Em entrevista nesta segunda-feira (13) ao programa Roda Viva, da TV Cultura de São Paulo, o presidente do Banco Central , Roberto Campos Neto, disse que não vai alterar a meta de inflação para o próximo biênio, apesar das críticas nos últimos dias. A declaração sinaliza a manutenção da atual taxa básica de juros da economia, a Selic, atualmente em 13,75% ao ano – uma taxa real de 8% acima da inflação. “Existem, obviamente, aprimoramentos (do sistema de metas) a se fazer. Não há só uma proposta, existem mais de uma. Mas, em nenhum momento, entendemos que o movimento de aprimoramento do sistema de metas seja um movimento que vise ganhar flexibilidade ou atuar de forma diferente”, disse Campos Neto.
Ele manteve sua visão, contestada por economistas e pela equipe econômica do governo, de que o Brasil apresenta um quadro de alto risco inflacionário. E reafirmou que o pacote fiscal preparado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, “atenuaria os estímulos fiscais sobre a demanda, reduzindo o risco de alta sobre a inflação”.
Na ata da mais recente reunião do Copom, em 1º de fevereiro, a instituição justificou a manutenção da alta taxa de juros reais alegando “incerteza ao redor de seus cenários e um balanço de riscos com variância ainda maior do que a usual para a inflação prospectiva”.
Campos Neto foi indicado por Jair Bolsonaro à presidência do BC em fevereiro de 2019, após decreto presidencial que instituiu a “independência” da autarquia federal. O principal argumento usado para a mudança foi blindar o órgão responsável pela política monetária do país de eventuais interferências políticas. Pelo decreto, que determina mandato de quatro anos ao presidente do BC, ele fica no cargo até o final de 2024.
Sem perguntas difíceis
O economista André Roncaglia afirmou que o programa Roda Viva, da TV Cultura, não fez perguntas duras ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Nas redes sociais, ele afirmou que Campos Neto não foi questionado sobre suas relações com André Esteves, dono do BTG Pactual e sobre os recursos que mantém em paraísos fiscais. Ele disse ainda que Campos Neto sinalizou muito nervosismo na entrevista.
“Como esperado, RCN vomitou tudo na primeira resposta para registrar burocraticamente que deu satisfação (pouco contestada) à sociedade sobre seus atos antirrepublicanos. Não perguntaram sobre André Esteves, dinheiro em paraíso fiscal, nem pressionaram sobre sua postura política”, afirmou o economista em sua conta no Twitter.
E seguiu: “Levantaram a bola para ele cortar e, nas poucas vezes em que houve questionamento mais incisivo, a âncora interveio para redirecionar a palavra. Uma rápida menção ao desemprego “baixo” de 8,5% com relação ao pré-pandemia. Acredito que não mudou as percepções de muita gente. Quem desconfiava dele tende a se manter assim e quem vê nele o bastião da racionalidade liberal e guardião técnico da moeda vai encontrar motivos para continuar pensando assim. O jornalismo poderia ter revelado muito mais, mas optou por pisar em ovos.”
Reações
A taxa básica de juros está no centro de críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao BC. Diversas vezes Lula já declarou não haver “justificativa nenhuma” para a Selic em 13,75%. Além disso, afirmou não ser possível que o país volte a crescer com a taxa nesse nível e que a condução de Campos Neto à frente da política monetária está travando o desenvolvimento do país. “Nós não temos inflação de demanda. É só isso. Que esse cidadão tenha possibilidade de maturar, de pensar e de saber como vai cuidar deste país. Ele tem muita responsabilidade.”
Nesta segunda (13), o Diretório Nacional do PT aprovou uma resolução que orienta as bancadas da Câmara e do Senado a convocarem Campos Neto para explicar a taxa de juros.
“Na medida em que a política do Banco Central mantenha sinais contraditórios com o projeto de desenvolvimento que venceu as eleições, que necessita da queda dos juros, nossos parlamentares vão ainda mais buscar informações, explicações, cobrar e fiscalizar, inclusive com possível convite ou convocação“, disse a deputada federal Maria do Rosário (RS).
Protesto no Banco Central
Entidades sindicais, movimentos populares e partidos políticos realizam hoje, em frente à sede do Banco Central, no Rio de Janeiro, uma manifestação contra a taxa básica de juros (Selic) de 13,75% e a gestão de Campos Neto ‒ bolsonarista declarado. O protesto será a partir das 11h na avenida Presidente Vargas, 730.
O ato tem apoio de partidos políticos e representações populares, como CUT, CTB, CSP, CSB, Frente Brasil Popular, Frente Povo sem Medo, Força Sindical, UGT, Levante, MST, PT, PCdoB, Psol, Sindicato dos Bancários do Rio, Federa-RJ (Federação das Trabalhadoras e dos Trabalhadores no Ramo Financeiro do Estado do Rio de Janeiro), Contraf-CUT (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro) e Comitê dos Comitês Populares de Luta do Rio.