Artigo: Mais indústria, menos agro

Brasil precisa do fornecimento de crédito em grande quantidade para melhora de tecnologia e produtividade do setor industrial
11 de setembro de 2023

Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *

Nos últimos dias tivemos uma boa notícia que foi o resultado do PIB do segundo semestre, mostrando uma atividade urbana um pouco mais robusta e com uma menor dependência do agronegócio no motor econômico brasileiro. Além disso, tivemos a grata surpresa da indústria, que devido ao ramo extrativo, apresentou alta. Mesmo com uma elevação baixa da indústria de transformação, poderíamos imaginar que algumas medidas de estímulo industrial estavam começando a fazer efeito, fazendo com que o crescimento brasileiro deste ano ficasse menos dependente da agropecuária e mais dependente dos serviços e da indústria.

Porém, ao final da semana passada, a indústria voltou a decepcionar, agravando os pontos que já eram de se observar na divulgação do PIB. Vimos uma queda em termos gerais da produção industrial, além da baixa de produção nos principais ramos. Além disso, vimos que o único setor industrial que de fato apresentou algum crescimento foi o de bens de consumo semiduráveis e não-duráveis, com os de maior valor agregado tendo uma queda considerável. O setor de bens de consumo durável, entretanto, ainda apresenta uma alta no acumulado do ano, porém os dados dos bens de capital, que mostram o ritmo de investimento brasileiro, são uma verdadeira catástrofe.

A situação atual do Brasil é a seguinte, observamos que o brasileiro está começando a ter mais renda sobrando, fruto de maior emprego, melhores condições de negociação salarial, além de uma inflação menor que corrói menos o poder de compra. Com isso, ele está gastando seu rendimento extra com lazer, seja um restaurante, seja um cinema, seja um cabeleireiro, etc. Pouco dessa renda está sendo gasta no comércio, e isso faz com que a indústria fique cheia de bens estocados, e produzindo pouco. O pouco produzido é de bens de baixo valor agregado, que geram pouco impacto global.

Essa situação mostra que não existe um estímulo muito baixo para a atividade industrial. É importante lembrar que o que faz com que a decisão de se produzir um produto seja tomada se o empresário acredita que vai conseguir vender bem seu produto no futuro, e esse não é o caso no momento. O grande problema dele agora é vender o estoque formado nos últimos anos, que estão encalhados. Então eles estão produzindo em quantidade muito baixa, somente para manter o nível de estoque. Quando começar a faltar estoque, é que um possível aumento da produção deve ocorrer.  Esse tal aumento não deve ocorrer por meio de alta do investimento, pois existe muita capacidade ociosa industrial a ser explorada pela indústria brasileira no momento.

Então, o investimento, que é o último passo a ser dado, está ainda longe de ocorrer. É preciso que o empresário passe a acreditar que a demanda por seus bens será tão elevada, que o atual nível de capacidade produtiva de sua indústria não será capaz de dar conta dessa nova demanda. E por enquanto, não existe tal perspectiva. Depois de anos de uma economia estagnada com poucos momentos felizes, é normal que exista tal resiliência do setor industrial brasileiro, mas é preciso dar um jeito de destravar tal situação.

A solução seria o fornecimento de crédito em grande quantidade para melhora de tecnologia e produtividade do setor industrial, além de uma política de incentivo estatal bem delimitada para isso. Os primeiros desenhos de uma política dessa parecem estar saindo agora do MDIC, chefiado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, mas são políticas que devem demorar um certo tempo para começar a ter efeito, então temos que jogar com as cartas que estão disponíveis agora em nossa mão.

É preciso ter o memos cuidado com a indústria que temos com o agro. O financiamento do agro é feito quase que todo via bancos públicos, via plano safra. O crescimento do setor tem mais a ver com a benevolência do setor público do que com a competência dos empresários do ramo. Existe muito dinheiro gasto para melhora de produtividade e, inclusive, utilização de empresa pública para melhorar a qualidade das sementes plantadas, como foi o caso da semente de trigo.

Então, o logo que deveria ocorrer é menos agro e mais indústria. Ou que pelo menos a indústria tenha a mesma atenção dispendida que o agro possui atualmente. Somente com um pesado apoio estatal e uma política funcional é que podemos realizar um processo de industrialização de fato, que garanta um país com emprego de maior qualidade, e uma população com melhor condição de vida no futuro. Para um futuro mais promissor da economia brasileira, mais indústria e menos agro.

*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais

*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorando pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira

 

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