Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *
Hoje toda a política econômica brasileira passa pela aprovação de um único homem, que não foi eleito por ninguém, mas que parece intocável em sua posição. Ele é somente o responsável pela condução da política monetária, mas diz como deve ser feita a política fiscal, que tributos devem voltar e como o próprio presidente eleito da República deve se portar e falar sobre questões econômicas. Este homem também é protegido por boa parte da mídia, que o colocam como sensato e meramente técnico. Este homem é Roberto Campos Neto.
Bob Fields terceiro (apelido herdado de seu avô, ministro da ditadura e entusiasta da ideia de fechar o departamento de economia da Unicamp), fez uma série de exigências para realizar o seu trabalho, que é de deixar a taxa de juros em um nível menos imoral do que o atual. Ele exigiu um arcabouço fiscal pró-mercado e com regras sólidas, exigiu a volta de cobrança de impostos federais sobre os combustíveis e falou que só pode pensar no assunto quando a taxa de inflação acumulada voltasse a ficar dentro da meta. E o pior de tudo, isto ocorreu nestes primeiros meses de governo.
A chantagem foi pesada, mas foi prontamente atendida pela equipe econômica de Lula, na figura de Fernando Haddad como ministro da Fazenda. Foi divulgado um arcabouço fiscal com diversas travas econômicas, que limita o gasto e prejudica o nível de investimento brasileiro, num modelo bastante condizente com o que a Faria Lima queria. Também se voltou a cobrar impostos federais sobre os combustíveis, sendo que nem todos os estados voltaram a cobrar seus impostos estaduais. Isso tudo foi feito segundo os pedidos da nossa realeza econômica brasileira. Ou seja, Roberto Campos Neto conseguiu todas as garantias que queria.
Mesmo assim, ele se mantém irredutível sobre sua política de taxa de juros. A última declaração do dono da política econômica brasileira foi de que a taxa de juros é um antibiótico, que só pode deixar de ser administrado quando não existir risco nenhum mais de existir a inflação.
E nessa fala ele erra duas vezes. A primeira ao não entender que ele está tratando a inflação de forma errada, pois juros não fazem efeitos sobre problemas de custos, ou fazendo a mesma analogia que Bob Fields terceiro fez, ele está tratando uma gripe com antibióticos e não entende a razão do paciente não estar melhorando. A segunda é que ele ignora a própria lógica de manter a taxa de juros elevada – segundo mostram as próprias atas do Copom. A taxa de juros só é justificável pelo chamado “risco fiscal” que existia no Brasil. Esse “risco fiscal” não existe mais depois da divulgação do arcabouço.
Mas essa é somente mais uma desculpa que Campos Neto está usando para manter a taxa de juros elevada. Sempre vai ter alguma nova situação, alguma alegação técnica demais para seus súditos entenderem, mas ele vai postergar a mudança da política monetária o quanto puder, mesmo que isso signifique levar a economia brasileira para um buraco maior ainda do que já está.
Roberto Campos Neto se colocou na posição de dono da economia brasileira. Ele manda e desmanda, e chantageia a todos, mas nunca cede. Não é sozinho que ele conseguiu este status, é fortemente blindado pelos grandes analistas econômicos de mercado, pela Faria Lima e pela grande mídia hegemônica. E enquanto ele tiver esse status, vamos continuar todos reféns de seus desejos, mesmo que isso signifique desemprego, renda baixa e atividade econômica reduzida para o país.
*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais
*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorando pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira