Uma pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva mostra que quase metade (46%) dos apostadores das chamadas bets (apostas esportivas on-line) é formada por jovens entre 19 e 29 anos. Desses, 34% pertencem às classes CDE, enquanto outros 25% são classes AB.
O levantamento, publicado na coluna Painel S.A. da Folha de S.Paulo, mostra ainda que um terço dos apostadores está endividado e com o nome sujo. Apesar disso, 37% dizem ter três cartões de crédito, que são o principal meio de pagamento das apostas.
A pesquisa ouviu mais de 2 mil entrevistados em 142 cidades brasileiras, entre 3 e 7 de agosto.
As apostas esportivas on-line são liberadas no Brasil desde 2018. No entanto, somente no fim do ano passado esse mercado foi regularizado. Em 30 de dezembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou, com vetos, a lei que regulamenta as bets.
Isso significa que boa parte do dinheiro das apostas vai para empresas que não estão sediadas no Brasil. Segundo informações da coluna Painel S.A., 23 pedidos de empresas foram feitos ao Ministério da Fazenda para que possam atuar a partir de janeiro.
O economista e fundador do ICL (Instituto Conhecimento Liberta), Eduardo Moreira, comentou novamente o assunto na edição de ontem (19) do ICL Notícias 1ª edição, como já havia feito na sexta-feira passada, por entender que “a população brasileira está sendo destruída por esse fenômeno” e que “a maior epidemia deste país se chama bets“.
Moreira disse que o combate às bets será uma das causas empreendidas pelo ICL, pois, cada vez que mergulha nos números das apostas on-line, ele fica “assustado”, devido ao número de suicídios, de vidas e famílias destruídas.
“As pessoas estão completamente endividadas. Há crianças, de seis, sete anos, viciadas. São R$ 70 bilhões apostados, a maior parte por pessoas pobres”, disse.
Ele ainda propôs lançar uma campanha para desafiar artistas, influenciadores e jogadores a firmarem compromissos públicos para não fazer propaganda para empresas de apostas, com a finalidade de também constranger quem faz.
Servidores da Fazenda fizeram mais reuniões para discutir bets do que questões da Saúde
Outra reportagem da Folha de S.Paulo aponta que servidores do Ministério da Fazenda responsáveis por elaborar as regras do mercado de apostas tiveram 251 reuniões com bets ou associações que as representavam, enquanto profissionais da área da saúde foram ouvidos em cinco ocasiões.
O jornal analisou 555 compromissos que envolveram integrantes dos ministérios da Fazenda e da Saúde e foram realizados entre março de 2023 e 31 de julho deste ano (no dia seguinte, foram publicadas pelo governo as regras de “jogo responsável”).
Os dados foram obtidos no site E-agendas e filtrados com auxílio de Inteligência Artificial. Das reuniões, 381 envolviam o mercado de apostas e 251 tinham como principais interlocutores representantes de bets ou associações que as representavam.
Os encontros envolveram Regis Dudena (secretário de Prêmios e Apostas), José Francisco Manssur (ex-assessor especial da Secretaria Executiva da Fazenda), Simone Vicentini (ex-secretária adjunta de Prêmios e Apostas) e Sônia Barros (diretora do Departamento de Saúde Mental do Ministério da Saúde). O ministro Fernando Haddad participou de sete das reuniões.
Para debater o desenho do arcabouço regulatório a ser adotado no Brasil, Manssur instituiu reuniões semanais com as duas principais entidades representativas dos sites de apostas: IBJR (Instituto Brasileiro de Jogo Responsável), ligado às marcas europeias, e ANJL (Associação Nacional de Jogo Legal), que reúne empresas do resto do mundo.
Os encontros ocorriam todas as quintas-feiras e foram mantidos por Vicentini, que deu continuidade à regulamentação do mercado, após a saída de Manssur em fevereiro. Tiveram a recorrência interrompida apenas por Dudena, nomeado secretário de Jogos e Apostas em maio.
Depois de deixar o governo, Manssur e Vicentini assumiram a liderança da banca de apostas esportivas no escritório CSMV Advogados.
Texto das bets não trata do investimento em saúde
Os diálogos levaram a regras elogiadas pelo setor de apostas pela semelhança com as normas de Gibraltar, Malta e Curaçao, onde ficam sediadas a maioria das bets. Porém, o texto é alvo de críticas por não tratar do investimento em saúde necessário para a terapêutica de jogadores patológicos.
Além das quatro reuniões que teve com servidores do governo que trabalhavam na regulação dos sites de apostas, a Secretaria de Saúde Mental do Ministério da Saúde também organizou uma reunião com uma bet para debater o tema.
Nos 16 meses avaliados, a SPA realizou, por exemplo, 13 reuniões com o Instituto Brasileiro de Jogo Responsável, que representa os sites de apostas mobilizados por um mercado regulado, sob justificativa de maior segurança jurídica para o setor. O presidente do IBJR comanda a subsidiária do gigante sueco das apostas Betsson, que formalizou a intenção de atuar no mercado brasileiro no último dia 6 de agosto, sob o CNPJ Simulcasting Brasil.
Representantes da ANJL, que reúne representantes no Brasil da grega Betano e da americana Caesars Sportsbook, tiveram dez reuniões com a SPA.
Procuradas, ambas as entidades disseram que compartilharam com o governo informações da experiência adquirida em mercados regulados no exterior.
Considerando-se ausentes da discussão sobre a regulamentação, profissionais de saúde ouvidos pela Folha criticam a falta de menção a investimento em ambulatórios especializados, instrução aos profissionais de saúde mental para lidar com vício em jogo ou mesmo de campanhas de conscientização.
Questionados pela reportagem, os ministérios da Saúde e da Fazenda dizem manter um grupo de trabalho que começará a atuar em 2025, com apoio dos sites de apostas em situação regular.
O único ambulatório especializado em vício em aposta do país, o Pro-Amjo do Hospital das Clínicas da USP, não foi consultado pela Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) durante a formação das políticas de jogo responsável. A portaria publicada no último dia 31 cita as regras que visarão conter o jogo patológico a partir do ano que vem.
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo e do ICL Notícias 1ª edição