Artigo: O que explica a inflação no mundo?

Brasil vive cenário diferente de economias como Europa, Estados Unidos e Japão
3 de outubro de 2022

Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *

O mundo atualmente vive uma situação bem delicada em relação a inflação. Países desacostumados a ter uma alta expressiva de seus preços, como as nações centrais europeia, os Estados Unidos e até mesmo o Japão vivem uma alta que não se via pelo menos desde os anos 1970. Enquanto aqui, a situação vem melhorando consideravelmente, com deflações principalmente do preço dos combustíveis e agora uma quase estagnação do preço dos alimentos. Mas, qual o motivo de cenários tão diferentes entre o Brasil e as economias centrais do mundo?

A primeira coisa que temos que ter em mente é que, no caso dos combustíveis e bens energéticos, fortemente dependente do preço do petróleo nos países mais desenvolvidos, o preço destes bens vem caindo, pelo menos é o que mostram os dados deste último mês. Isso é reflexo direto da queda vertiginosa do preço do petróleo no mundo, que já desabou em mais de US$ 30 dólares no mês de setembro. Isso é reflexo direto da incerteza global para os próximos meses e para o próximo ano. Todos os países centrais puxaram o freio de mão para tentar conter a inflação, e a demanda de petróleo vem caindo consideravelmente mês após mês. Isso reduz drasticamente o preço do petróleo no mercado internacional, e reflete na queda do preço dos combustíveis principalmente.

Mas temos uma situação especial, a Europa. Nestes países, mesmo com o preço dos combustíveis em queda, o custo energético vem subindo consideravelmente em algumas nações como a Alemanha. Esse caso já é reflexo das sanções impostas à Rússia e da resposta economia que esta deu. Os russos estão dificultando cada vez mais a entrega de gás natural para os países que apoiam a Ucrânia na guerra entre estes dois países, e países com forte produção de energia baseada em gás natural estão vendo os custos de produção se elevarem consideravelmente. Isso aí resulta num aumento direto no nível geral de preços, já que basicamente todos os bens e serviços utilizam energia elétrica na sua produção ou na sua venda.

Temos também o caso dos alimentos, que vinha sendo um problema para Brasil e o mundo desde o começo do ano, mas que teve efeitos mais amenizados neste último mês. Novamente, o mercado internacional possui a resposta, com a desaceleração global, principalmente da China, a procura por alimentos como soja, milho, trigo, etc., vem caindo consideravelmente, o que já reflete em seus preços internacionais. Temos uma queda brusca do preço das commodities alimentícias negociadas pelo mundo. Além disso, as pessoas, com medo da incerteza, estão saindo cada vez mais da compra de derivativos, que fazem parte do mercado futuro destes alimentos e possuem elevada influência sobre o preço à vista destes bens, e estão buscando títulos públicos norte-americanos, o porto seguro do capital internacional em tempos difíceis.

Mas mesmo com a queda internacional do preço dos alimentos no mundo, a Europa parece não sentir tal efeito imediatamente em sua inflação. E novamente o conflito entre Rússia e Ucrânia explicam essa situação. Boa parte dos grãos consumidos na Europa vinham de território ucraniano, e agora chegam de outros lugares, principalmente do Brasil. Então o custo para se obter estes alimentos subiu consideravelmente para estas nações, já que o frete e a logística são muito mais caras para trazer grãos do Brasil do que eram para trazer da Ucrânia. Então novamente temos a guerra sendo a principal causa inflacionária na Europa no momento.

Vemos, portanto, que não existe nenhuma mágica feita pelo governo Bolsonaro que ocasionou na queda da inflação nos últimos meses. A única medida de fato que ajudou por um mês e meio, e bastante, foi a redução do ICMS, que trará consequências futuras terríveis para estados e municípios.

Mas de resto, a situação incerta internacional que acabou auxiliando esse controle inflacionário brasileiro. E mesmo assim, na Europa, tal fator parece não estar auxiliando tanto, já que os efeitos da guerra entre Rússia e Ucrânia continuam a aumentar consideravelmente o nível de preços destes países.

*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais

*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorado pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira

 

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