Embora a inflação oficial do Brasil tenha ficado no negativo nos últimos três meses, o fato é que, quando se depuram os dados, constata-se que os preços dos alimentos, item que pesa principalmente no bolso dos mais pobres, continua nas alturas. O grupo alimentação e bebidas ainda acumula inflação de 9,54% no ano (janeiro a setembro de 2022), a maior alta para os primeiros nove meses do calendário em 28 anos, ou desde o início do Plano Real.
O presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, e a equipe econômica têm usado a inflação negativada para atochar goela abaixo do eleitor a narrativa de que a economia brasileira está bombando. Mas os dados apresentados são superficiais. Como já publicado neste espaço, o economista do ICL Eduardo Moreira mostrou que a deflação foi “comprada” pelo governo, com medidas eleitoreiras de curto prazo, como a desoneração dos combustíveis.
Reportagem publicada na edição desta quarta-feira (19) pela Folha de S.Paulo consultou os dados do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), desde 1994, quando o Brasil vivia o reflexo da hiperinflação.
Na avaliação de analistas, uma série de fatores pesou para turbinar os preços dos alimentos em 2022. Entre eles estão eventos climáticos (fortes chuvas no começo do ano, que prejudicaram plantações em regiões como o Sudeste, e um período de seca no Sul), que provocaram redução na oferta de alimentos no mercado e, consequentemente, afetando os preços; e encarecimento da produção devido ao aumento de custos de insumos durante a pandemia de Covid-19, situação que piorou com a Guerra na Ucrânia, país que fornece fertilizantes ao Brasil. Mas, sem dúvida, a falta de uma política econômica efetiva foi fundamental na alta dos preços dos alimentos.
“O diagnóstico ainda é de uma inflação alta. É uma inflação que tem impacto importante, que pesa na vida das pessoas. Elas percebem isso”, disse o economista Luca Mercadante, da Rio Bravo Investimentos, à Folha.
Inflação dos alimentos teve trégua em setembro, puxada pelo leite longa vida
No acumulado de 24 meses (setembro de 2020 a agosto de 2022), a inflação oficial brasileira acumula alta de 19,25%). Ítens essenciais como óleo diesel (107%) e óleo de soja (100,74%) dobraram de preço no período. Outros, como café moído (79,34%), leite (73,57%) e açúcar (54,77%) também tiveram reajustes exorbitantes no período analisado.
Em setembro, o grupo alimentação e bebidas recuou 0,51% no IPCA, apontando a maior baixa desde maio de 2019 (-0,56%) e a primeira desde novembro de 2021 (-0,04%). O indicador foi puxado para baixo pelo leite longa vida, que havia disparado anteriormente, em meio a período de entressafra. Apesar disso, o produto continua entre os mais elevados.
No acumulado do ano, o melão foi o alimento que mais subiu dentro do IPCA, apontando aumento de 74,37% até setembro. A fruta foi seguida pela cebola (63,68%) e leite longa vida (50,73%). Por outro lado, o tomate teve a maior queda (-28,01%).
Com o resultado, a inflação acumulada no ano desacelerou de 10,10% até agosto para 9,54% até setembro. No acumulado de 12 meses, a alta passou de 13,43% para 11,71%.
Apesar da queda, no entanto, analistas entrevistados pela Folha de S.Paulo preveem que os alimentos devem ficar ficar em um patamar elevado de preços até dezembro, mas com avanços mais moderados do que no começo do ano. Por ora, as projeções não sinalizam novas deflações para o grupo até o final de 2022. Ou seja, o grupo alimentos e bebidas deve continuar pressionando o indicador.
A inflação dos alimentos continua influindo muito no custo de vida da população mais pobre e dependente de auxílios governamentais, porque a cesta básica continua muito cara para essa parcela. Em setembro, o preço médio da cesta básica diminuiu em 12 das 17 capitais que integram levantamento mensal do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos).
Ainda assim, apenas cinco das 17 metrópoles pesquisadas tinham cesta básica abaixo de R$ 600, o valor do Auxílio Brasil. Os preços abaixo dessa faixa foram encontrados em Aracaju (R$ 518,68), Salvador (R$ 560,31), João Pessoa (R$ 562,32), Recife (R$ 580,01) e Natal (R$ 581,53), todas capitais do Nordeste, onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) obteve a maioria dos seus votos.
São Paulo, por outro lado, seguiu com a cesta básica mais cara em setembro: R$ 750,74. Florianópolis (R$ 746,55), Porto Alegre (R$ 743,94) e Rio de Janeiro (R$ 714,14) vieram na sequência.
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo