Artigo: O que esperar do começo do governo Lula?

Existem dois grandes desafios que serão enfrentados por Lula em seu terceiro governo, a situação externa que caminha para uma crise econômica global e os desafios internos que precisam ser resolvidos
31 de outubro de 2022

Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *

Se você está lendo este texto nesta segunda-feira, o resultado da eleição foi favorável. Lula ganhou as eleições e será, a partir de janeiro, o presidente do Brasil pela terceira vez. O principal, que era retirar Bolsonaro da presidência, foi feito. A partir de agora temos que contar os meses para o fim deste desgoverno e já pensar no próximo. Mas uma coisa é precisa ser dita aqui, não vão ocorrer milagres e os desafios devem ser grandes, e muito se deve ao cenário econômico conturbado em que o mundo se encontra.

Existem dois grandes desafios que serão enfrentados por Lula em seu terceiro governo, a situação externa que caminha para uma crise econômica global e os desafios internos que precisam ser resolvidos. No primeiro caso, será necessário atuar de forma anticíclica para reduzir os efeitos negativos que devem respingar com força na economia brasileira, enquanto no segundo caso, é preciso desfazer todos os estragos que os anos de austeridade fiscal geraram no país.

A situação mundial começou a se agravar quando o conflito entre Rússia e Ucrânia eclodiu e, com as sanções à economia russa, uma grave crise inflacionária surgiu nos países, primeiramente afetando as economias em desenvolvimento (inclusive o Brasil), mas que atinge atualmente a Europa com força. A dificuldade que o continente enfrenta para conseguir uma oferta razoável de petróleo e gás fez os preços de bens energéticos explodirem e, sem as terras ucranianas produzindo grãos, temos uma forte alta do preço dos alimentos na região.

A solução escolhida pelos países centrais foi o aumento da taxa de juros. E essa alta tem um elevado potencial de derrubar o ritmo de atividade econômica destes países, e consequentemente, fazendo cair num segundo momento nos países em desenvolvimento, novamente incluindo o Brasil neste caso.

Os Estados Unidos já apresentam grandes sinais de uma recessão mais prolongada que a inicialmente imaginada, e os dados europeus estão mostrando uma economia quase estagnada, tendendo cada vez mais para uma queda do PIB. Somado a isso, há a situação chinesa, que ainda tem lockdowns parciais em sua política de COVID zero, temos a tempestade perfeita que deve atingir o país em 2023.

E as ferramentas para enfrentar tal crise são poucas hoje. As amarras institucionais criadas durante os governos Temer e Bolsonaro, como o teto de gasto e a reforma trabalhista, limitaram muito a possibilidade de utilização dos recursos fiscais para amenizar os efeitos da crise no país. Então, temos que pensar em algum modo de que no curto prazo sejam utilizadas ferramentas que mantenham a economia aquecida, para que no longo prazo, tanto a reforma trabalhista, quanto o teto de gastos sejam revistos. Só isso pode garantir uma volta do mercado de trabalho como era anteriormente, com baixo desemprego e uma qualidade maior do emprego formado, além de melhores salários sendo pagos.

Mas essa situação demanda tempo e talvez o curto prazo seja impiedoso com a economia brasileira. Uma das possibilidades é utilizar a ferramenta amplamente usada neste ano por Bolsonaro, o chamado estado de emergência para garantir uma elevação dos gastos fora do teto. Uma vez que uma crise econômica está por vir, no caso de uma confirmação dessa, talvez seja uma saída para conseguir criar as medidas anticíclicas necessárias. Outro caso seria uma suspensão imediata do teto de gastos, mas que seria extremamente difícil.

Sendo assim, devemos comemorar e muito a vitória de Lula e a queda de Bolsonaro, mas não vão ocorrer milagres. Não é somente pelo fato de Lula sentar-se na cadeira de presidente que automaticamente as coisas vão melhorar. E o cenário será dos mais conturbados possíveis, com um primeiro ano que deve ser um dos mais difíceis em toda a trajetória de Lula na presidência, talvez só perdendo para os anos da crise econômica entre 2008 e 2009. O desafio será grande, e é bom avisar para evitar decepções, pois vem uma tempestade chegando ao fundo. Felizmente, temos um bom capitão para guiar este barco durante esta tormenta.

*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais

*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorado pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira

 

 

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