Uma decisão da CGU (Controladoria Geral da União) mostra que o sucateamento promovido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) na educação é intencional. O órgão concluiu que o governo federal ignorou de modo sistemático critérios técnicos na transferência de verbas da educação. Assim, abriu brechas para a ocorrência dos chamados “acordos escusos”, por meio dos quais foram privilegiadas as cidades mais ricas do país em prejuízo às mais pobres. Estas últimas, segundo a CGU, deveriam ser priorizadas nos repasses de verbas para a área da educação.
Reportagem publicada pelo jornal Folha de S.Paulo mostra que a área técnica da controladoria ainda indica que o MEC (Ministério da Educação) não cumpre sua função de alocação de recursos alinhada a políticas públicas e deixa de fornecer assistência técnica a prefeituras. “O quadro atual distanciou a pasta da sua missão constitucional e potencializou o aumento da desigualdade”, diz o documento do órgão, obtido pelo jornal.
O relatório preliminar do CGU traz o resultado das avaliações das operações do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) em 2021 e as irregularidades cometidas desde 2019, primeiro ano do mandato do presidente Bolsonaro. O documento ainda não foi divulgado oficialmente.
Trecho do documento diz que “a falta de critérios técnicos para a alocação dos recursos discricionários, a ausência de observância do fluxo técnico definido na liberação dos recursos, associado à decisão individual e não motivada da alta gestão da Unidade [FNDE], potencializam sobremaneira a possibilidade de acordos escusos, com consequentes liberações indevidas de verbas a entes federados em detrimento dos que, legalmente, deveriam ter prioridade”.
Governo tira verbas da educação, cultura e ciência para colocar no orçamento secreto. FNDE está no centro de denúncias de corrupção do governo
No início deste mês, o presidente Bolsonaro aproveitou-se da cortina de fumaça jogada com as comemorações do 7 de Setembro para editar um decreto que possibilita desbloquear, antes das eleições presidenciais em outubro, R$ 5,6 bilhões em emendas do chamado orçamento secreto, moeda de troca entre o presidente e seus aliados no Congresso, desrespeitando o princípio da transparência. A edição de duas MPs foi uma demanda do presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL).
Reportagem do jornal O Estado de S.Paulo publicada à época mostra que o decreto dribla as negociações no Congresso, lideradas pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, para devolver MPs que adiaram o pagamento de despesas para as áreas de cultura e ciência e tecnologia, já que usa o espaço aberto no Orçamento para incrementar as emendas do orçamento secreto. “Como as MPs têm efeito de lei, o governo já pode usar o espaço aberto por elas para liberar as emendas de relator com base no decreto. Sob pressão para devolver as MPs, Pacheco decidiu segurar a tramitação das medidas e cobrar a solução do Ministério da Economia”, diz trecho da reportagem.
Em relação à educação, o projeto da LOA (Lei Orçamentária Anual) prevê a retirada de mais recursos de programas sociais importantes, como o Educação Básica de Qualidade, que já perdeu R$ 1 bilhão. Além disso, o programa voltado ao ensino superior perdeu o montante de R$ 594,5 milhões, enquanto a educação infantil teve redução de R$ 145 milhões, com o maior corte percentual: 96% de corte de verba. Para especialistas, trata-se de uma tragédia anunciada para a educação.
Lembrando ainda que o FNDE está no centro de denúncias de corrupção no governo Bolsonaro, com atuação de pastores ligados a ele na negociação de verbas e, também, por sequestro político das decisões de transferências. O chefe do Executivo entregou o órgão para políticos do centrão, o que resultou em um FNDE como uma espécie de balcão de negócios.
A conexão com pastores levou à queda do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro. Ele foi demitido uma semana depois que reportagem da Folha de S.Paulo revelou áudio em que ele dizia priorizar demandas de um dos pastores a pedido de Bolsonaro.
Procurados pela reportagem, o MEC e o FNDE não responderam.
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo