Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *
A última semana pode ter sido curta, mas os últimos dias parecem ter acelerado uma preocupação que já vem sendo alertada desde meados do ano passado, uma possível crise global a acontecer neste ano. Talvez não seja nos moldes das últimas crises, mas pelo menos uma forte desaceleração do ritmo de atividade econômica deve acontecer. E tudo isso graças a uma “tempestade perfeita” que vem ocorrendo no mundo nos últimos dias, e agora com novos elementos importantes.
Primeiro que os efeitos da pandemia nas cadeias globais ainda não terminaram, fazendo com que as pressões inflacionárias ainda sejam relevantes em grande parte do mundo, e com potencial de se intensificar a qualquer momento. A resposta dos governos no mundo são todas iguais: aumento da taxa de juros e aperto monetário, numa tentativa desesperada de controlar uma inflação de oferta com remédios de controle para uma inflação de demanda. Isto está corroendo as perspectivas econômicas globalmente, e cada vez mais é esperado um crescimento econômico menor para este ano.
Os primeiros resultados disso já podem ser vistos com os resultados anuais de 2022 sendo divulgados. O Reino Unido fugiu por pouco da recessão no quarto trimestre e o ritmo de atividade econômica da Alemanha, deste mesmo período, veio em um ritmo decepcionante. Cada vez mais está claro que o remédio foi muito amargo, tanto que alguns banqueiros centrais começam a reclamar publicamente da política monetária dos Estados Unidos, que possui um efeito colateral nos demais países do mundo, alterando as taxas de câmbio e afetando a expectativa dos agentes econômicos.
Para ajudar neste cenário delicado, temos a guerra entre Rússia e Ucrânia que já completa um ano, e cada vez mais a situação está acirrada. A guerra e as sanções só elevam a falta de bens e o aumento do preço dos alimentos, gerando mais inflação e pressionando ainda mais a política monetária dos países.
As sanções à Rússia também cobram seu preço, pois a energia elétrica está com custo muito elevado nos países europeus, e cada um destes pontos gera mais um pedaço dessa chamada tempestade perfeita que falamos anteriormente.
Para piorar as coisas, as relações entre Estados Unidos e China passaram a ficar mais tensas, e isso fez com que a perspectiva econômica do motor mundial nos últimos anos, a economia chinesa, passasse a ser vista com desconfiança pelos mercados mundiais. As políticas de reindustrialização dos Estados Unidos devem ter um ótimo efeito para o país no longo prazo, mas vai gerar alguma confusão já na desorganizada cadeia produtiva global no curto prazo. Mais uma fonte de inflação para se preocupar e mais uma situação que pode desacelerar a economia global neste momento.
No Brasil temos uma situação semelhante. Não somos isolados do mundo e vamos sentir os efeitos deste cenário desorganizado e caótico mundial. Para ajudar, aqui também estamos praticando uma taxa de juros elevada, mas nisso somos campeões, pois temos a maior de todas em termos reais. Se a política monetária global é apertada, a nossa já está mais do que estrangulada. E existe um verdadeiro clamor do mercado e da mídia “especializada” por “responsabilidade fiscal”, ou seja, uma política de baixo gasto do governo, num momento em que o mundo está prestes a ligar a máquina estatal para tentar aquecer suas economias.
Isso mostra que existem muitos elementos preocupantes no mundo e uma desaceleração econômica já deixou de ser um temor e passou a ser uma realidade. Agora precisamos ver o quanto a economia freou, e inclusive observar se ela não vai ser na verdade uma retração econômica robusta. A tempestade perfeita já vinha sido alertada a algum tempo em diversos meios econômicos, inclusive neste, e agora ele se torna cada vez mais cristalino.
*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais
*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorando pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira