Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *
O Brasil e o mundo vêm passando por tempos difíceis na economia. Temos uma crise bancária que parece estar cada vez mais profunda, incertezas sobre o ritmo da economia global e um cenário interno com falta de crédito, demanda e baixo nível de renda. Tudo isso faz com que seja necessário atuar para mudar rapidamente o cenário, e parte disso tem a ver com a política monetária adotada. Porém, mesmo com todos os sinais, o Banco Central parece ignorar solenemente a situação e atuar de forma birrenta na condução da definição da taxa de juros no país.
O resultado? Cada vez mais incerteza sobre o futuro e a bolsa do país caindo profundamente desde o anúncio do Banco Central, porém, os analistas econômicos preferiram culpar Lula e suas fortes declarações contra o presidente da entidade do que a terrível nota explicativa do Copom para justificar a manutenção da atual política monetária. A manutenção da taxa de juros fez com que ocorresse uma verdadeira fuga de capital do país, indo buscar nos títulos públicos brasileiros e norte-americanos um porto seguro dentro das incertezas presentes na economia global atual.
A ata do Copom foi uma das mais desastrosas que já li nos últimos tempos. Parecia mais um recado para o governo federal, um puxão de orelha do “único senhor preocupado com a economia brasileira”, do que uma explicação de fato para a atitude do comitê. Na ata volta-se a falar em arcabouço fiscal, em risco fiscal, não sinaliza no curto prazo uma mudança da política monetária e queda da taxa de juros e o pior: não exclui a hipótese inclusive de aumentar a taxa de juros caso ache necessária. Foi uma resposta da entidade em relação a todas as críticas que vem sofrendo do presidente Lula nas últimas semanas.
O Copom ignora a realidade, que está mais evidente do que nunca, mas tem suporte nas visões distorcidas dos analistas de mercado da Faria Lima e tem suporte para suas ações. A inflação não tem nada de excesso de demanda, mas suporta sua decisão numa chamada “ancoragem de expectativas”, como se o padeiro fosse elevar o preço do seu pão caso a taxa de juros fosse reduzida. Além disso, voltou a se falar que é preciso responsabilidade fiscal para poder ser cogitada a taxa de juros. Ou seja, caso o governo não garanta que nada ou quase nada será feito pelo povo brasileiro, este não vai abaixar a taxa de juros.
É incrível como o Banco Central atua agora para atrapalhar a economia brasileira, diante de uma falta de crédito começando a surgir nos principais bancos, além da produção de bens de consumo duráveis, como automóveis, passando a ser suspensas, pela falta de vendas. As pessoas não têm dinheiro para comprar à vista, e também não conseguem uma linha de crédito com juros compatíveis para adquirir os bens. E o Banco Central é o responsável por mais uma parte desse desastre, pois poderia já estar atuando para amenizar tal situação, e isso não levaria a nenhum descontrole inflacionário, já que a inflação não está vindo de uma demanda aquecida.
A situação atual é somente boa para uma pequena parcela do Brasil, que é a Faria Lima. Nesse local, onde as transações financeiras ocorrem e a especulação anda solta, a taxa de juros elevada é o melhor dos mundos, já que com isso é possível ganhar muito dinheiro fazendo o mínimo de esforço possível. Com uma taxa de juros real acima de 8% ao ano, nunca foi tão fácil ganhar dinheiro no Brasil com o menor risco possível. Por isso tanta briga para manter a taxa de juros tão elevada.
O Banco Central hoje não trabalha para os brasileiros, mas sim para a Faria Lima. A atitude e as intenções, reveladas pelo Copom na última reunião, deixam isso evidente. Temos uma situação em que a autoridade monetária poderia atuar para melhorar a situação brasileira, mas está mais preocupada com a manutenção dos privilégios da elite rentista brasileira do que em melhorar a qualidade de vida do brasileiro. A culpa do caos econômico que pode vir hoje não é de Lula, como muitos vem vendendo, mas sim do Banco Central e seu presidente, Roberto Campos Neto.
*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais
*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorando pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira