Às vésperas do segundo turno, economistas de peso e empresários têm declarado voto aberto ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) porque veem na continuidade de um governo Bolsonaro uma ameaça, não só ao futuro da economia do país, mas, sobretudo, à democracia. Nas entrelinhas, no entanto, o apoio a Lula vem com uma cobrança para que o petista dê sinais mais claros de seus planos para a economia, cobrança, aliás, que partiu também de Simone Tebet, terceira colocada na disputa presidencial no primeiro turno, e que aderiu anteontem à campanha do petista.
Na última quarta-feira (5), Armínio Fraga, Edmar Bacha, Pedro Malan e Persio Arida, alguns deles pais do plano real, assinaram nota conjunta de apoio a Lula, na qual dizem: “Votaremos em Lula no segundo turno; nossa expectativa é de condução responsável da economia”. Lula publicou em seu site uma resposta de agradecimento ao apoio (leia a íntegra da nota no fim deste texto).
Malan foi ministro da Fazenda do governo de Fernando Henrique Cardoso, que também declarou apoio a Lula no segundo turno; Fraga foi presidente do Banco Central do governo de FHC; enquanto Arida e Bacha foram criadores do plano real. Lembrando que Arida foi coordenador do programa econômico de Geraldo Alckmin, vice na chapa de Lula.
Fraga, que foi um dos financiadores da campanha de Marcelo Freixo (PSB) ao governo do Rio de Janeiro, chegou a declarar que votaria nulo no segundo turno. Depois desistiu, declarando voto a Lula, mas indicando que gostaria que o petista conduzisse a economia com a mesma responsabilidade que fez em seu primeiro governo. Até porque a expectativa de todos eles é de que o próximo ano será muito difícil na área econômica, não só pelas irresponsabilidades cometidas por Jair Bolsonaro para reeleger-se, mas também diante do cenário econômico mundial, com perspectivas de recessão global.
Ameaças à democracia e o futuro da economia estão entre as preocupações também do empresário Pedro Passos, cofundador da Natura, que apoiou Simone Tebet (MDB) no primeiro turno. Ele aderiu à campanha de Lula. “Abro o voto para Lula porque estamos diante de uma ameaça institucional com o governo Bolsonaro”, afirmou. “E o Brasil não pode viver sob ameaça.”
Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, o empresário disse que o presidente Bolsonaro, cujo plano econômico encaminhado ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) não dá detalhes sobre o que ele pretende fazer com a economia em um possível segundo mandato, descumpriu promessas na economia. ” É um governo que prometeu ser liberal, mas de liberal não tem nada”, disse. “É intervencionista.”
Ele também destacou que o risco institucional da atual gestão contaminou até a economia, com estouros do teto de gastos e o uso indiscriminado do instrumento da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para viabilizar medidas que não são saudáveis à economia. “Não tenho nenhuma expectativa de que ele possa fazer algo muito diferente daqui para frente”, afirmou.
O temor de Passos é de corrosão nas instituições, principalmente devido a eleição do Congresso, com nomes da ala mais radical à direita, em linha com o que pensa Bolsonaro. “Eu tenho muito medo que isso se reflita num governo forte e com tendências reacionárias. Tenho muito medo do que pode acontecer institucionalmente”, pontuou.
Apoio a Lula, no entanto, não é incondicional. Grupo aguarda mais clareza da campanha do PT em relação ao plano econômico
O cofundador da Natura espera que, a partir do voto declarado de pesos-pesados da economia e de parte do empresariado, que a campanha de Lula explicite mais o que o PT faria na economia em um eventual governo Lula. Questionado sobre isso, Passos disse: “Eu espero que sim (mais clareza no plano econômico). Infelizmente, o programa que o PT tem sinalizado é muito ultrapassado. Seja pelo intervencionismo, seja pela influência que prevê nas estatais, pela manutenção de uma economia fechada, ou pela revisão de algumas reformas importantes, como a trabalhista”, disse.
Na opinião do economista e fundador do ICL (Instituto Conhecimento Liberta), Eduardo Moreira, a cobrança do empresariado não faz o menor sentido, pois, no momento em que se divulgam os nomes dos participantes do futuro governo Lula, há o risco de eles virarem alvos de ataques da oposição. “É preciso tomar muito cuidado com a divulgação dos nomes da futura equipe do governo Lula porque pode ser uma armadilha”, disse Moreira, lembrando que tudo poderá ser usado contra ele neste momento.
Moreira também lembrou que o PT ficou no poder 13 anos, sendo a maior parte, 8 anos, com o próprio Lula como presidente. Na área da economia, não houve qualquer ato irresponsável. Fizeram parte do governo dele Henrique Meirelles, Joaquim Levy. “Os empresários querem que tipo adicional de provas? Por isso, aviso que essa exigência de futuros nomes do governo Lula pode ser uma armadilha”, afirma Moreira.
Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, Pedro Malan destacou que a esperança citada na nota assinada pelos quatro economistas se traduz na ideia de que é necessário um diálogo sobre como lidar com a situação que o novo governo encontrará em 2023. “Será preciso fazer o que não foi feito até o momento, e espero que se faça ao longo das próximas semanas e dos próximos meses, antes que um eventual novo governo tome posse, que é a discussão sobre a necessidade de definir prioridades, fazer escolhas. É preciso ter responsabilidade não só na área monetária e cambial, mas fiscal também”, disse.
A declaração de Malan vem do fato de que, na opinião dele, o cenário econômico, tanto nacional quanto mundial, são muito diferentes – e até piores – do que foi encontrado por Lula quando assumiu o governo em 2002.
Quando declarou apoio a Lula, Simone Tebet fez cinco propostas ao programa de governo de Lula nas áreas da educação, saúde, endividamente das famílias, salário para mulheres, ministério plural e, principalmente, cobrou responsalidade fiscal em um eventual governo petista.
Lula publica nota de agradecimento pelo apoio de economistas do plano real à sua candidatura
Em seu site, ex-presidente publicou nota de agradecimento pelo apoio declarado de economistas no segundo turno. Leia a íntegra abaixo:
Há momentos na história em que os valores civilizatórios e democráticos devem estar acima de qualquer divergência. E é isso, nessa encruzilhada histórica em que nos encontramos, que representa a declaração de apoio da equipe de economistas que comandou a elaboração e execução do Plano Real, responsável por retirar o Brasil da hiperinflação na década de 1990, à candidatura da chapa Lula-Alckmin no segundo turno.
Com esse ato de grandeza e de compromisso público com o Brasil, os economistas André Lara Resende, Armínio Fraga, Edmar Bacha, Pedro Malan e Pérsio Arida se somam à postura do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e de diversos quadros históricos do PSDB em defesa da democracia e da inclusão social representadas pela candidatura Lula-Alckmin.
Estivemos juntos no processo de redemocratização que derrotou a ditadura militar e, agora, juntos novamente, vamos derrotar o autoritarismo, o obscurantismo, o negacionismo e os desmontes de Bolsonaro, além de recuperar a economia brasileira, reduzindo a inflação e voltando a gerar emprego e renda para o povo brasileiro.
Luiz Inácio Lula da Silva
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo e portal do Lula