No Twitter, ministro do CGU afirma que Portal da Transparência omite dados sobre o orçamento secreto

No primeiro debate presidencial do 2º turno, Bolsonaro deixou explícito que ele sabe quem são os parlamentares beneficiados com o instrumento de barganha política
20 de outubro de 2022

Lançado pela CGU (Controladoria-Geral da União), em 2004, o Portal da Transparência do governo federal não traz dados sobre o orçamento secreto, moeda de troca do governo federal com o Congresso Nacional. O site de livre acesso permite a qualquer cidadão encontrar informações sobre o destino e como é utilizado o dinheiro público, além de se informar sobre assuntos relacionados à gestão pública brasileira. Porém, em sua conta no Twitter, o próprio ministro-chefe do órgão, Wagner Rosário, admitiu que o portal não tem informações sobre os autores das emendas do orçamento secreto.

A afirmação ocorreu no último dia 16 de outubro, quando o ministro respondeu à uma pergunta de um internauta.

orçamento secreto

Reprodução Twitter

O assunto foi abordado quando Rosário postou um vídeo mostrando como pesquisar informações sobre emendas parlamentares no Portal da Transparência. Com a postagem, o ministro tentava mostrar que o orçamento secreto está todo exposto de forma clara no site do governo. “As emendas de relator, apelidadas de orçamento secreto, são alterações realizadas pelo relator do orçamento na proposta orçamentária encaminhada pelo governo federal. Vc sabia que elas estão todas detalhadas no portal da transparência ? Assista o vídeo e fiscalize!”, escreveu Rosário.

A postagem foi repostada por bolsonaristas com o objetivo de reforçar a ideia de transparência da gestão. No entanto, um seguidor do ministro fez o seguinte questionamento: “Ministro, e quem pediu a emenda ao relator (do orçamento)? Tem esse dado no Portal da Transparência?”, questionou o usuário Alessandro Pignata. Em resposta, o ministro disse: “Infelizmente não, Alessandro. Quem tem essa informação é o relator. Quando a tivermos colocaremos no portal. O Congresso já começou a colocar no site alguns beneficiários. Vc pode checar. Não sei se está completo”, disse Rosário, com um link para o site da Câmara dos Deputados – que só tem os nomes dos responsáveis por parte dos pedidos.

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No entanto, como ficou claro no debate entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à Presidência pelo PT, e o presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, realizado pelo UOL em parceria com a Band, a Folha de S.Paulo e a TV Cultura, o presidente tem conhecimento da lista de beneficiários do orçamento secreto.

Ao responder a uma pergunta formulada pelo jornalista Josias de Souza, no segundo bloco, de que ele teria comprado o apoio do Congresso com o orçamento secreto, Bolsonaro segurava um papel o qual, segundo ele, continha 13 nomes de petistas como beneficiários. Na ocasião, ele ainda disse que o instrumento tinha sido criado pelo ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia e não por ele, o que é uma mentira deslavada do presidente.

As chamadas emendas de relator foram criadas em 2019 a partir de projeto de iniciativa do Executivo (PLN nº 51), que alterou a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020 (nº 13.898, de 2019). A mensagem de encaminhamento da proposta foi assinada pelo general Luiz Eduardo Ramos, então ministro-chefe da Secretaria de Governo e hoje ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República.

O próprio Rodrigo Maia fez uma postagem em vídeo no dia seguinte ao debate e deu uma série de entrevistas confirmando essa informação e dizendo que o presidente tentava transferir a ele a responsabilidade pelo orçamento secreto.

Secretaria do Governo sempre manteve controle sobre o orçamento secreto, ao contrário do que diz o governo

Como mostrado no debate e na contramão do que disse o ministro-chefe da CGU, o governo detém informações sobre os autores das emendas. Segundo reportagem do jornal O Estado de S.Paulo, quando as verbas do orçamento secreto começaram a ser distribuídas, em 2020, o controle dos pedidos era feito pela Secretaria de Governo. Desde o início da distribuição das verbas, os pagamentos somam pouco mais de R$ 20,4 bilhões e, no Orçamento de 2023, estão previstos R$ 19 bilhões.

Um detalhe importante é que essas emendas não são impositivas, ou seja, o governo decide se vai pagá-las ou não, ao contrário do que acontece com parte das emendas individuais (identificadas no Orçamento pelo código RP 6) e de bancada (código RP 7). Para obter apoio do Congresso e pelos gastos feitos até hoje, mostrou-se que o governo fez a opção por pagá-las.

De acordo com a reportagem do Estadão, o senador Márcio Bittar (União-AC) foi o relator-geral do orçamento de 2021, no segundo ano de vigência do orçamento secreto. Na época, diz ele, não existia a obrigação legal de manter registros detalhados sobre quem pedia o quê. “Até o segundo ano, a lei que criou o RP 9 (a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020) não obrigava que a emenda dissesse quem pediu. Se foi o governador, se foi o prefeito, se foi um deputado federal, uma bancada (…). Não havia na lei essa obrigação. Isso é que gerou toda essa desconfiança e todo esse caso que vocês batizaram… de orçamento secreto, quando nada é secreto”, argumentou.

De acordo com o Estadão, a necessidade de maior transparência veio a partir de pressão do STF (Supremo Tribunal Federal), a partir de um acordo entre o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e a ministra Cármen Lúcia, no fim de 2021.

Por sua vez, ao jornal, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) contestou a alegação de que não existem registros dos parlamentares que indicaram o destino das verbas. Para ele, é “evidente” que o governo mantém registros sobre quais políticos são agraciados com as verbas do orçamento secreto. “É evidente que essa massa gigantesca de recursos (do orçamento secreto) é distribuída mediante acordo político e com registro dessas transações. Não há expectativa de você ter uma distribuição bilionária de recursos sem que você tenha por parte do governo um controle muito claro de quem pede cada coisa”, diz ele.

Procurada pela reportagem, a CGU reiterou que não sabe quem são os autores dos pedidos, afirmando que, “obviamente, (esse dado) só está disponível com cada deputado e com o relator. Não há como a CGU dar transparência a essa informação, uma vez que a CGU não tem essa informação sob o seu domínio”, disse o órgão, em nota.

Redação ICL Economia
Com informações de O Estado de S.Paulo

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