A inadimplência atingiu 73,1 milhões de brasileiros em outubro, segundo dados da Serasa. Esse é o segundo maior número de pessoas no país que não conseguiram quitar suas dívidas. O mais alto continua sendo o registrado em abril (73,4 milhões).
Mas por que, mesmo com o desemprego em baixa (caiu para 6,4% no trimestre de julho a setembro de 2024) e a renda maior, o brasileiro não está conseguindo quitar seus compromissos financeiros? A explicação pode estar em ao menos três fatores:
- O aumento da taxa básica de juros a partir de setembro deste ano, que saiu de um patamar de 10,50% ao ano para os atuais 11,25%;
- A escalada da inflação de alimentos (o indicador acelerou 0,44% em setembro), puxada pela carne bovina nos últimos meses; e
- O crescimento das apostas on-line, as chamadas bets, que têm feito muitas famílias redirecionarem seus gastos, ajudando a corroer o orçamento das famílias.
No primeiro caso, a taxa básica de juros, a Selic, é a base de todas as taxas adotadas pelo mercado. Se a Selic sobe, as demais também acabam subindo, encarecendo, por exemplo, o crédito.
Em relação à inflação, dados do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostram que a inflação acelerou em outubro para quase todas as faixas de renda, na comparação com o mês de setembro. A exceção foi para as famílias de renda alta. Para os domicílios com renda muito baixa, a taxa de inflação avançou de 0,58%, em setembro, para 0,75%, em outubro, enquanto as famílias de renda mais alta passaram de 0,33% para 0,27% no mesmo período. Os alimentos tiveram aumento de preços e isso se deve muito aos efeitos das mudanças climáticas sobre a produção.
Por fim, várias pesquisas têm mostrado que as bets se tornaram um problema de saúde pública no país, levando milhares de brasileiros, principalmente os de baixa renda, a destinarem seus parcos recursos a apostas em vez de comprar itens de necessidades básicas, por exemplo.
Piora da inadimplência do brasileiro também aparece em dados da CNC. Cartão é o vilão
De acordo com reportagem do jornal O Estado de S.Paulo, a piora do calote das famílias aparece, por exemplo, em vários indicadores da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo).
Em fevereiro deste ano, por exemplo, 28,1% das famílias estavam com contas em atraso. Esse percentual subiu para 29,3% em outubro. Também a fatia das famílias que não conseguirão pagar as dívidas vencidas subiu no curto prazo: era 11,9% em julho deste ano e aumentou para 12,6% no mês passado.
Além disso, o porcentual de famílias com dívidas pendentes há mais de 90 dias avançou em outubro ante setembro e atingiu mais da metade (50,4%) do total de endividados. Foi o maior resultado desde fevereiro de 2018, aponta a CNC.
Assim como tem ocorrido ao longo dos anos, o cartão de crédito é o grande vilão dos brasileiros que, muitas vezes, deixam de pagar o valor total da fatura, “rolando” a dívida para os meses seguintes. Os juros do rotativo são absurdamente altos, ainda que a lei que instituiu o programa Desenrola Brasil tenha limitado o valor máximo da dívida a 100%.
Dados do Banco Central (BC) mostram que, em junho, a inadimplência estava em 5,48% dos créditos a receber e encerrou setembro – último dado disponível – em 5,62%. O vilão do calote foi o cartão de crédito parcelado, cuja inadimplência acima de 90 dias atingiu 11,89% em setembro. É a maior taxa desde o início da série em março de 2011.
Inadimplência: número de brasileiros endividados cresceu 11 milhões em três anos
Dados da Serasa mostram que, em quase três anos, o número de inadimplentes no país aumentou cerca 11 milhões, o equivalente à população da cidade de São Paulo. O nível atual de 73,1 milhões de inadimplentes é elevado, mas estável, segundo a instituição.
O economista sênior da Serasa, Luiz Rabi, explica que a estabilidade em níveis elevados é resultado de duas forças agindo em sentidos opostos: de um lado, o desemprego baixo e a renda em recuperação, que puxam a inadimplência para baixo; de outro, juros e a inflação, que empurram o calote para cima.
Mas, com a entrada do pagamento do 13º salário e as campanhas de renegociação de dívidas, a perspectiva é de que ocorra algum recuo da inadimplência em novembro e dezembro.
Endividamento por regiões
Dados da Serasa de outubro mostram que, em sete unidades da federação, a fatia de inadimplentes respondeu por mais da metade da população adulta. Esse resultado supera a média do país, que é de 44%.
Thiago Ramos, coordenador da Serasa, diz que a marca quase dobrou em um ano, um sinal, segundo ele, de agravamento da inadimplência. Em outubro de 2023, apenas quatro estados tinham mais da metade da população adulta inadimplente.
Quem liderou o ranking de outubro deste ano foi o Amapá, com 60,8% da população adulta inadimplente, seguido pelo Distrito Federal (57,8%), Rio de Janeiro (54,6%), Amazonas (53,3%), Mato Grosso do Sul (51,5%), Mato Grosso (50,4%) e Roraima (50,06%). “54,6% da população adulta do Rio de Janeiro inadimplente é muita gente, é um mercado consumidor muito grande”, aponta Ramos.
Embora salientem que o endividamento do brasileiro não signifique que “estamos caminhando para o abismo”, os especialistas ouvidos pela reportagem salientaram que, no ano que vem, como as perspectivas para a economia são de um desaquecimento em relação a este ano, pode haver uma tendência de aumento do número de inadimplentes, o que torna a situação um pouco mais preocupante.
Redação ICL Economia
Com informações de O Estado de S.Paulo