Como de costume, o presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a desdizer uma declaração dada anteriormente, o que sempre faz quando suas declarações são alvos de polêmicas. De olho nas eleições de 2022, o presidente mudou o discurso sobre o Pix ao dizer, ontem (30), que “os bancos não perderam quase nada” com a criação do instrumento de movimentação financeira, frase totalmente oposta ao que havia dito antes.
Em julho passado, quando a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) assinou a carta em prol da democracia, uma resposta das instituições aos constantes ataques do presidente ao Estado democrático e às eleições, Bolsonaro chegou a declarar o seguinte: “Você pode ver, esse negócio de carta aos brasileiros, à democracia, os banqueiros estão patrocinando. É o Pix que eu dei paulada neles, os bancos digitais que nós facilitamos”, disse então o presidente a apoiadores no cercadinho do Palácio da Alvorada.
Já ontem, durante um evento com presidenciáveis organizado pela União de Entidades do Comércio e Serviços, Bolsonaro disse: “Os bancos não perderam quase nada com isso daí porque ganharam 6 milhões de contas e os bancos têm mecanismos para fazer com que seu lucro não diminua”.
À época da declaração de Bolsonaro, o fiel escudeiro do presidente, o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, também reforçou a fala do chefe em sua conta na rede social Twitter: “Então, presidente, se o senhor faz alguém perder 40 bilhões por ano para beneficiar os brasileiros, não surpreende que o prejudicado assine manifesto contra o senhor”.
As declarações de Bolsonaro causaram alvoroço à época, tanto que coube ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, dizer que não fazia sentido dizer que as instituições financeiras perderam dinheiro com o Pix. “Você tem uma perda de receita em transferência, mas por outro lado novas contas são abertas, novos modelos de negócio são gerados, você retira dinheiro de circulação, que é um custo enorme para o banco, você aumenta a transação, o transacional aumenta”, disse Campos Neto, em evento da Febraban.
No evento de ontem, Bolsonaro fez um copia e cola da declaração de Campos Neto: “Ninguém quer interferir em banco, isso tem a ver com taxa que cobra com questão de empréstimo e acredito que livre mercado é a melhor maneira de a gente viver em paz e harmonia e não mais sonharmos, mas termos certeza do progresso”.
Eduardo Moreira já havia alertado que o Pix foi criado a pedido de bancos, cujos lucros só sobem
O economista Eduardo Moreira já havia alertado para o fato de que a fala de Bolsonaro, à época, não fazia do menor sentido. Na edição do ICL Notícias desta quarta-feira (31), programa diário do YouTube, ele voltou a abordar o tema.
“Todos os dias tem mentira do Bolsonaro e nós pegamos aqui essa mentira. O Bolsonaro nem sabia o que era Pix, ele não tinha nem ideia. Por que foi feito o Pix? Quem pagou? O pix não foi feito contra os bancos – foi feito a pedido dos bancos, para ajudá-los, com dinheiro nosso”, reforçou, lembrando que os bancos tiveram aumento de 50% em seus lucros, ou seja, não perderam nenhum dinheiro com o instrumento de movimentação financeira.
A mentira sobre o Pix foi, aliás, repetida por Bolsonaro em sua entrevista ao Jornal Nacional, no último dia 22 de agosto. “Criamos o Pix tirando dinheiro de banqueiros”, declarou o presidente.
O Pix foi oficialmente lançado em outubro de 2020, ou seja, durante o primeiro ano do governo Bolsonaro. No entanto, ainda em 2016, o então presidente do BC, Ilan Goldfajn, já anunciava planos de criar uma ferramenta para transações bancárias instantâneas e gratuitas.
O ex-ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, afirmou que durante o governo de Dilma Rousseff (PT) houve movimentações para viabilizar o Pix. A ferramenta, portanto, não foi uma iniciativa do governo Bolsonaro. Além disso, o Pix não tirou dinheiro dos bancos. Sem agências, os bancos gastam menos com segurança e movimentação do dinheiro em papel. A transferência gratuita colabora para essa economia.
Eduardo Moreira já havia explicado que o Pix foi um projeto criado para os bancos, pois acabou com a possibilidade de o cidadão transferir dinheiro por meio de outros aplicativos, como o WhatsApp, o que favoreceria uma competição saudável, na opinião dele.
Como reforçou Moreira, o setor bancário nunca ganhou tanto dinheiro como neste governo. Só em 2021, as quatro maiores instituições financeiras do país (Banco do Brasil, Bradesco, Itaú e Santander) lucraram R$ 81,6 bilhões, segundo dados tabulados pela Economatica. Esse é o maior valor registrado na história.
Em 2020, ano em que a economia brasileira encolheu 3,9% por conta dos impactos da pandemia, esses bancos lucraram, juntos, outros R$ 61,6 bilhões. Já em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, o lucro somado das quatro instituições foi de R$ 81,5 bilhões.
Além disso, a arrecadação dos bancos segue crescendo. No primeiro trimestre de 2022, foram outros R$ 24,3 bilhões em lucro para BB, Bradesco, Itaú e Santander – recorde trimestral. Comparado com o mesmo período de 2021, houve um crescimento de cerca de 30%.
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo