Lares com crianças menores de 10 anos são as principais vítimas da fome no país. Em 14 estados, percentual de famintos supera a média nacional

O percentual de lares onde vivem crianças com menos de 10 anos em insegurança alimentar grave ou moderada é 20% maior do que a média nacional
14 de setembro de 2022

A fome no Brasil é cruel, mas ela ainda é mais cruel com a população infantil. No Brasil com 33 milhões de famintos, as crianças são as principais vítimas da fome. É o que mostra a segunda etapa do Vigisan (Inquérito Nacional sobre Segurança Alimentar no Contexto da Pandemia Covid-19 no Brasil). Conforme o levantamento, 37,8% dos lares onde vivem crianças menores de 10 anos enfrentam insegurança alimentar grave ou moderada. Sem eufemismos, isso significa que essas famílias passam fome ou têm uma dieta insuficiente.

A pesquisa é um tapa na cara do presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, que disse em entrevistas que a fome não existe no Brasil ou que ela não é tão grave como noticiada na imprensa. Desmentindo a narrativa do candidato à reeleição, é preciso dar as coisas os nomes que elas têm: a fome é grave no país e faz das crianças suas vítimas principais.

O percentual de lares onde vivem crianças com menos de 10 anos em insegurança alimentar grave ou moderada é 20% maior do que a média nacional, de 30,7%, quando levados em conta todos os domicílios.

O Vigisan faz parte de pesquisa da Rede Penssan, que reúne entidades como Ação da Cidadania, Oxfam, Vox Populi e Actionaid, e se dedica ao estudo da fome no país. Foram pesquisados 12.745 domicílios de todas as regiões do país.

No recorte por regiões, o relatório mostra que a desigualdade regional brasileira no quesito fome. No Maranhão, enquanto 63,3% das casas com crianças com menos de 10 anos enfrentam essa condição, no Espírito Santo o percentual é de 13,9%.

Em 14 estados brasileiros, o percentual de pessoas que passam fome supera a média nacional, de 15,5%. Os estados das regiões norte e nordeste são os que mais concentram pessoas nessas condições (25,7% e 21%, respectivamente).

Em Alagoas, o índice chega a 36,70%; no Piauí, 34,30%; e no Sergipe, 30%. Em São Paulo, o estado mais rico da nação, o percentual é de 14,60%. Já Santa Catarina, no sul, tem o menor indicador do país, em 4,60%.

A queda na renda e a informalidade do mercado de trabalho contribuem para piorar o problema. De acordo com a pesquisa, a fome ameaça 44,7% dos lares onde o responsável é um trabalhador informal ou alguém que está desempregado. Nos lares onde o trabalho é formal, esse percentual cai a 16,7%.

Principais vítimas da fome, crianças têm desenvolvimento afetado e podem ter futuro comprometido, segundo especialistas

A falta de acesso a alimentos e a uma dieta apropriada na infância pode comprometer o desenvolvimento e o futuro das crianças, segundo especialistas entrevistados pelo jornal O Globo. Francisco Menezes, consultor de políticas públicas da Actionaid, disse que é preciso estabelecer uma política pública para combater o problema da fome com foco nas crianças. “Elas (as crianças) estão sofrendo mais intensamente. A falta de alimentação adequada nessa fase da infância, com sacrifício de outros membros da família, provoca comprometimentos futuros, físicos e cognitivos”, disse.

Outro problema escancarado pela pesquisa é que o a fome não é diminui mesmo quando as famílias recebem o Auxílio Brasil. Isso porque o benefício é o mesmo para todas, independentemente do número de membros. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), candidato à reeleição, além de prometer manter o valor do auxílio em R$ 600, pretender dar um adicional de R$ 150 a crianças de zero a seis anos.

Na avaliação do consultor da Actionaid, o desenho do programa acaba prejudicando os lares com crianças, “principalmente pelo expressivo número de mães solo com filhos”.

Para piorar a situação, os recursos destinados à merenda escolar tiveram redução drástica no atual governo. O reajuste da verba destinada ao financiamento da merenda escolar estava congelado desde 2017. O Congresso aprovou recentemente um aumento de 34% nos recursos repassados para essa finalidade, mas ele foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). Agora, a merenda escolar em grande parte das escolas públicas tem sido bolacha e suco, uma dia muito pobre em nutrientes.

“Quando o Brasil saiu do mapa da fome, a alimentação escolar teve papel importante. A alimentação na escola vai piorando, com a substituição de alimentos de melhor qualidade nutricional para ultraprocessados, mais baratos”, disse o pesquisador da Actionaid.

Redação ICL Economia
Com informações de O Globo

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