Depois de o ex-presidente Jair Bolsonaro tentar por quatro vezes recuperar as joias de diamantes avaliadas em R$ 16,5 milhões, que entraram no Brasil sem declaração na alfândega, o secretário da Receita Federal à época, José Tostes, perdeu o cargo. Isso aconteceu 37 dias após o conjunto de joias, presenteado pelo regime da Arábia Saudita, ser enviado para a então primeira-dama Michelle Bolsonaro.
À frente da Receita Federal, José Tostes sempre esteve sob pressão da família do ex-presidente Bolsonaro, em razão das investigações da denúncia da prática de “rachadinha” na Assembleia do Rio de Janeiro contra o seu filho mais velho, o senador Flávio Bolsonaro.
Em atrito com a família Bolsonaro, Tostes, que já era servidor aposentado da Receita Federal quando comandava o órgão, era bem avaliado pela área técnica em geral. Também havia atrito por conta da nomeação em torno de indicação do corregedor da Receita, um posto que interessava a Bolsonaro.
No Diário Oficial, a exoneração de Tostes por Bolsonaro foi publicada com a informação de que teria sido “a pedido”. O então ministro da Economia, Paulo Guedes, acenou para José Tostes com a possibilidade de um cargo na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em Paris, e anunciou a criação de outros dois cargos de adido da Receita na Índia e em Bruxelas. O fato, porém, é que Tostes não chegou a assumir o cargo em Paris.
O presidente Jair Bolsonaro colocou o auditor fiscal de carreira e especialista em direito tributário Julio Cesar Vieira Gomes, nomeado cinco dias depois, para chefiar a Receita no lugar de José Tostes. Julio Cesar era pessoa próxima da família Bolsonaro. O decreto de nomeação assinado por Bolsonaro seria publicado no dia 7 de dezembro de 2021. A escolha, porém, já era conhecida anteriormente.
Novo secretário da Receita Federal, próximo a Bolsonaro, fez a última tentativa para que as joias fossem liberadas
Ocorreram quatro tentativas para a entrada do conjunto de joias de diamantes, avaliado em R$ 16,5 milhões, sem declaração na alfândega da Receita Federal no aeroporto de São Paulo. A primeira tentativa foi a decisão da comitiva do então ministro de Minas e Energia (MME), Bento Albuquerque, de entrar com as joias sem declará-las. Depois, o próprio Albuquerque voltou à área restrita e tentou levar os pacotes, informando que se tratava de presentes para Michelle Bolsonaro. A terceira iniciativa foi o envio de um ofício do MME ao Ministério de Relações Exteriores (MRE), em 3 de novembro daquele ano, solicitando ajuda. O MRE, por sua vez, pediu informações para saber que providências tomar para a liberação das joias.
O gabinete do então ministro Bento Albuquerque, no dia 3 de novembro de 2021, reforça a pressão sobre a Receita em mais uma tentativa para conseguir colocar as mãos nas joias e entregá-las a Bolsonaro. Em ofício, pede “liberação e decorrente destinação legal adequada de presentes retidos por esse Órgão”. Em combinação com o Itamaraty, o ex-ministro também passa a usar que a versão que a destinação seria para o acervo, novamente, sem dizer para o qual. A Receita mantém a apreensão.
Um mês depois da tentativa frustrada, em 3 de dezembro, a informação da troca de comando da Receita foi vazada pela imprensa, no bojo de uma “grande reestruturação” nas secretarias do Ministério da Economia, com a criação de uma Secretaria Especial de Estudos Econômicos e troca de secretários. A estratégia, na prática, era a de esvaziar o impacto da demissão de José Tostes com a notícia de mudanças importantes na equipe do então ministro da Economia, Paulo Guedes.
Na ocasião, escolhido por Bolsonaro como chefe da Receita, o auditor fiscal Julio Cesar, atuou para que os fiscais do órgão liberassem as joias apreendidas naquele 26 de outubro de 2021. Julio Cesar faria diversas tentativas, sem sucesso. Em 30 de dezembro de 2022, a um dia de acabar o mandato de Bolsonaro, ele foi indicado pelo presidente para assumir um cargo na Embaixada brasileira em Paris, mas o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reverteu a nomeação no início do governo Lula.
O ofício encaminhado para resgatar as joias apreendidas pela Receita diz que “os bens foram ofertados ao presidente da República pelo reino da Arábia Saudita”. O documento, divulgado pela reportagem do jornal O Estado de S Paulo, foi enviado no fim do dia 28 de dezembro de 2022, restando três dias para o fim da gestão Bolsonaro, e é assinado pelo tenente-coronel do Exército Mauro Cid, ajudante de ordens e “faz-tudo” de Bolsonaro.
O documento 736/2022/GPPR-AJO/GPPR é explícito em “determinar desde já que os bens sejam retirados” pelo primeiro-sargento da Marinha Jairo Moreira da Silva por ordem do gabinete de Bolsonaro. O ex-presidente se mudou para os Estados Unidos no dia 30 de dezembro e não passou a faixa para Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O ofício envolve diretamente Bolsonaro nas tratativas para reaver os diamantes. A ordem foi dirigida ao ex-secretário da Receita Federal Julio Cesar Vieria Gomes, que, no mesmo dia, determinou à Superintendência da Receita em São Paulo para que fosse acatada e, as joias, devolvidas.
No dia seguinte, um jatinho da Força Aérea Brasileira (FAB) levou à Base Aérea de Guarulhos, em São Paulo, o primeiro-sargento Jairo Moreira da Silva, com a missão de resgatar as joias de diamantes, avaliadas em 3 milhões de euros, ou R$ 16,5 milhões.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias