Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *
A poucos dias das eleições, vivemos um período de uma enorme ansiedade. Queremos antes de tudo nos livrar do péssimo governo BolsoGuedes, que nos governou por quatro anos e trouxe retrocessos inimagináveis. A volta da fome, um mercado de trabalho cada vez mais precário, cada vez menos espaço para a população carente dentro do orçamento público e uma privatização, que só não foi mais generalizada pela incapacidade da dupla de conversar com o Congresso. Isso nos leva a uma importante questão, o que devemos esperar dos próximos quatro anos, se de fato um governo progressista vencer a eleição?
Primeiramente devemos lembrar uma coisa: as mudanças estruturais feitas pelos governos Bolsonaro e Temer vão demorar para serem desfeitas. Existem diversas amarras institucionais que precisam ser revogadas, e não serão somente na canetada, sem precisar passar pelo Congresso, pois muitas são emendas constitucionais. Logo, a mudança estrutural necessária, que mudaria as regras fiscais (principalmente o teto de gastos) e a reforma trabalhista, as duas travas mais preocupantes em relação ao desenvolvimento social do país, devem demorar um tempo para serem revertidas.
Então, num primeiro momento, temos que entender que não será em poucos meses que as coisas vão mudar de fato, e paciência será algo importante agora. Mas uma coisa precisa ser dita, não é só por isso que nada deve ser feito. Parafraseando Keynes, “No longo prazo estaremos todos mortos”, então mesmo com a dificuldade imposta e as restrições legais que surgem (e sim, elas vão surgir, pois o peso das regras fiscais voltará com tudo num governo progressista, com as penas mais duras possíveis aplicadas caso ocorra alguma falha), é preciso tomar algumas atitudes que melhore parcialmente a qualidade de vida das pessoas, que de uma maior dignidade para um país onde hoje mais de 33 milhões de pessoas passam fome.
Para isso, uma coisa já feita em governos passados pode ser retomada, como, por exemplo, um grande volume de obras pequenas para resolver algum problema específico, e esses não faltam no Brasil de hoje. No segundo governo Lula, foi feito um programa de recapeamento de estradas brasileiras, que acabou aumentando a renda e o volume de emprego do país naquele momento. Algo semelhante pode ser feito agora, um grande volume de obras pelo Brasil, podendo ser em reforma de hospitais públicos, ou até mesmo na reforma das universidades e institutos federais, que foram tão sucateados nos últimos anos.
Outra coisa que devemos prestar atenção é no discurso dominante, que vai gritar a todos pulmões que Bolsonaro deixou o cofre vazio, e que não há dinheiro para o governo realizar gastos. Isso por si só é um problema, pois atualmente existe o teto de gasto. No entanto, existe sim espaço para realizar gastos sociais. Até mesmo pode-se usar o BNDES como forma de financiamento, fazendo com que o banco volte a sua função primordial, financiar o desenvolvimento econômico, e não sendo apenas mais uma opção entre todos os outros bancos. Aliás, a atuação do BNDES é primordial dentro de um novo governo progressista. A base de qualquer país que deseja se desenvolver economicamente parte diretamente do crédito, que precisa ser barato. Infelizmente a iniciativa privada não fornece crédito barato e de prazo suficiente para um investimento consolidado, e por isso o BNDES deve voltar a ter protagonismo nessa questão. O BNDES precisa voltar a ofertar taxas de juros abaixo das praticadas no mercado, para facilitar o desenvolvimento social e econômico do país. Essa seria uma das maneiras mais inteligentes de injetar dinheiro na economia sem precisar atuar fora das regras fiscais vigentes.
Sendo assim, vemos que existem formas de se realizar algumas mudanças de curto prazo, mesmo que de efeito temporário, enquanto as questões estruturais são resolvidas. Não existe terra arrasada para o próximo ano como alguns analistas costumam apontar, só é preciso trabalhar com cabeças inteligentes e bem preparadas. E isso eu sei que tem de sobra entre os economistas e demais pessoas que estão trabalhando agora e vão trabalhar num eventual governo progressista no próximo ano.
*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais
*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorado pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira