Enquadrado pelo vazamento de um plano econômico que corresponde a um golpe contra quem ganha o salário mínimo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, confirmou ontem (20) que está em estudo a troca do reajuste do mínimo e de aposentadorias do índice de inflação do ano anterior para o de uma inflação projetada. A notícia caiu como uma bomba na campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição que aparece em segundo lugar nas pesquisas de intenções de votos.
À noite, Guedes foi obrigado a dizer que a correção será no mínimo pelo índice da inflação, por outro lado, confirmou que vai haver desindexação. Nota divulgada pelo Ministério da Economia diz que “não há qualquer plano para alterar as regras dos reajustes anuais do salário mínimo e das aposentadorias pela inflação (INPC). O ministro Paulo Guedes afirma que o salário mínimo e as aposentadorias serão corrigidas, no mínimo, pelo índice da inflação, podendo, inclusive, ter uma correção acima deste percentual. É falaciosa a informação de que o ministério pretende adotar medida que possa causar danos à camada mais frágil da população”.
Vale ressaltar que se houvesse algum interesse em corrigir o salário mínimo acima da inflação, o governo Bolsonaro já poderia ter feito isso.
Ontem, foi divulgada a notícia pela Folha de S.Paulo de que a proposta de Guedes só deve ser oficializada depois do segundo turno das eleições, em 30 de outubro. Ou seja, se Bolsonaro vencer o pleito, ela será apresentada em forma de PEC (Proposta de Emenda à Constituição). Grosso modo, o plano é alargar a margem do teto de gastos para pagar, por exemplo, o orçamento secreto, moeda de troca do governo com o Congresso para obter apoio político.
O plano de Guedes é chamado de “novo marco fiscal”, com o objetivo de reforçar o chamado tripé macroeconômico (câmbio flutuante, metas de inflação e metas fiscais). O plano indica que “o salário mínimo deixa de ser vinculado à inflação passada” passando a considerar “a expectativa de inflação e é corrigido, no mínimo, pela meta de inflação”. Além disso, o gasto com benefícios previdenciários “também deixa de ser vinculado à inflação passada”. Isso significa que a margem de reposição de perdas salariais será alargada.
Horas depois de a notícia ser divulgada na imprensa, Guedes disse que a mudança pode ser incluída no texto da PEC que está sendo construída para garantir recursos ao pagamento do Auxílio Brasil. A manutenção do benefício em R$ 600 no ano que vem depende da aprovação do projeto, já que o aumento só permanece válido até dezembro de 2022. Na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2023, o auxílio proposto é de R$ 405.
“É claro que vai ter o aumento do salário mínimo e aposentadorias pelo menos igual à inflação, mas pode ser até que seja mais. Quando se fala em desindexar, as pessoas geralmente pensam que vai ser menos que a inflação, mas pode ser o contrário”, afirmou o ministro em entrevista coletiva após encontro com empresários na sede da CNC (Confederação Nacional do Comércio), no Rio de Janeiro.
A exemplo do chefe, Guedes costuma desdizer o que disse a depender da repercussão da fala. No entanto, em se tratando do governo Bolsonaro, é preciso ficar atento.
Economista do ICL alerta que, se proposta de Guedes valer, reajuste do mínimo vai derrubar salário em R$ 117,26
A Constituição estabelece que o salário mínimo seja reajustado pela inflação com a finalidade de que a grande maioria das pessoas não perca seu poder de compra. Por essa razão, é necessária uma PEC para mudança de regra. Segundo Guedes, a proposta de desindexação do reajuste está em estudo desde o início do governo Bolsonaro.
De acordo com o ministro, ao desindexar o reajuste do salário mínimo à inflação será possível gerenciar melhor o orçamento. “Precisamos colocar mais inteligência nos orçamentos e mais política nos orçamentos em vez de simplesmente seguir uma regra de vinculação e indexação que pode, às vezes, ser inadequada”, defendeu o ministro.
Para o economista do ICL André Campedelli, a proposta de Guedes “é a pior notícia que a gente já teve desde o começo das eleições presidenciais”.
Em participação no programa ICL Notícias de ontem (20), ele explicou que, se a proposta de Guedes fosse implementada hoje, o salário mínimo cairia de R$ 1.212 para R$ 1.094,74, ou seja, 10% menos (R$ 117,26). “Multiplicando isso vezes 12 (meses), o brasileiro perderia mais de um salário mínimo no ano. E temos que lembrar que não é só o salário mínimo. Todos os benefícios previdenciários – aposentadoria, pensões, BPC (Benefício de Prestação Continuada), vão cair porque não vão ter ganho real”, disse.
O também economista do ICL Eduardo Moreira lembrou ainda que o valor R$ 1.212 do mínimo já está defasado porque “tomou uma surra da inflação de alimentos, não teve ganho real nenhum. A cesta básica, que era 30% (do valor do mínimo) hoje virou 50%. Então, R$ 1.212 já é uma tragédia!”, pontuou.
Por sua vez, Campedelli diz que indexar o reajuste do mínimo à inflação projetada nada mais é do que a meta da inflação estabelecida pela autoridade monetária brasileira. “A meta deste ano é de 3,5% e a do ano que vem é de 3,0%. Ou seja, quem recebe o salário mínimo vai ter uma perda gigantesca de poder de compra. É isso o que o Paulo Guedes está querendo. E para que serve isso? Para ter um maior espaço dentro do Orçamento e garantir o (pagamento do) orçamento secreto. Ele quer isso para, dentro do espaço fiscal do teto de gastos, manter o orçamento secreto”, criticou.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias