O que Bolsonaro não disse: salário mínimo inglês compra quatro vezes mais gasolina que o brasileiro

Cálculo feito pelo jornal Correio Braziliense aponta que, no país britânico, os moradores gastam menos de 6% do salário para encher o tanque, enquanto no Brasil o gasto é de 22%
20 de setembro de 2022

O presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, aproveitou a ida ao funeral da rainha Elizabeth II no fim de semana, em Londres, para fazer comício a eleitores quem nem moram no Brasil e distorcer informações visando às eleições. No domingo (18), Bolsonaro divulgou um vídeo dizendo que a Inglaterra tem a gasolina mais cara que a do Brasil, fazendo uma comparação bastante inapropriada e sem fundamentação na realidade.

Postando-se em frente a um posto de gasolina na capital inglesa, Bolsonaro mostrou que o preço do litro do combustível a 1,61 libra ou cerca de R$ 9,70, afirmando que o valor é “praticamente o dobro da média de muitos estados brasileiros”.

Ao longo de seu governo, Bolsonaro empenhou-se numa queda de braço com a Petrobras para reduzir o preço da gasolina à força, em um cenário de alta do petróleo no mercado internacional, elemento usado na base de cálculo dos preços dos combustíveis no Brasil. Sempre visando reeleger-se, o presidente trocou o presidente da estatal quatro vezes e também forçou a saída do ex-ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque.

Além disso, estabeleceu uma desoneração fiscal sobre os preços dos combustíveis para reduzir a inflação, medida que, conforme análise do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), tem efeito apenas no curso prazo e traz enormes prejuízos aos cofres de estados e municípios, impactando investimentos em serviços necessários, como saúde e educação.

Quando gravou o vídeo, o que Bolsonaro não disse foi que o salário mínimo inglês compra quatro vezes mais gasolina que o brasileiro. O salário mínimo na Inglaterra é 9,18 libras/hora. Para uma carga de 44 horas semanais por mês, o trabalhador inglês receberia 1.615,68 libras mensais. Essa quantia é suficiente para comprar 998 litros de gasolina a 1,61 libras, preço apontado pelo presidente do litro do combustível por lá.

Enquanto isso, no Brasil, o salário mínimo, que não recebe aumento acima da inflação desde que Bolsonaro se tornou presidente, é hoje R$ 1.212. Com a gasolina a R$ 5,22, o brasileiro consegue comprar 232 litros: 766 litros a menos que o salário mínimo inglês.

Portanto, a verdade sobre a gasolina na Inglaterra é uma só: o poder de compra do salário mínimo inglês, em relação ao combustível, é 330% maior do que o brasileiro.

Cálculo feito pelo jornal Correio Braziliense aponta que, no país britânico, os moradores gastam menos de 6% do salário para encher o tanque, enquanto no Brasil o gasto é de 22%.

Ao dizer que Inglaterra tem gasolina mais cara, Bolsonaro não assume que preço do combustível no Brasil está acima do PPI

Mesmo com a redução do preço do combustível pela desoneração fiscal promovida pelo chefe do Executivo, o preço praticado por Bolsonaro fica acima do PPI (Preço de Paridade de Importação), política que inclui a dolarização dos combustíveis e insere na gasolina paga pelo brasileiro custos que o consumidor não deveria pagar, como frete de navio, imposto de importação, pois o país é produtor de petróleo.

Além de não explicitar as diferenças de renda das populações dos dois países e a perda de poder de compra do real frente à libra, Bolsonaro apenas tenta jogar cortina de fumaça fazendo uma comparação que não cabe.

Se, para efeito de comparação, dividirmos o PIB (Produto Interno Bruto ou soma de bens e serviços produzidos por um país) de um país e outro por suas populações, a gasolina também é mais barata para o britânico do que para o brasileiro.

Isso porque, no ano passado, a renda per capita anual do Reino Unido foi de US$ 49.675, enquanto a do Brasil foi de US$ 16.506, segundo o Banco Mundial. Portanto, considerando o correspondente dos valores mencionados acima em dólar, o litro de gasolina custaria 0,004% da renda média do britânico, ao passo que 0,006% da renda média do brasileiro.

O professor da UFABC (Universidade Federal do ABC), o economista Fabio Terra, ouvido pela BBC News Brasil lembrou que toda comparação “tem suas limitações” e acrescentou que a fala de Bolsonaro ignora “as realidades locais não só de renda, mas também a respeito da legislação, de o Brasil ser um país produtor de petróleo”.

“Bolsonaro fez a mera conversão de câmbio nominal. Não é só preço o que importa, importa muito a renda, porque ela é o que permite que se compre algum ‘preço’, ou seja, algum produto”, acrescentou.

 

Redação ICL Economia
Com informações do portal G1 e do site do Lula

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