Morreu nesta madrugada (12), aos 96 anos, o ex-ministro da Fazenda Antonio Delfim Netto, conhecido como o homem do “milagre econômico” na época da ditadura militar. Ele estava internado desde a última segunda-feira (5) no Hospital Israelita Albert Einstein em decorrências de complicações no seu quadro de saúde.
O ex-ministro deixa uma filha e um neto. Segundo a família, não haverá velório aberto e o enterro será restrito aos parentes.
Delfim Netto era formado em economia pela Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da Universidade de São Paulo (FEA-USP), onde também fez doutorado com uma tese sobre café, tornando-se catedrático de Economia Brasileira na mesma escola, em 1958. Porém, grande parte de sua vida foi dedicada a funções na administração pública, com destaque nos governos militares.
Entre junho de 1966 e janeiro de 1967, ele foi secretário de Fazenda no governo de transição de Laudo Natel, que substituiu o titular, Adhemar de Barros, cassado pelo regime militar.
Em seguida, integrou o grupo de Planejamento do governo Carvalho Pinto. No mesmo ano, aos 39 anos, se tornaria ministro da Fazenda a convite do marechal Arthur da Costa e Silva, posto em que permaneceria ainda durante a presidência do general Emílio Garrastazu Médici, o mais sanguinário dos governos militares.
Delfim Netto, “milagre econômico” e AI-5
Sob o seu comando naquela época, o Brasil viveu o chamado “milagre econômico”, com um crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) entre 9% e 14% ao ano, porém, a um custo muito elevado para a sociedade brasileira. Depois do milagre, o Brasil sofreu com o aumento do endividamento externo, situação de desigualdades sociais, além de problemas como hiperinflação, fome e desemprego, conforme explicou a historiadora Cláudia Plens, professora da Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanos da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), em entrevista ao ICL Mercado e Investimentos em abril (clique aqui para ver).
Em 13 de dezembro de 1968, Delfim Netto participaria no Palácio das Laranjeiras, no Rio, da reunião do Conselho de Segurança Nacional, convocada por Costa e Silva, na qual seria aprovado o Ato Institucional nº 5 (AI-5), que suprimiu os direitos constitucionais, ampliou a repressão e “legalizou” a ditadura militar no país.
De acordo com o livro “A ditadura Envergonhada” (Companhia das Letras), do jornalista Elio Gaspari, naquela reunião o jovem ministro da Fazenda, então com 40 anos, “pisou no acelerador”.
“Queria que a concentração de poderes pedida por Costa e Silva desse ao governo mão livre para legislar sobre matéria econômica e tributária”, descreve Gaspari no capítulo intitulado “A Missa Negra”, em que narra detalhes da reunião.
Depois de afirmar aos presentes que estava “plenamente de acordo com a proposição que” estava em análise, ele acrescentaria dirigindo-se a Costa e Silva: “Eu acredito que deveríamos atentar e deveríamos dar a Vossa Excelência a possibilidade de realizar certas mudanças constitucionais que são absolutamente necessárias para que este país possa realizar o seu desenvolvimento com maior rapidez”.
Além da pasta da Fazenda, Delfim Netto serviu como embaixador do Brasil em Paris no governo do general Ernesto Geisel. Depois, voltou ao primeiro escalão do Executivo na administração de João Batista Figueiredo (1979 a 1985).
Delfim Netto também foi eleito deputado federal, função pública na qual permaneceu entre 1987 e 2007.
Conselheiro de Lula e Lava-Jato
Durante os primeiros governos petistas (2002-2010), ele se transformou em uma espécie de conselheiro frequente do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sobre o petista, Delfim Netto disse: “O Lula é um diamante bruto. É um gênio. As pessoas que subestimam o Lula são idiotas. Ele realmente tem uma grande capacidade, não só de se comunicar, que é visível, mas de organizar as coisas. Ele fez um bom governo”, disse em entrevista ao jornal O Globo, em 2015.
Em junho de 2016, teve seu nome envolvido na Operação Lava-Jato, que apurava diversos esquemas de corrupção entre agentes públicos, políticos e empreiteiras. Na “Operação Xepa”, como foi batizada a 26ª etapa da Lava-Jato, o ex-ministro foi citado em planilhas do departamento de operações estruturadas, como era chamada a área de pagamento de propinas da Odebrecht, como beneficiário de R$ 240 mil.
Ele foi intimado e, em depoimento, afirmou prestar serviços de consultoria à empreiteira havia mais de 20 anos, e negou ter recebido valores indevidos.
Em março de 2018, voltou ao foco da Polícia Federal na 49ª fase da Operação Lava-Jato, batizada “Buona Fortuna”, que apurou fraudes na licitação que definiu o consórcio Norte Energia como vencedor da licitação em 2010 para a construção de hidrelétrica de Belo Monte, no Pará.
Agentes da PF chegaram a fazer buscas na casa e no escritório de Delfim Netto, que ainda teve R$ 4,4 milhões bloqueados por ordem do juiz Sergio Moro. O próprio Lula saiu em defesa dele à época.
É autor de uma série de livros, como “O problema do café no Brasil”, escrito ainda nos anos 1966, “O Brasil e a Ciência Econômica Volumes I e II”, “Planejamento e Desenvolvimento Econômico” e “O Brasil do Século XXI”, entre outros.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e de O Globo