O governo Bolsonaro articula retirar recursos do pré-sal que atualmente vão para as instituições de pesquisa do país, configurando-se em mais uma restrição orçamentária para a área de Ciência. Os recursos a serem cortados compõem o principal fundo de financiamento à pesquisa do país, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
Em nota, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) denuncia a restrição orçamentária: “O corte em si é ultrajante e coloca em risco todo o sistema de pesquisa científica e tecnológica do país. Mas, além disso, revela que a ciência se tornou alvo preferencial do governo federal, impondo ao setor uma restrição orçamentária sem paralelo no Poder Executivo. De acordo com os dados divulgados pela equipe econômica, todas as pastas afetadas pelo bloqueio tiveram seus cortes orçamentários reduzidos, transferindo a carga para o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação”.
Segundo a SBPC, fundos setoriais, que compõe o FNDCT, como o CT-Mineral, o CT-Transportes, CT-Biotecnologia, CTInfo, CT-Amazônia e CT-Aquaviário podem ficar completamente sem verbas, impedindo a realização de qualquer projeto de pesquisa e desenvolvimento nestas áreas no segundo semestre de 2022. Os recursos do Fundo devem diminuir de R$ 4,5 bilhões para R$ 2 bilhões, o que significa 44,76% menos recursos do que o orçamento efetivado em 2021.
Um levantamento do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies) aponta que pelo menos 52 projetos serão altamente prejudicados pela restrição orçamentária. Entre eles, estão os programas Ciência no Mar e Ciência Antártica, além de pesquisas em bioinformática; mitigação de mudanças climáticas; nutrição e defensivos agrícolas sustentáveis; Covid-19; hidrogênio verde; e até em nióbio, mineral que é o xodó do presidente Bolsonaro.
Restrição orçamentária pode chegar a quase R$ 100 bi na área em oito anos
Wanderley de Souza, professor titular da UFRJ e ex-presidente da Finep ouvido pela reportagem de O Globo, explica que “se não for liberado, esse dinheiro já começa a fazer falta nos próximos meses”.
Um outro levantamento do Observatório do Conhecimento com a Frente Parlamentar Mista da Educação, realizado em maio, mostrou que os seguidos cortes no orçamento na Ciência e Tecnologia já tiraram da área quase R$ 100 bilhões de 2014 até este ano.
Outras fontes de financiamento à Ciência também têm sido estranguladas pelo governo federal. Um estudo do Confies mostra que tem ganhado corpo entre as fundações o interesse em fundos patrimoniais. A modalidade foi criada no Brasil em 2016 e consiste no recebimento de doações em que apenas o rendimento é utilizado para financiar projetos de pesquisa.
No entanto, o problema é que a falta de incentivos fiscais dificulta a arrecadação. O presidente do Confies, Fernando Peregrino, explicou ao O Globo que “o governo não dá o dinheiro e não deixa a gente captar. O cálculo que se faz é que o ganho é de seis vezes o valor que não foi arrecadado pelo incentivo fiscal”.
Até agora já foram criados 10 fundos patrimoniais no país, mas somente 5% dos fundos receberam doação de recursos privados.
Os cortes de verbas e as dificuldades de arrecadação em fundos patrimoniais se somam à luta do setor para manter os recursos provindos do pré-sal. As estimativas da comunidade científica é de que, com o aumento no preço do petróleo, esses recursos chegariam a R$ 3 bilhões, mas a área de Ciência perder R$ 1 bilhão desse dinheiro, só em 2022. Isto porque há um programa federal, instituído por uma medida provisória de Bolsonaro, de renovação de frota de caminhões, que embolsaria o recurso. A MP ainda será analisada pelo Congresso, mas caso aprovada.
Ciência e Tecnologia e Educação lideram bloqueio orçamentário
Os ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovações e da Educação foram as pastas com o maior volume de recursos contingenciados (bloqueados) no Orçamento de 2022. Os números sobre a restrição orçamentária constam do detalhamento do Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas do segundo bimestre, divulgado no fim de maio.
Com R$ 2,5 bilhões contingenciados na restrição orçamentária, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações lidera o bloqueio. Em seguida, vem o Ministério da Educação, com R$ 1,598 bilhão bloqueados. O Ministério da Saúde ocupa a terceira posição, com R$ 1,253 bilhão. Os demais órgãos tiveram restrição orçamentária abaixo de R$ 1 bilhão.
Redação ICL Economia
Com informações de O Globo e agências