O STF (Supremo Tribunal Federal) derrubou, na tarde desta segunda-feira (19), o orçamento secreto. Por seis votos a cinco, os ministros decidiram pela inconstitucionalidade do instrumento de barganha política do Executivo com o Congresso, que já drenou milhões de reais de recursos públicos para que parlamentares pudessem manter seus currais eleitorais ao preço de tirar verba de serviços essencias à população, como saúde e educação. Com a decisão do órgão, as emendas de relator (RP-9), como é tecnicamente conhecido o orçamento secreto, só podem ser usadas agora para correções no projeto de lei orçamentária de 2023.
O ministro Ricardo Lewandowski abriu a sessão e seguiu a decisão da presidente do órgão e relatora do processo, Rosa Weber, que na semana passada deu voto duro contra o mecanismo que garantiu sustentação política ao presidente Jair Bolsonaro (PL) no Congresso.
Até sexta-feira passada (16), ainda era incerto se a maioria do STF seria favorável à derrubada do orçamento secreto. Tudo indica que pesou no placar a decisão de ontem (18) do ministro Gilmar Mendes, permitindo que os recursos destinados ao pagamento do Bolsa Família (atual Auxílio Brasil) estejam fora do teto de gastos (regra fiscal que limita o aumento de gastos do governo federal à inflação passada) no ano que vem. A decisão de Mendes retira de sobre os ombros do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a pressão pela votação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Transição, que acontece amanhã (20) na Câmara dos Deputados.
Conforme publicado no blog da jornalista Vera Magalhães, em O Globo, Mendes e Lewandowski atuaram juntos ao pedir a suspensão do julgamento das ações questionando as emendas do relator, na quinta-feira passada. Depois, Lewandowski conversou a respeito do assunto com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco.
Em mais um capítulo desse enredo que se entrelaça, o Congresso Nacional aprovou, na sexta-feira passada, a proposta que trata da transparência nas emendas de relator-geral do Orçamento (RP-9). A matéria segue para promulgação. Agora, é preciso ver como todas essas peças vão se encaixar.
As regras aprovadas pelo Congresso foram classificadas como um “avanço significativo”, nas palavras de Lewandowski. Porém, as mudanças propostas não foram consideradas suficientes, uma vez que o texto não deixa claro os critérios de distribuição individual entre parlamentares. O texto diz que 80% será distribuído entre as bancadas, o que abriria brechas para líderes privilegiarem um parlamentar sobre outro. Ou seja, a distribuição não será equânime, ferindo os princípios da transparência e distribuição igualitária de recursos.
Além disso, o ministro citou que, apesar de 50% dos recursos das emendas serem destinadas a áreas de saúde, educação e assistência social, ainda caberia ao Congresso escolher quais projetos seriam beneficiados, sem a ingerência do Executivo.
Ao lado de Rosa Weber e Lewandowski, votaram pela derrubada os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
Por sua vez, a ala derrotada — ministros Nunes Marques, André Mendonça, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes — propunha a manutenção das emendas de relator desde que o mecanismo de distribuição de recursos fosse mais transparente.
Futuro ministro da Fazenda, Haddad diz que decisão do STF sobre orçamento secreto inaugura “nova etapa” na relação do Executivo com o Legislativo
Depois da decisão do STF, o substituto de Paulo Guedes na Economia, Fernando Haddad, disse que a decisão do órgão sobre o orçamento secreto inaugura uma “nova etapa” de relacionamento do governo com o Legislativo. Não é exagero dizer que as últimas decisões do órgão mandam um recado direto a Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados que tem sido o maior beneficiado com o orçamento secreto.
“Eu entendo que é absolutamente possível construir uma alternativa [ao orçamento secreto] que dê protagonismo [ao Congresso], mas respeitados os princípios constitucionais. Eu acredito que, a partir de hoje, começa uma nova etapa de relacionamento”, afirmou o futuro ministro, segundo o portal de notícias G1.
De acordo com Haddad, “há muitos mecanismos de fortalecimento do protagonismo do Legislativo na condução do orçamento público, com transparência, discricionariedade, aderência das propostas dos parlamentares aos programas governamentais”. Ainda, ele disse que Lula “não tem a menor intenção de retirar a participação do Congresso na condução dos interesses nacionais. Mas nós vamos encontrar o caminho de fazer isso com a transparência que o orçamento público exige”, completou.
Apesar de toda essa reviravolta, a votação de amanhã da PEC da Transição na Câmara dos Deputados é considerada crucial para Lula iniciar seu governo com o mínimo de governabilidade.
Em entrevista à Globonews, Lira nega chantagear governos
Mas, agora, é preciso saber como Lira vai reagir. Em entrevista ontem à jornalista Andreia Sadi, da GloboNews — antes, portanto, da decisão do STF sobre o orçamento secreto —, ele disse que as emendas de relator são “emendas municipalistas”, e a defesa do modelo por parte do Congresso Nacional não envolveu discussões de “chantagem” do Centrão com Lula.
“É injusto chamar de secreto, imputar sobre essa emenda qualquer tom de corrupção ou empoderamento. Não há esse fato. Na Câmara, as coisas são discutidas com muita clareza”, disse Lira. “Essas versões não ajudam, como quando dizem que o Centrão chantageia, que o Lira bota a faca no pescoço — eu nunca fiz isso com ninguém”.
A possibilidade levantada pela jornalista era de que o Congresso poderia encaixar o orçamento secreto dentro da PEC da Transição, já aprovada pelo Senado.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e do G1