Especialistas em diversas áreas desaconselham o BNDES a financiar a construção de um gasoduto na Argentina devido ao alto impacto ambiental. Trata-se de uma tubulação para transporte de gás de xisto que será extraído na Patagônia, no sul do país. Em visita recente ao país vizinho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que estaria disposto apoiar o empreendimento por meio do banco de fomento. O objetivo é contribuir com esse projeto no campo energético de um dos maiores parceiros comerciais do Brasil.
Esses experts reconhecem as boas intenções de Lula, já que o BNDES pode atuar em obras de outros países tocadas por empresas brasileiras. No entanto, alertam em documento que o Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam) enviou a autoridades do governo para a inadequação do empreendimento. Em resumo, o ofício adverte:
- O chamado gás natural que será transportado pelo gasoduto é um combustível fóssil, com alto potencial de aquecimento climático;
- Trata do chamado gás de xisto, cujo método de obtenção – fracking, ou fraturamento hidráulico – é reconhecido internacionalmente pelo altos riscos e fortes impactos ambientais. Na extração as rochas são furadas com fortíssimos jatos de água misturada a produtos químicos. Contaminam lençóis freáticos e aquíferos e por isso já foi banida em países mais progressistas;
- Além disso, esse tipo de extração transportado por gasoduto na região remete a ao menos 14 poços em terras de povos originários de Vaca Muerta. Na região, o gasoduto envolve operações em mais de 300 poços e que foram palco de confrontos com a comunidade Mapuche, na Patagônia Argentina. Ressalte-se ainda possíveis implicações com a estabilidade geológica local, que registra aumento de abalos sísmicos.
Brasil já rechaçou proposta semelhante a do gasoduto na Argentina
“É muito agressivo do ponto de vista ambiental, com uso de muita água, sob forte pressão, junto com mais de 600 substâncias químicas, a maioria tóxica, para quebrar as rochas. Essa retirada com essa violência contamina aquíferos e por isso vem sendo banida em muitos países”, diz à jornalista Marilu Cabañas, da Rádio Brasil Atual, o ambientalista Carlos Bocuhy, presidente do Proam.
Para agravar a situação, os gases derivados do processo de extração escapam para a atmosfera. E seu efeito para o aquecimento é maior que o gerado pela queima de carvão. “Ao financiar, o Brasil estaria incentivando o uso do gás, o que é desaconselhável”, afirma.
Bocuhy destacou que o empreendimento está inserido em área indígena Mapuche, e que essas comunidades estão excluídas das decisões, o que contraria a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). À imprensa local, os Mapuche denunciam contaminação e alterações na fauna local, como nascimento de animais com malformações. Sem contar ainda os riscos de instabilidades em uma região já sujeita a terremotos.
Os signatários do alerta ao BNDES lembram ainda que há oito anos o Brasil chegou a considerar a extração de gás por meio dessa tecnologia. Mas que a própria ministra do Meio Ambiente, Isabella Teixeira, se manifestou de maneira contrária, assim como o Conselho Nacional de Meio Ambiente e a Procuradoria-Geral da República.
“Por isso estamos alertando para que o BNDES não aporte recursos para esse tipo de finalidade que contraria princípios assinados pelo banco. Temos de zelar pelo meio ambiente, pelos povos indígenas e pela questão climática. Estamos falando aqui contra um incentivo ao aquecimento global. E o governo brasileiro tem de ser correto com os Mapuche como está sendo com os Yanomami”, disse Bocuhy.
Confira íntegra do documento do Proam sobre o gasoduto na Argentina no link abaixo:
Oficio-01_250123-ao-BNDES_MRE_MMA-financiamento-Gasoduto-Ar-1