o reajuste no repasse de verbas para merenda escolar, que havia sido aprovado pelo Congresso e incluído no LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2023. Há cinco anos sem aumento, a verba está deixando muitas crianças sem refeição em quantidade adequada e/ou com carência nutricional nas escolas públicas do país, colocando em risco o desenvolvimento saudável dos pequenos. Importante pontuar ainda que muitas crianças brasileiras só conseguem comer quando vão à escola. Portanto, a merenda escolar, em um país tão desigual como o Brasil, é fundamental para garantir-lhes um mínimo de dignidade humana.
De acordo com reportagem publicada no jornal O Estado de S.Paulo, há escolas brasileiras onde as crianças estão dividindo um ovo em quatro. Em outras, o bracinho delas é carimbado para que não voltem à fila para repetir o prato. Quem não se comove com cenas como essa deveria conversar com o próprio coração.
Recentemente, foi divulgada a segunda etapa do Vigisan (Inquérito Nacional sobre Segurança Alimentar no Contexto da Pandemia Covid-19 no Brasil), mostrando que os lares onde a fome atormenta mais no país são aqueles com crianças menores de 10 anos. Ou seja, as crianças estão entre as principais vítimas da fome no Brasil, onde 33 milhões de pessoas estão em insegurança alimentar grave ou moderada.
Desde 2017, a verba federal para as merendas está sem reajuste. Com o peso da inflação dos alimentos, fica impossível para muitas famílias comprarem comida. Após o veto de Bolsonaro no reajuste da verba da merenda, o governo federal repassa apenas R$ 0,36 para a compra de alimento de cada estudante do ensino fundamental e do médio, e somente R$ 0,53 por aluno matriculado na pré-escola. Desse modo, não há Auxílio Brasil que seja suficiente para minorar os impactos do quanto o custo de vida ficou caro para os brasileiros em situação de vulnerabilidade social.
Conforme a reportagem do Estadão, muitas das crianças alunas das escolas públicas têm pais fora do mercado de trabalho. Portanto, a merenda é uma chance de ter uma refeição completa e equilibrada nutricionalmente para muitas delas.
A responsabilidade de custeio da merenda é da União, estados e municípios, mas a participação federal é importante, principalmente em cidades pobres. Gestores locais dizem que a defasagem do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) tem feito muitos municípios gastarem mais. A inflação da cesta básica, que inclui feijão e verduras, teve alta de 26,75% de maio de 2021 a maio deste ano.
Problema da merenda escolar é detectado em várias cidades brasileiras. Em alguns municípios, situação foi parar na Justiça
Segundo a reportagem do Estadão, em Belo Horizonte, famílias de alunos da Escola Municipal de Educação Infantil (Emei) Ipiranga denunciaram nas redes sociais a pouca quantidade de comida. As fotos mostram a refeição com a quarta parte de um ovo, uma colher de arroz, pequena porção de verduras e um pouco de molho de carne.
Um pai, que é policial, relatou que, antes, o filho dele de 2 anos chegava em casa e não pedia comida. “Quando passou a pedir, achei um pouco estranho”. “Depois que vi as imagens (de pratos quase vazios), entendi que não só ele, mas todas as crianças estavam recebendo menos alimentação do que a quantidade ideal.”
Procurada pela reportagem, a prefeitura local negou redução de alimentos na rede e diz que investigará o caso. Em nota, afirma que, desde 2018, elevou em 260% o gasto próprio com merenda (R$ 32 milhões), “considerando que o repasse previsto do governo federal no âmbito do Pnae não sofre reajuste desde 2017, mesmo com a alta dos preços dos alimentos e do custo da logística”.
No Centro Educacional 3 de Planaltina, no Distrito Federal, circularam nas redes sociais imagens de crianças com marca de carimbo na mão para não repetirem a merenda, em prejuízo de outros alunos.
Já em Cascavel (PR), pais também reclamam da falta de itens básicos na merenda, como arroz. A prefeitura disse à reportagem ter notificado a empresa vencedora da licitação para corrigir eventuais faltas e destacou ter comprado R$ 33 milhões em alimentos.
Em Melgaço (PA), relatório do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, de agosto, aponta que a merenda, de baixa qualidade, não é oferecida todo o mês. Quando falta, diz o documento, muitos alunos “ficam com fome e têm seu rendimento prejudicado”.
Entrevistada pela reportagem, Gabriele Carvalho, do Observatório da Alimentação Escolar, disse que a merenda “deve ser responsabilidade compartilhada entre União, Estados e municípios”. “Se um desses falha, afeta o equilíbrio do sistema, pois os outros são obrigados a complementar.”
O Pnae atende 41 milhões de alunos no País. Em nota enviada à reportagem, o Ministério da Educação diz que o programa alcança todos os matriculados na rede pública. E cada escola recebe alimentos conforme o número de alunos.
O problema é tão grave que em alguns municípios o tema foi parar na Justiça. Em Cachoeira de Goiás (GO), a Justiça mandou repassar os R$ 755 mil da Festa do Divino Pai Eterno para a merenda, já que as escolas serviam só bolacha, leite e suco. Em Alcântara (MA), a Justiça mandou regularizar o fornecimento.
Redação ICL Economia
Com informações de O Estado de S.Paulo